O sucesso dos empreendimentos termelétricos no leilão A-5 de sexta-feira surpreendeu agentes do setor elétrico, indicando um novo caminho para os investidores na geração de energia elétrica.

"Foi uma surpresa a quantidade de energia contratada [no leilão], quase 5 mil megawatts (MW) de potência de energia, com destaque para duas térmicas a gás que respondem por quase a metade da potência", afirmou Selma Kawana, gerente de projetos da Excelência Energética.

De acordo com Ana Karina Esteves de Souza, sócia do Machado, Meyer, Sendacz e Opice Advogados, a contratação de térmicas vai chamar a atenção de investidores, que vão acompanhar de perto o desenvolvimento do projeto.

O leilão contratou 2.742 MW médios de garantia física (quantidade máxima de energia que as usinas podem comercializar por contratos), ou 4.979 MW de potência instalada, movimentando R$ 114,5 bilhões. A energia é para abastecimento a partir de 2019.

As térmicas a biomassa, carvão e gás natural venderam 2.303 MW médios, ou 83% do total vendido. Os destaques foram duas térmicas utilizando gás natural liquefeito (GNL) importado, do grupo Bolognesi, uma utilizando gás natural da Amazonas Energia, subsidiária da Eletrobras, além de uma usina movida a carvão, da Tractebel Energia,

A Tractebel vendeu toda a energia habilitada para o leilão, afirmou Manoel Zaroni, presidente da empresa, em entrevista concedida ao Valor. Em relação aos próximos leilões de geração previstos para o primeiro semestre do ano que vem, Zaroni afirmou que a companhia "está sempre estudando" outras oportunidades, mas está "contente com os investimentos" feitos atualmente.

A usina a carvão Pampa Sul, vendida pela Tractebel no leilão, tem 294,5 MW médios. Segundo Zaroni, a companhia "sempre teve muita vontade" de ampliar a energia gerada a carvão e aproveitou a oportunidade desse empreendimento. "Na verdade, temos ainda a possibilidade de ter uma outra unidade de carvão com mais 340 MW", completou.

Para a diretora-executiva da consultoria Thymos Energia, Thaís Prandini, apesar do preço médio elevado da contratação de térmicas, em relação a fontes mais baratas como a hídrica e a eólica, a introdução dessas usinas para operar na base do sistema, ou seja, de forma permanente, amplia a segurança energética do país.

"Uma matriz só com hidrelétricas não traz a segurança necessária, é um preço mais caro agora para evitar custos mais elevados no futuro, como a exposição ao mercado de curto prazo ou até mesmo o racionamento", diz.

O leilão vendeu também 415,1 MW médios de energia de fonte eólica, com preço médio de R$ 136 por megawatt-hora (MWh), quase sem deságio em relação ao teto de R$ 137 por MWh.

Para Selma, o impacto da alta do dólar sobre o custo com equipamentos influenciou na baixa contratação de eólicas, que representaram 15% da capacidade contratada, ante expectativa de 60% da Associação Brasileira de Energia Eólica (Abeeólica).

Segundo Laura Souza, advogada do Machado, Meyer, Sendacz e Opice Advogados, há uma abundância de projetos eólicos contratados em outros leilões em vias de funcionamento e o resultado dessa disputa é um sinal de que se chegou "a um ponto de saturação".

"Os arranjos comerciais entre fornecedores e empreendedores vão começar um novo ciclo, terão que ser repensados", afirmou. A consultora da Thymos lembrou ainda que os investidores também podem ter optado por aguardar o leilão de renováveis marcado para março de 2015.

O certame contratou também 23,7 MW médios de três pequenas centrais hidrelétricas (PCHs), mas não houve nenhuma oferta pela única hidrelétrica habilitada, a de Itaocara I, cuja concessão foi devolvida pela Cemig e Light.

A gerente de projetos da Excelência Energética avalia que a falta de concorrência por essa usina já era esperada, pois o preço-teto estabelecido para a fonte, de R$ 114 por MWh, era insuficiente para viabilizar o empreendimento.

