A ausência da base aliada e a pressão da oposição impuseram ontem uma importante derrota ao governo, que não conseguiu votar, na sessão do Congresso, a proposta que muda a meta fiscal de 2014. Depois de gritos e xingamentos, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), encerrou a sessão e adiou para a próxima terça-feira a votação do projeto que permite ao governo descumprir a meta de superávit fixada na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2014. O superávit é uma economia para o pagamento dos juros da dívida pública. O Palácio do Planalto ficou incomodado com a derrota, porque esperava anunciar hoje nomes da equipe econômica já com a mudança na LDO aprovada. 

O fracasso só não foi maior porque o Congresso conseguiu votar os 38 vetos presidenciais que trancavam a pauta, sem derrubar nenhum. A expectativa na ala rebelde da base aliada era de derrubar aqueles que tratavam de criação de novos municípios e de minirreforma eleitoral. 

Com o fracasso da votação da LDO, o governo terá um novo desafio. Até a próxima terça-feira, a pauta do Congresso já estará trancada por outros dois novos vetos, que têm prioridade de apreciação. Com isso, a votação poderá ficar para o dia 9. 

Renan afirmou que o adiamento da votação "não preocupa", e atribuiu o insucesso à ausência da base aliada do governo. 

- Não tínhamos como continuar. No processo legislativo, é assim: a maioria sempre se manifesta. E ela só pode se manifestar se existir, se estiver no plenário. 

Falta de articulação política 

Segundo parlamentares, a ação foi um sinal de que o Congresso não vai agir de forma atropelada, por imposição do Planalto. Mas, nos bastidores, há uma briga no PMDB, uma divisão entre as bancadas da Câmara e do Senado. Parlamentares não gostaram do poder que Renan e o senador Romero Jucá (PMDB-RR) - relator do projeto que muda a meta - ganharam nas negociações. Há ainda problemas com as indefinições da reforma ministerial e liberação de recursos. 

Numa desarticulação política, o governo não conseguiu mobilizar um quorum mínimo, de 257 deputados e 41 senadores, para garantir a votação da proposta da meta de superávit. Compareceram apenas 222 deputados e 32 senadores. A falta de empenho da base aliada ficou evidente. As ausências foram generalizadas, com destaque para o PMDB: dos 71 deputados do partido, apenas 28 compareceram; e dos 19 senadores, só oito. Mas até no PT houve mais de um terço de faltas entre os deputados. Estavam presentes 69 parlamentares petistas, sendo 57 deputados, de uma bancada de 87, e 12 dos 13 senadores. O desleixo se repetiu em vários partidos da base, que levaram menos da metade de suas bancadas, como PP, PR, PRB, PROS e PSD.

Enquanto se votava a matéria mais importante da atualidade para o governo, o líder do PMDB na Câmara, deputado Eduardo Cunha (RJ), por exemplo, optou por participar de um almoço da bancada do PSC em apoio à sua candidatura à Presidência da Câmara. O líder do DEM, deputado Mendonça Filho (PE), disse que a oposição venceu com a ajuda dos insatisfeitos da base aliada: 

- É um cochilo premeditado da base. O que aconteceu não foi apenas o peso da oposição. Houve participação da bancada governista, que não compareceu. 

Candidato derrotado nas eleições, o senador Aécio Neves (PSDB-MG), disse que a ausência da base foi um recado para a presidente. 

- A presidente Dilma Rousseff, para se livrar de um crime de responsabilidade, terá de entregar, necessariamente, mais espaço de poder. E eles sabem disso. Só vão dar a ela a anistia que busca, se forem atendidos em seus pleitos. A presidente está refém de uma estrutura política que só lhe dá apoio em torno de espaço de poder - comentou Aécio, que não registrou presença na sessão do Congresso. 

Prazo termina em 22 de dezembro 

Renan negou que haja insatisfações do PMDB quanto às negociações da reforma ministerial. 

- Não sei (se foi derrota do governo). Prefiro olhar a impossibilidade de continuar a sessão pela ausência da maioria. Não sei (se há insatisfação). O PMDB não tem nenhuma ansiedade, absolutamente, com a composição do governo. Se o PMDB for chamado a participar, o PMDB do Senado vai decidir na sua bancada de que forma vai participar. Tem muita gente na bancada que não quer participar, que quer ficar numa posição de independência. De forma que o PMDB não guarda e repele qualquer ansiedade com relação a isso - disse Renan. 

O governo tem até o dia 22 de dezembro para votar a mudança da meta fiscal. Se não aprovar a redução da meta dentro da LDO, a presidente pode ser acusada de crime de responsabilidade, por descumprir a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), e pode ser obrigada a pagar multa de 30% dos seus vencimentos anuais.

 

 

Economistas pedem que Lei de Responsabilidade Fiscal seja respeitada

 

Abaixo-assinado a ser enviado ao Congresso diz que mudança na LDO levará a descontrole

 

 

Uma petição criada no site Avaaz reuniu até a noite de ontem 1.858 assinaturas contra o projeto que altera a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). O abaixo assinado pede para o Congresso "não jogar no lixo" a Lei de Responsabilidade Fiscal com a aprovação da proposta que desobriga o governo de cumprir o superávit este ano.

A iniciativa foi de economistas da PUC-Rio. De acordo com os organizadores, teriam assinado a lista economistas renomados como Edmar Bacha, Elena Landau e José Roberto Afonso. A intenção é alcançar duas mil assinaturas para encaminhar o abaixo-assinado aos líderes do Congresso.

Além de criticar a medida do governo, a petição diz que a mudança irá aumentar a inflação e a recessão econômica. "A Lei de Responsabilidade Fiscal é uma conquista da sociedade brasileira. O descontrole das contas públicas terá como consequências a perda de credibilidade do Governo Federal, o aumento do endividamento, o aumento da inflação e a recessão econômica. Nós já assistimos a esse filme durante os anos 80, e não merecemos vê-lo de novo!", afirma o texto.

O abaixo-assinado sugere que os internautas congestionem as linhas telefônicas dos parlamentares para exigir que a alteração não seja aprovada.