O governo quer acabar com o "privilégio" da Infraero de ficar impune a multas e restrição de receitas por má gestão dos aeroportos. Está em fase final a elaboração de um plano de metas de qualidade para os terminais aeroportuários administrados pela estatal, como o Santos Dumont. O texto, que está a cargo da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), trará previsão de multas e reajustes menores da taxa - de embarque e aeroportuárias, como as pagas por companhias aéreas - caso a Infraero não cumpra as metas, revelou ao GLOBO o ministro da Secretaria de Aviação Civil (SAC), Moreira Franco. O documento será submetido a audiência pública assim que a minuta da norma for finalizada.

- A taxa aeroportuária é para a prestação do serviço ao usuário. Se o serviço não tem a qualidade que o usuário requer, ele não tem por que pagar o mesmo preço de um serviço de boa de qualidade - disse o ministro.

O não cumprimento dessas metas pode resultar no congelamento das taxas aeroportuárias, ou em um reajuste menor que o pleiteado. Hoje, as taxas dos terminais da Infraero são reajustadas independentemente da qualidade do serviço. Após a implantação das metas, os reajustes dependerão do desempenho de cada aeroporto.

- É a mesma regra dos aeroportos concedidos. Se você não cumpre essas metas, os seus ganhos têm que ser menores - disse Moreira Franco. - O que precisa ser muito bem definido é a consequência. Não adianta ter meta, política de desempenho, se não tem consequências. E tem de ser uma consequência que fale ao bolso.

O ministro não disse quando novas regras entram em vigor, somente que será "o mais rápido possível". Segundo uma fonte próxima da SAC, será até abril. Moreira Franco defendeu ainda mudanças na governança da Infraero, para que "o aeroporto seja efetivamente o centro de negócios da empresa":

- Ela tem uma visão pública, o aeroporto é como se fosse um hospital, uma escola. E isso impede que você possa ter meritocracia, avaliação de desempenho e consequências no processo de avaliação de desempenho.

Especialistas criticam proposta

A proposta, no entanto, foi alvo de críticas de especialistas, como Elton Fernandes, professor do Programa de Engenharia de Produção da Coppe/UFRJ.

- A Infraero está falida. Se fixarem multa para ela, será como dar a pá para ela se enterrar ainda mais - afirmou Fernandes, lembrando que no ano passado a estatal registrou prejuízo de R$ 1,2 bilhão e, este ano, deve ter resultado negativo de R$ 405,6 milhões. - Antes do processo de concessões, a Infraero tinha superávit operacional. Fixar multa para ela é acrescentar dívida para o governo.

O professor criticou ainda o modelo de concessões de aeroportos que estabeleceu participação de 49% da Infraero nos consórcios:

- Criaram uma sociedade muito esquizofrênica. A Infraero é a maior proprietária individual do consórcio. Não se pode fazer um processo de concessão privada dessa forma. Só funcionaria se fosse um consórcio sem fins lucrativos, o que não é o caso. A Infraero não tem que participar de nada e não tem que ter obra. Tinha que se fazer a concessão direta, sem estatal.

Surpreso com a proposta, o presidente da Inter.B Consultoria Internacional, Cláudio Frischtak, também vê a medida com preocupação:

- O fato de a Infraero cumprir metas, tudo bem. Mas ela hoje é deficitária. De onde virão os recursos para investimentos e manutenção para ela cumprir essas metas?

Já Simone Escudêro, diretora da All Consulting, teme que a novidade dê margem para que aeroportos mais eficientes tenham reajustes acima da média, o que teria impacto sobre todo o mercado. Ela considera a Infraero capaz de cumprir metas de qualidade, mas destaca a necessidade de investimentos.

Para terminais concedidos, norma antiga

A Infraero informou em nota que está em processo de reestruturação, a ser implantado a partir do mês que vem, que "garantirá níveis adequados de serviços, expansão adequada da infraestrutura e capacidade de geração de receitas que irão financiar os empreendimentos e custear as ações de melhoria da qualidade dos serviços prestados".

Nada muda nos seis aeroportos que foram concedidos ao setor privado - Galeão (RJ), Guarulhos (SP), Viracopos (SP), Confins (MG), Brasília e São Gonçalo do Amarante (RS) -, nos quais a Infraero tem participação de 49% no capital. Nesses casos, explicou Moreira Franco, vale o que foi estabelecido nos contratos firmados por ocasião da concessão.

 

 

Plano da aviação regional fica para janeiro

 

Prioridade para votar mudança na meta de superávit primário impede apreciação de proposta

Geralda Doca

A decisão do governo de dar prioridade à votação do projeto que desobriga o cumprimento da meta de superávit primário neste ano prejudicou a tramitação da medida provisória (MP) 652, que cria o subsidio à aviação regional. A MP perde a validade na segunda-feira. O ministro da Secretaria de Aviação Civil (SAC), Moreira Franco, informou que, como plano B, será editada uma nova MP em janeiro, a fim de assegurar o pagamento dos subsídios às aéreas em 2015. O texto foi aprovado pela comissão mista para o tema, mas não avançou no plenário da Câmara.

Diante das idas e vindas na votação da MP, inclusive com alterações para beneficiar Gol e TAM, a Azul ameaçou suspender rotas regionais. E informou que o atraso nos subsídios pode levar ao cancelamento de suas operações em São José dos Campos (SP) e Araraquara (SP), asseguradas até meados de dezembro. A justificativa da Azul é que essas ligações dão prejuízo.

AZUL QUER PARCERIA COM TAP

Pela MP, o governo se compromete a arcar com o custo de metade dos assentos, no limite de 60 por avião, nas rotas regionais. Esse limite acabou prevalecendo no relatório final aprovado pela comissão, diante da pressão da Azul.

Ontem, o fundador da companhia, David Neeleman, esteve com a presidente Dilma Rousseff, numa audiência marcada de última hora. Segundo interlocutores, além do atraso no programa de aviação regional, ele falou dos preparativos da Azul para sua entrada nos EUA: Miami em dezembro, Orlando em janeiro e Nova York em junho ou julho.

O interesse da aérea em uma parceria com a portuguesa TAP também teria sido discutido. Na semana passada, o governo português colocou à venda 66% do capital da empresa, que voa para as principais capitais do Brasil. O governo brasileiro vê com bons olhos a compra da TAP pela Azul. Procurada, a Azul disse que não comentaria o assunto.