A derrubada do decreto presidencial que criou a Política Nacional de Participação Social poderá impulsionar o governo federal a buscar alternativas, talvez mais eficazes, de se incrementar a participação da sociedade civil nos processos decisórios de políticas públicas. Já não cabe mais discutir se o decreto é ou não constitucional, se usurpou ou não competências do Congresso Nacional. Particularmente penso que não. Mas esta seria uma questão para o STF, para onde esta discussão não foi levada.

Fato é que, pela sua extensão e complexidade, o decreto pareceu uma norma politicamente exibida. E esta exibição causou a sensação de subtração de poder no Congresso. Como reação, o Legislativo federal fez uso do poder político de controle normativo que lhe foi conferido pela Constituição Federal de 1988.

Mas este freio político não é motivo para paralisar o governo federal. Existem, no sistema jurídico vigente, outros mecanismos alternativos para implementar sua intenção. Destaco dois deles.

O primeiro, no âmbito da própria administração pública federal: a determinação para que sejam publicadas, na internet, previamente, consultas públicas on-line sobre futuras decisões que possam afetar larga faixa da população e que sejam de interesse geral, tais como política de multas de trânsito, formas de atendimento do SUS, destinação de recursos para grandes obras. Também neste âmbito, determinar que os conselhos federais existentes deem ampla publicidade às suas atas, decisões, critérios, projetos protocolados, bem como realizem audiências ou consultas públicas para todos os projetos que possam ter impacto social.

Já há dezenas de conselhos federais implantados, como o Conselho Consultivo do Iphan, Conselho do FGTS, o Conselho das Cidades, o Conselho Nacional de Trânsito, Conselho de Educação, Conselho de Federal de Cultura, Conselho Nacional de Meio Ambiente, Conselho Administrativo de Defesa Econômica; mas nem todos têm essas práticas.

A segunda alternativa, talvez a mais importante, seria exigir que os estados e municípios implementem consultas e audiências públicas para os projetos financiados com recursos federais, como condição de receber tais recursos. O Rio, por exemplo, vem recebendo muitos recursos federais para realizar obras que causam grande impacto na cidade, tais como a Transcarioca, a Transolímpica, o VLT no Centro da Cidade, a linha 4 do metrô, o Parque Olímpico da Barra com seu futuro e enorme bairro pós-2016.

Nenhum destes projetos teve Estudo de Impacto de Vizinhança, como determina a lei federal do Estatuto das Cidades. Portanto, são projetos realizados com recursos federais, mas sem a participação social efetiva da população local.

Participação social se constrói de preferência a partir das bases. Nada melhor do que começar pelas cidades. O governo federal tem a força dos recursos públicos que financiam muitos projetos urbanos e, por isso, pode estabelecer condicionantes para seus processos decisórios que envolvem estes recursos.

E, para isso, nem precisa de um novo decreto. Bastam normativas simples de procedimento administrativo a partir de cada órgão federal que transfere dinheiro para estados e municípios. É simples e educativo, e pode ser implementado a partir de amanhã.