Título: O sumiço de 200 acervos
Autor: Pariz, Tiago
Fonte: Correio Braziliense, 22/06/2011, Política, p. 2

Pelo menos 200 acervos de documentos produzidos durante o regime militar ainda são desconhecidos. Os arquivos estariam em poder de universidades, empresas estatais e até bancos oficiais, que mantinham Assessorias de Segurança e Informação (ASI), espécie de filiais do extinto Serviço Nacional de Informações (SNI). Um levantamento feito por técnicos do próprio governo mostra que foram encontrados documentos de apenas 45 dos 250 órgãos públicos que tinham área de monitoramento na época. Entre os arquivos não localizados há vários do Departamento de Ordem Política e Social (Dops), um dos principais braços da repressão militar durante a ditadura.

Para se chegar ao número real de arquivos existentes nos órgãos públicos durante o regime militar, o Arquivo Nacional fez um cruzamento das difusões de documentos produzidos na época. Normalmente, papéis confidenciais e sigilosos eram repassados à comunidade de informações de todo o governo, enquanto os secretos tinham circulação restrita. Além do SNI e dos Centros de Informação e Segurança da Aeronáutica (Cisa), do Exército (CIE) e da Marinha (Cenimar), foram criados os Departamentos de Segurança e Informação (DSI) dentro dos ministérios e as ASI ligadas diretamente ao SNI, que tinham estrutura menor que outras centrais de espionagem.

O acervo perdido seria, em parte, de órgãos já extintos, como a Superintendência Nacional de Abastecimento (Sunab) e a Rede Ferroviária Federal. Outras instituições que armazenariam dados sigilosos permanecem em atividade, como a Fundação Nacional do Índio (Funai), os Correios e a Petrobras. Todas mantinham mini serviços secretos durante o regime de exceção. A recuperação dos 200 acervos documentais, caso ainda existam, pode engrossar o volume de papéis oficiais relacionados ao regime militar, que hoje ocupa quase 1,5 mil metros de prateleiras no Rio de Janeiro e Brasília, o que representa cerca de 16,6 milhões de páginas.

Agilidade O Arquivo Nacional criou uma comissão para dar agilidade à liberação dos documentos a pesquisadores. Os técnicos vão analisar os papéis para avaliar os que realmente podem ser liberados de imediato, sem que violem intimidade, honra, vida privada e imagem das pessoas. Hoje, alguns nomes de personagens citados nos documentos são tarjados, mesmo sem necessidade. "Não se pode, por exemplo, tarjar o nome de uma passeata", observa o diretor-geral do Arquivo Nacional, Jaime Antunes da Silva. "O que não pode é mostrar a intimidade de uma pessoa, como a opção sexual julgada na época pelos serviços de informações", acrescenta.

A comissão terá 180 dias para analisar diversos acervos, inclusive do SNI, que deverá ser o mais demorado, por ser composto por mais de 1,1 milhão de páginas. Antunes acredita que muitos papéis serão avaliados antes mesmo do encerramento do prazo. "O que queremos é liberar lotes antes dos seis meses, principalmente os lotes em que não houver dúvida sobre a preservação da intimidade das pessoas", diz o diretor do Arquivo Nacional.