A ida da senadora Kátia Abreu (PMDB-TO) para o ministério da Agricultura está longe de ser uma unanimidade no setor. A resistência, dizem fontes, extrapola o front parlamentar. Nos bastidores, setores produtivos lideram forte lobby pela permanência do atual ministro, Neri Geller (PMDB-MT).

Na Câmara, o nome Kátia Abreu é especialmente rejeitado por deputados de Mato Grosso, responsáveis pela indicação de Geller ao posto, e também por parlamentares do PMDB, onde desponta o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que está em campanha pela presidência da Câmara à revelia do governo e é influente nas indicações no Ministério da Agricultura. Na disputa pela aprovação da Lei dos Portos, em 2013, Kátia e Cunha estiveram em lados opostos. Ela, do lado de Dilma. Ele, contra.
Canal direto dos ruralistas do Centro-Oeste, a gestão de Geller no ministério vem sendo muito elogiada por parlamentares e associações de classe. Mas não é na competência do atual titular da Pasta que está o ponto central da aversão ao nome de Kátia.
O receio é que a senadora repita à frente do ministério o mesmo comportamento que vem tendo na bancada ruralista e na presidência da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA). De acordo com fontes ouvidas pelo Valor, Kátia seria "autocrática", "mandona" e de difícil diálogo.

"A senadora é uma pessoa focada que, quando tem um objetivo, faz de tudo para alcançá-lo. A questão é que, para isso, ela passa em cima de algumas pessoas, força as coisas. É muito mandona e apela com aqueles que discordam da sua opinião", diz uma fonte que preferiu não se identificar.
Criticada por ter muito mais um projeto pessoal do que setorial à frente da CNA, Kátia Abreu traz a essas fontes do setor um certo receio de que os pequenos projetos podem não ter a atenção devida numa possível gestão da senadora. "Ela dará atenção aos grandes e aos pequenos como vem sendo feito hoje pelo Geller?", questiona um produtor de grande porte.

A despeito de críticas e da rejeição de deputados de Mato Grosso, a indicação de Kátia Abreu agradou importantes lideranças do setor. Ex-secretário da Agricultura de São Paulo João Sampaio afirmou que Kátia reúne credenciais para ser uma "ótima" ministra e devolver o protagonismo à Pasta.

"Acho que a presidente acertou. Pela forma como age, tem condições de fazer o ministério ser protagonista, e não coadjuvante", diz Sampaio, que apoiou a candidatura do senador Aécio Neves (PSDB-MG) à Presidência e liderou a secretaria da Agricultura de São Paulo nos governos de José Serra e Geraldo Alckmin. Defensora do agronegócio "com unhas e dentes", avalia Sampaio, Kátia é um nome adequado num momento em que o governo busca "credibilidade".
Sampaio destaca, ainda, a "força política" de Kátia Abreu, que tem boa interlocução com a presidente Dilma Rousseff, é importante nas tratativas com outros órgãos, como o Ministério da Fazenda. "O ministério precisa de alguém que conheça o Legislativo, mas que possa conversar com a Fazenda. Kátia tem essa estatura", afirma.
Ao Valor, a associação que representa os produtores de soja e milho do país, a Aprosoja Brasil, se posicionou favoravelmente à indicação de Kátia Abreu para o cargo. Almir Dalpasquale, presidente da entidade, considera "muito bem vinda" a escolha da senadora, um "nome de construção, de inteligência, que conhece muito bem o meio". "À frente da CNA nos últimos anos, a senadora já tratava de todos os assuntos que o ministério trata, e sempre foi impecável conosco", disse.
Para Dalpasquale, Kátia "revolucionou" a CNA com investimento e tecnologia. É ainda, na sua visão, uma pessoa "determinada", que pode fazer o "choque de gestão necessário ao ministério". "Há hoje normativas ainda dos anos 1940, completamente fora da nossa realidade. É preciso que entre alguém com a mentalidade de tentar mudar, como a senadora", conclui.

Uma das lideranças mais proeminentes do agronegócio, o ex-ministro Roberto Rodrigues também disse que recebeu com satisfação a notícia de que Kátia Abreu pode assumir a Pasta. Para ele, a senadora é atualmente a maior líder da agropecuária e representa uma garantia de que o setor vai ser tratado adequadamente. "Não há cadeia produtiva do agronegócio da qual ela não tenha conhecimento profundo", diz Rodrigues.

Ele ponderou, no entanto, que se fosse seu o poder de escolha, manteria o atual ministro. "O Neri está fazendo um excelente trabalho e é muito apoiado pelo setor", afirmou Rodrigues que, coordena o departamento de Agronegócio da FGV e a presidência do conselho da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica). Na última eleição, Rodrigues apoiou Aécio Neves.

