Poucos dias antes de ser escolhido ministro do Planejamento pela presidente Dilma Rousseff, o então professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Nelson Barbosa concluiu estudo para o ministro Guilherme Afif Domingos, da Secretaria Especial da Micro e Pequena Empresa, com propostas para mudar o regime tributário do Simples, entre elas a divisão das empresas por setores da economia e o aumento do teto de faturamento para que as indústrias se adaptem melhor ao programa.

O documento foi parte da negociação para aprovar a lei que universalizou o acesso ao Simples a todas as atividades econômicas no primeiro semestre deste ano. O governo se comprometeu a encaminhar, 90 dias após a sanção da lei que era discutida no Congresso, um outro projeto com atualização das regras. Em troca, os parlamentares desistiram de aumentar o limite de faturamento do regime.

A proposta coordenada por Barbosa - em parceria com Sebrae e Fundação Dom Cabral e apoio da Fipe e Insper - sugere a divisão do Simples em quatro categorias: comércio, indústria e duas para serviços -"uma para quem gera emprego e outra para empresas que não geram empregos", disse Afif.

Atualmente, há seis tabelas com alíquotas diferentes, mas a divisão foi mais política que econômica. Os advogados, por exemplo, angariaram apoio no Congresso para entrarem na tabela quatro, com menor carga tributária, enquanto as outras atividades econômicas incluídas no Simples este ano tiveram que começar pela tabela seis, cuja tributação é praticamente idêntica à das empresas de fora do regime.

A maior preocupação do ministério é criar uma faixa de transição para estimular as empresas a crescerem. Quando ultrapassam o teto de R$ 3,6 milhões de faturamento, as micro e pequenas precisam deixar o Simples e começar a pagar impostos pelo lucro presumido, o que eleva muito a carga tributária e faz com que a maioria opte por não expandir os negócios ou se dividir - o que é ilegal, mas rotineiro, admite o governo.

"Hoje há um desincentivo para que as micro e pequenas cresçam. A divisão em várias empresas para não estourar o teto é prática tão generalizada que mostra que o problema não está nas empresas, mas na lei", diz o deputado Pedro Eugênio (PT-PE), que ressalta que isso se repete mesmo para as que continuam no Simples - existem 20 faixas de tributação diferentes para cada nível de faturamento.

A proposta de Barbosa reduz essas faixas para sete e estabelece limites diferentes de faturamento para cada setor. A indústria, por exemplo, teria como teto anual uma receita bruta de R$ 14,4 milhões. O cálculo do imposto seria por alíquotas progressivas, como ocorre com o Imposto de Renda.

O texto foi apresentado ao Ministério da Fazenda há uma semana e ainda não foi divulgado publicamente. Na quarta-feira passada, Afif discutiu as diretrizes da proposta, e qual a melhor forma de tramitação, com os presidentes da Câmara dos Deputados, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), e do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL).

Hoje, a proposta será apresentada aos integrantes da Frente Parlamentar da Micro e Pequena Empresa. "Para agilizar a votação, a ideia é que um grupo de líderes partidários apresente o mesmo projeto na Câmara e no Senado, porque se for encaminhado pelo governo tramita em uma Casa de cada vez", diz o presidente da frente, deputado Guilherme Campos (PSD-SP).

Para fugir das resistências do governo diante do ajuste fiscal do próximo ano, a matéria já prevê que as mudanças só entrarão em vigor em 2016, afirma Campos. O deputado ressalta, contudo, que o conceito do estudo era para que não houvesse perda de arrecadação e que a escolha de Barbosa para o Planejamento pode acelerar o projeto. "Como teve a mão dele, pode ser que ajude ", afirma.

Outros deputados ligados à causa das micro e pequenas empresas se dividem sobre a influência do futuro ministro na tramitação do projeto. "O Barbosa é bem ponderado e experiente, mas essas mudanças são da alçada da Fazenda, não do Planejamento. Ele só poderá dar seu pitaco se for chamado e em governo costuma ser cada um na sua área", diz o deputado Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR).

"A presença do Barbosa com certeza facilita muito a discussão. O Simples é uma matéria específica da Fazenda, mas ele terá diálogo permanente com o ministro [Joaquim Levy] e pode influenciar", avalia Pedro Eugênio. "Só temos que saber se realmente ele vai apoiar esse projeto. Uma coisa é falar como consultor, outra é tomar a decisão política de executar."

O Valor procurou Barbosa por meio da assessoria da FGV e do governo, mas não teve resposta até o fechamento desta edição.