Há um esforço recorrente da indústria de champagne e espumante para dessacralizar as borbulhas. O consumidor é incentivado a beber na praia, na balada e até no campo de futebol sem pompa ou circunstância. As festas de fim de ano devolvem, contudo, a função de celebração das bebidas. É a época de investir nos rituais, propor inovações e vestir as garrafas para presente. A Chandon, por exemplo, fracionou os 750 ml de "brut" em quatro minifrascos e montou um kit com rótulos extras para que o próprio conviva escreva em cada um deles seus desejos para 2015. A Veuve Clicquot organizou um concurso para a renovação de uma embalagem - o "look" vencedor será vendido internacionalmente. A Perrier-Jouët convidou o artista Vik Muniz para enobrecer ainda mais sua garrafa da Belle Epoque Rosé. Mas é a francesa Duval-Leroy que chega cheia de graça ao país e com um investimento de R$ 10 milhões. 

A "maison", uma das únicas 100% familiar e independente da França, passa a ser representada aqui pelo grupo BRP (com um sócio brasileiro e dois de Dubai), que já atua no Brasil na importação de produtos gastronômicos, no ramo de seguros e imóveis. Sua base fica em Florianópolis (SC). O lançamento oficial será em 17 de dezembro com uma festa na butique da Baccarat, em São Paulo, e a presença da presidente da marca, Carol Duval-Leroy. Na sequência, o grupo abre um espaço customizado no restaurante Reis e Magos, em Angra dos Reis, para a temporada de verão. A proposta mais carnuda, contudo, é a instalação de uma Villa Duval-Leroy, a 80km de São Paulo, próxima à cidade de Juquitiba. Será um espaço de convívio em plena Mata Atlântica, com sete bangalôs e toda a roupagem da marca - de "ombrelones" a toalhas - para receber clientes e VIPs. 

No próximo mês, começam a ser distribuídas 10 mil garrafas de 11 rótulos diferentes em empórios, restaurantes, casas noturnas e hotéis de luxo. O preço de entrada é R$ 245 ("brut" NV, com 91 pontos na Wine Spectator) e chega a R$ 2,3 mil (Femme Vintage 1996, com 97 pontos, na Wine Spectator). Em 2015, a previsão de comercialização é de 55 mil unidades. Wael Mustafa, um dos sócios do grupo, convenceu a matriz francesa de "que produtos voltados para as classes A e B terão potencial de crescimento cada vez maior em um país que estará entre as cinco maiores economias do mundo nos próximos anos". A produção deste ano deve atingir 6 milhões de garrafas, sendo França, Reino Unido e EUA os três principais mercados. "Num prazo de três anos acredito que vamos conquistar 10% do mercado brasileiro de champagne que hoje é de 1 milhão de garrafas", diz Carol Duval-Leroy. 

A intenção de Mustafa é posicionar a Duval-Leroy ao lado de Louis Roederer e Taittinger. "Em três anos, queremos que a marca seja no Brasil o que é na Europa, ou seja, líder na classe A." Não estaria o investidor de Dubai um tanto quanto otimista? Ele diz ter montado seu plano de negócios com base nos dados da consultoria Wealthinsight. "Uma cidade como São Paulo, por exemplo, possui mais bilionários que Paris, Los Angeles e Genebra. Já o número de milionários no Brasil crescerá 8,9% em 2014. A expectativa é que a base de milionários ultrapasse 200 mil pessoas com patrimônio maior que US$ 1 milhão. Obviamente, nossos produtos não são apenas para milionários, mas também para aqueles que buscam a diferenciação." 

Pela pesquisa da Bain & Co sobre o mercado de luxo, a categoria de champagne e vinhos finos deve crescer 5% neste ano, mesmo com alguns mercados sofrendo desaceleração. Seria por isso que só agora a "maison" decidiu olhar para o "potencial brasileiro"? "Embora o mercado russo esteja em evidência, movimentando ao redor de 1,5 milhão de garrafas por ano, a queda não chegou a impactar assim o mercado global. Comparativamente, o Brasil já é um mercado de 1 milhão de garrafas por ano. Por isso, a estratégia de fortalecer a presença em países que apresentam crescimento expressivo nas classes sociais A e B torna-se importante", diz Mustafa. Carol quer crescer em outros mercados além dos óbvios. "Todo mundo fala da China, mas acredito que precisamos olhar para outros países, como Austrália, Nigéria e Brasil. O mercado brasileiro já é considerado sólido e educado para o champagne. Vocês amam as boas coisas da vida e celebrar." 

A "maison" Duval-Leroy foi fundada em 1859 e fica localizada em Vertus. São 200 hectares próprios, mas a empresa também compra uvas de produtores parceiros, num total equivalente a 300 hectares. Desde 1991, é administrada por Carol, que trabalha ao lado da "winemaker" Sandrine Logette-Jardin. A dupla ficou conhecida por imprimir um toque feminino nos champagnes, com sua maior expressão no rótulo Femme. A inovação proposta por Carol começou com a mudança no sistema de cultivo que passou a ser orgânico e já consumiu € 150 milhões. "Sou uma mãe e quero preservar a nossa terra para legar aos meus filhos. Fomos os primeiros a desenvolver uma 'cuvée bio', justamente com a ideia de preservação e transmissão." Hoje, a empresa tem 43% de mulheres em seus quadros e figura entre os 15 principais champagnes. 

Mustafa ressalta que um dos diferenciais competitivos do produto é ser orgânico, característica valorizada pelos consumidores. "A Duval-Leroy é a primeira casa de champagne a obter a certificação ISO 9002 em 1994. Foi premiada também com o IFS, BRC, e ISO 22000. A meta agora é atingir 'HVE standard' em 2015, certificação do ministério da agricultura francês, que significa alto valor ambiental." Mas vamos combinar que essa frente feminina aguerrida torna a Duval-Leroy ainda mais atraente. "Nosso estilo é elegante, mineral e brilhante. Nossos concorrentes trabalham mais a embalagem que o vinho", provoca Carol. "O champagne não é para ser muito intelectualizado. Ele celebra a efervescência da vida. Cria um prazer imediato e memorável", diz. No futebol ou no Réveillon.