 

PMDB deverá ficar com seis ministérios

 

A presidente Dilma Roussef e o vice-presidente Michel Temer devem se reunir em dezembro para definir a participação do PMDB no ministério do segundo mandato da petista. A sigla deve comandar seis pastas, uma a mais do que dispõe atualmente. Está acertado que a senadora Kátia Abreu (TO), presidente da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), entrará na cota da bancada do partido no Senado.

O PMDB assimilou a indicação da senadora Kátia Abreu, mas tem restrições quanto ao encaminhamento dado pela presidente às mudanças na cota do partido: teme chegar a dezembro com os principais ministérios já ocupados e sem condições de operar um equilíbrio entre as indicações do Senado e da Câmara. Com a indicação de Kátia, os senadores ficaram com as pastas mais fortes: Agricultura, Minas e Energia, Previdência Social e Turismo, que era da cota da Câmara e hoje é comandado por um nome indicado pelo presidente do Senado, Renan Calheiros.

A expectativa do PMDB é que seja somado o Ministério da Integração Nacional às cinco pastas atualmente detidas pelo partido. O problema é equilibrar a divisão entre as bancadas do Senado e da Câmara. Os deputados reivindicam a indicação para o Ministério das Minas e Energia, para o qual dois senadores são cotados: Eunício Oliveira (CE) e Eduardo Braga (AM). O atual presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves, pode substituir o ministro da Previdência, Garibaldi Alves, o que já seria uma compensação para a Câmara.

O ministro Moreira Franco deve permanecer na Aviação Civil e o presidente da Fundação Ulysses Guimarães, Eliseu Padilha, vai ocupar a terceira pasta destinada à cota da Câmara, a depender do arranjo. O PMDB tem a expectativa de que Cidades ou Transportes entre na discussão, mas não é provável. O importante, para o PMDB, é que as pastas sejam igualmente divididas entre Câmara e Senado. Michel Temer, Renan Calheiros e o líder da bancada na Câmara, Eduardo Cunha, estão de acordo quanto a isso e aos nomes que o partido deve indicar para a presidente.

Assim como o PMDB do Senado, a direção do PT também deu aval à indicação da senadora Kátia Abreu para o Ministério da Agricultura. Mas há insatisfação nos dois partidos sobre o nome escolhido pela presidente da República. Ontem o tema esquentou o debate de uma reunião da bancada de senadores do PT. O senador Lindbergh Farias (PT-RJ) criticou a escolha, alegando que a senadora pemedebista é um símbolo do ruralismo e que esta decisão iria ferir os interesses do movimento social.

Coube à senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR), ex-chefe da Casa Civil da Presidência da República, defender o convite da presidente Dilma à ruralista. Segundo Gleisi, o Ministério da Agricultura não executa políticas sociais. No caso específico da reforma agrária, trata-se de assunto da esfera do Ministério do Desenvolvimento Agrário. Gleisi disse ainda que a senadora Kátia Abreu apoiou a reeleição da presidente Dilma Rousseff de forma bastante clara. Na realidade, Kátia disputou a reeleição para o Senado com apoio do PT e seu primeiro suplente é do Partido dos Trabalhadores.

Existe também desconforto dentro do PMDB com o processo centralizado de negociação de espaços no governo. Sob reserva, dirigentes da sigla afirmam que desta vez, ao contrário do que foi feito em outras reformas ministeriais, o vice-presidente não consultou as instâncias formais do partido ou as bancadas da Câmara ou do Senado antes de aceitar a indicação da senadora Kátia Abreu ao ministério da Agricultura. As consultas teriam se limitado a Temer, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL) e os líderes da bancada na Câmara e no Senado, Eduardo Cunha (RJ) e Renan Calheiros (AL).

O atual ministro, Neri Geller, ganhou sustentação em parte da bancada do Senado e na Câmara. O vice-governador eleito em Minas, Antonio Andrade, que foi ministro até o início do ano, pretendia influenciar pela indicação do deputado Mauro Lopes, secretário geral da sigla. A escolha de Kátia Abreu foi vista como um processo clássico de "barriga de aluguel", em que a presidente faz uma indicação de sua preferência dentro da cota de cada partido no ministério. O apoio mais relevante a Kátia na bancada parte do senador Waldemir Moka (MS).

Enquanto a senadora Kátia Abreu não é oficializada para a Agricultura, o atual ministro da Pasta, Neri Geller, está em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, representando o vice-presidente Michel Temer em evento de inauguração de uma planta industrial da BRF. O próprio Temer e o chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, porém, tomaram o cuidado de avisar a Geller que sua viagem não foi por conta dos boatos de nomeação no ministério.