Na coletiva logo após o leilão, José Carlos de Miranda, diretor da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), afirmou que as incertezas sobre a situação hídrica podem ter sido responsáveis pela falta de oferta. A usina, porém, deve ser licitada novamente no próximo leilão A-5, que deve acontecer no primeiro semestre do ano que vem.

O Ministério de Minas e Energia anunciou a intenção de antecipar os leilões de energia nova e um de energia existente de 2015 para o primeiro semestre, atendendo reivindicação do setor. Selma, no entanto, vê o anúncio com descrença, lembrando que outras tentativas de antecipar os certames para o início do ano fracassaram.

Em 2015, o leilão mais aguardado é o da hidrelétrica de São Luiz do Tapajós, no Pará, que promete ser muito competitivo e contratar energia barata, após ser adiado por problemas de licenciamento.

 

Grupo Bolognesi vai construir dois terminais de regaseificação de GNL

 

As duas termelétricas a gás negociadas pelo grupo Bolognesi no leilão A-5, de sexta-feira, vão viabilizar a construção de dois novos terminais de regaseificação (que convertem gás natural liquefeito em gás natural) no país. As novas unidades serão construídas nos portos de Suape (PE) e Rio Grande (RS), pela Excelerate Energy, primeira empresa privada a investir num terminal do tipo no Brasil, e terão capacidade para injetar gás nos gasodutos e abastecer o mercado não-termelétrico.

"O governo deu um sinal muito positivo de que vai contratar térmicas a gás com preços mais razoáveis. Tivemos tarifas que permitiram viabilizar economicamente esses projetos. Foi uma mudança brutal. Somos o primeiro grupo a conseguir fechar contratos de longo prazo para compra de gás natural liquefeito no país", comentou Ronaldo Bolognesi, presidente do grupo.

As termelétricas Rio Grande (RS) e Novo Tempo (PE), ambas com 1.238 MW de capacidade instalada, foram negociadas a R$ 206,5 por MWh. Cada uma das usinas exigirá investimentos de R$ 3 bilhões. A estrutura financeira do projeto, segundo o executivo, já está montada.

"Cerca de 15% do investimento será bancado com recursos próprios. O restante virá de financiamentos. Já está tudo acertado. Teremos como parceiros o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e um fundo internacional de investimentos em energia", disse Bolognesi, sem informar o nome do investidor parceiro.

Além das usinas, o grupo investirá na instalação do píer onde serão construídas as unidades de GNL. Os aportes nas instalações dos terminais, em si, serão feitos pela Excelerate Energy, que também fornecerá os navios regaseificadores.

A expectativa da Bolognesi é iniciar as obras das usinas em meados do ano que vem e concluir o projeto em 2018, seis meses antes do prazo contratual para início da entrega da energia. O plano é antecipar a operação para negociar a energia disponível no mercado de curto prazo.

A Bolognesi fechou um contrato de 25 anos com a Excelerate Energy, para os serviços de regaseificação. O valor não foi revelado. A companhia também não informou o custo de importação do gás.

Cada um dos terminais terá capacidade para fornecer 14 milhões de metros cúbicos diários de gás natural. A expectativa é que uma capacidade de 6 milhões de m3 /dia seja reservada para abastecer as usinas. Os demais 8 milhões de m3 /dia serão disponibilizados para o mercado não-termelétrico.

A Petrobras é, atualmente, dona dos únicos três terminais de regaseificação do país e importa GNL no mercado de curto prazo. Juntas, as unidades de Pecém, no Ceará; Baía de Guanabara, no Rio de Janeiro; e Baía de Todos os Santos, na Bahia, têm capacidade para entregar 41 milhões de m3 /dia de gás.

Os investimentos da Excelerate são bem vistos pelas distribuidoras de gás, sobretudo as do Sul do país. A região é abastecida, atualmente, exclusivamente pelo gasoduto Bolívia-Brasil (Gasbol), que começa a dar sinais de saturação e já não consegue sustentar o crescimento do mercado local de gás, segundo estudos do Grupo de Economia da Energia, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (GEE/UFRJ).