A alta de apenas 0,1% do Produto Interno Bruto (PIB) entre o segundo e o terceiro trimestre, feitos os ajustes sazonais, divulgada na sexta-feira pelo IBGE, não foi vista como recuperação da economia, mas trouxe uma composição um pouco melhor do crescimento, com reação da indústria e dos investimentos. A dinâmica mais favorável, no entanto, não deve continuar no fim do ano nem antecipa um cenário de retomada consistente para 2015, segundo economistas ouvidos pelo Valor.

Eles destacam que a alta de 1,7% da atividade industrial na passagem trimestral, após quatro trimestres consecutivos de queda, foi impulsionada pelo efeito estatístico, dado que o segundo trimestre foi o fundo do poço para o setor. O mesmo raciocínio vale para a expansão de 1,3% da formação bruta de capital fixo (FBCF, medida das contas nacionais do que se investe em máquinas e construção civil), que também ocorreu depois de quatro quedas trimestrais.

Além disso, para o próximo ano, os economistas destacam que a necessidade de ajustes restritivos joga contra a retomada forte da indústria, do investimento e tende também a moderar o consumo das famílias, que caiu 0,3% de julho a setembro, enquanto o esforço de aumento do superávit primário deve reduzir investimentos públicos. Por isso, as expectativas para 2015 seguem modestas.

O economista-chefe do banco ABC Brasil, Luis Otavio de Souza Leal, embora espere continuidade da contribuição positiva do setor extrativo, que cresceu 2,2% nos três meses encerrados em setembro, outros fatores, como o consumo e o investimento, devem manter a atividade industrial rodando a taxas mais baixas.

Como evidência de que a reação esboçada no terceiro trimestre pela indústria e pela formação de capital físico não indica trajetória de recuperação de longo prazo, Leal menciona que os dois componentes do PIB seguiram em queda na comparação com igual período do ano anterior. Em relação ao terceiro trimestre de 2013, a FCBF diminuiu 8,5%, enquanto o PIB industrial encolheu 1,5%.

"Pode ser que já haja alguma mudança [na matriz de crescimento, focada no consumo em anos anteriores], mas é preciso ver os números do quarto trimestre", diz.

Julio Gomes de Almeida, professor da Unicamp, afirma que dois fatores inspiram cautela nas perspectivas para o setor industrial e para o investimento, que "andam de mãos dadas". O primeiro é o ciclo de aperto monetário em curso, que ainda está surtindo efeito sobre a atividade. Quanto maior os juros, diz, maior a pressão negativa sobre o investimento. O segundo é a perda de vigor do consumo, que, na visão de Almeida, resulta da estagnação da renda média e da desaceleração do nível de emprego.

Nelson Marconi, da Fundação Getulio Vargas (FGV-SP), acredita que no quarto trimestre os números devem vir similares, com investimentos ainda tímidos. Os investimentos só retomarão algum fôlego a partir do segundo semestre de 2015, depois de uma melhora de confiança do empresário.

Para o economista, com um mês para acabar o ano, e com as definições de equipe e de política econômica começando a sair somente agora, o investimento não deve ocorrer mais em 2014. Ele acredita que levará algum tempo para que as decisões da equipe econômica afetem as decisões de gastos dos empresários.

O professor da pós-graduação do Insper Alexandre Chaia, está entre os que acreditam que o resultado do terceiro trimestre já mostra que o crescimento começou a ser liderado pelo investimento e não mais pelo consumo e isso deve continuar em 2015. "A demanda está contraída para serviços e produtos que já foram comprados pelas famílias, principalmente toda a parte de bens duráveis, como linha branca e automóveis", explica. Isso, no entanto, não exclui o fato de existir ainda a necessidade de infraestrutura. "Com o câmbio e o mercado mundial estimulando as exportações, isso vai fazer com que haja a necessidade que se invista."

A economista da Tendências Consultoria Alessandra Ribeiro concorda. "O consumo crescendo a ritmo chinês acabou", disse. "A tendência no médio prazo deve ser essa mesmo, com o investimento, do lado da demanda, e a indústria, do lado da oferta, puxando mais o crescimento, enquanto o consumo das famílias deve crescer acompanhando mais a expansão do próprio PIB."

Para José Francisco de Lima Gonçalves, economista-chefe do banco Fator, a desaceleração do consumo e dos serviços deve continuar no próximo ano e limita um crescimento robusto. Por ora, o Fator avalia que a economia vai avançar entre zero e 0,5% em 2015.

O sócio da GO Associados, Gesner Oliveira, lembra que o mercado externo é outro determinante que não vai jogar a favor da indústria no próximo ano, tendo em vista que a situação econômica na Argentina, importante destino para produtos manufaturados brasileiros, não deve melhorar.

Ele citou ainda a piora das expectativas dos consumidores em um horizonte de seis meses à frente como outro fator que afetará o cenário. "O arrefecimento do gasto das famílias é esperado pela situação de maior endividamento, maior restrição ao crédito e pelo aumento da inflação, que corrói os rendimentos", destacou.

Leal, do ABC, diz que há uma série de indefinições para 2015: as ações para garantir o esforço fiscal e os desdobramentos do escândalo da Petrobras sobre a formação bruta.