Mal deu tempo para comemorar e o mercado de fundos imobiliários já começou a sentir o “efeito perverso” da alta de juros. A elevação mais cedo que o previsto da taxa Selic, para 11,25%, e o consequente ajuste que tomou conta do mercado futuro de juros foram um balde de água fria para o segmento. Passados oito meses consecutivos de valorização, as cotas dos fundos imobiliários apresentaram em outubro a primeira queda.

Conforme dados da Quantum, provedora de informações financeiras, o desempenho médio de todos os fundos listados em bolsa com negociação de cotas, ponderado por valor de mercado, ficou negativo em 0,81% no mês passado. No acumulado do ano, o ganho diminuiu para 4,64%% e, em 12 meses, para 1,96%. O cálculo captura o efeito da variação das cotas no mercado secundário e o pagamento de rendimento aos cotistas.

Quando considerada a distribuição dos dividendos, o retorno médio das carteiras imobiliárias chegou a 0,81% no mês passado e a 8,23% no acumulado do ano até outubro. Em 12 meses, o retorno com dividendos chega a 9,88%.

Ainda que o “dividend yield” de outubro tenha ficado abaixo da variação de 0,94% do CDI, é importante lembrar que esses rendimentos contam com isenção tributária, desde que respeitadas condições como a negociação do fundo em bolsa e um mínimo de 50 cotistas. Dessa forma, na melhor das hipóteses (se descontada a menor alíquota, de 15% de IR), a aplicação no CDI renderia 0,80%, pouco abaixo do rendimento dos fundos imobiliários.

A retomada em outubro do ciclo de alta da Selic, iniciado em abril de 2013, quando os juros básicos subiram de 7,25% para 7,5% ao ano, e suspenso exatamente um ano depois, no nível de 11%, contribui para um mau diagnóstico do mercado imobiliário em 2015.

André Freitas, diretor da CSHG Asset Management na área de fundos imobiliários, destaca que o mercado de juros futuros já teve um movimento de abertura das taxas após a elevação da Selic e a ata do Copom. Que o reflexo do aumento da Selic sobre os fundos imobiliários existe não há dúvida, diz, mas agora é preciso calcular a dimensão do aperto monetário e o potencial impacto sobre a indústria. Desde a elevação da Selic, em 29 de outubro, até sexta-feira (21), o Ifix, índice que mede o desempenho de uma carteira de fundos em bolsa, caiu 3,95%.

“Mais uma vez os fundos imobiliários são muito rápidos na transmissão da política monetária, seja para o bem, quando o governo reduziu os juros, ou para o mal. Então vai haver transferência para a cota”, afirma Freitas.

Com a visão de que apenas o ambiente doméstico justifica um aumento dos juros no momento e de olho no baixo crescimento do país, o diretor da CSHG avalia que, na pior das hipóteses, a Selic vai alcançar os 12% ao ano, considerando um cenário sem ruptura.

Embora afirme que as cotas dos fundos já foram castigadas e talvez até com certo exagero, as perspectivas de Freitas para o próximo ano seguem pressionadas. “Do lado microeconômico, em 2014, o tom foi de aumento de vacância em todos os segmentos. Isso vai se consertar? Não, porque a oferta ainda vai ser maior que a demanda. A vacância crescente vai se aprofundar em 2015 e, em alguns segmentos, talvez sobre para 2016.”

O que sustentava a recuperação dos fundos imobiliários em 2014, segundo o diretor da CSHG, era justamente a expectativa mais positiva em relação aos juros, tese que ruiu ao fim de outubro. Mas, do lado de fundamento, há ainda carteiras entregando retornos atrativos. E baratas em bolsa.

As oportunidades, contudo, agora têm um obstáculo: os ajustes nos preços das cotas devem continuar e, assim, os fundos poderão ficar ainda mais baratos daqui para frente. O investidor precisa ter uma visão mais clara do cenário, dizem especialistas, para avaliar o melhor momento para voltar ao mercado.

E na comparação com a renda fixa, é importante lembrar novamente da diferenciação tributária. Com a Selic no patamar de 12%, por exemplo, num horizonte de dois anos (com IR de 15%), um fundo imobiliário teria que apresentar retorno acima de 10,2% para justificar a atratividade.

A Citi Corretora assinalou, em relatório enviado a clientes neste mês, que as cotas das carteiras imobiliárias continuam negociando com desconto médio de 22% em relação ao valor patrimonial, o que lhe parece um bom ponto de entrada para investidores focados em valor e com uma visão de longo prazo. Ao mesmo tempo, a corretora ressaltou que o cenário desafiador continua sugerindo uma abordagem cautelosa.

“Acreditamos que a recuperação dessa classe de ativos depende da superação de alguns desafios, tais quais a desaceleração da inflação e a subsequente redução dos juros, além da absorção da oferta nova em algumas regiões, sobretudo na cidade de São Paulo. Recomendamos uma carteira bem diversificada, com imóveis de qualidade, boa localização, já concluídos, baixa taxa de vacância e cronograma de vencimento dos contratos dissolvido”, afirmam os analistas Cauê Pinheiro, Larissa Nappo e Yuri Medeiros.

Especializado no mercado de fundos imobiliários, o agente autônomo de investimentos Arthur Vieira de Moraes observa que, com a alta da Selic, há um aumento do custo de oportunidade, com mais opções disponíveis para se aplicar o dinheiro com menor risco. Em sua visão, dentro do mercado imobiliário, os fundos de recebíveis – que investem em ativos imobiliários financeiros, como Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs) e Letras de Crédito Imobiliário (LCIs) – tendem a ser menos afetados pela alta dos juros, com a possibilidade de ter uma gestão mais ativa.

As circunstâncias mais desafiadoras no cenário macroeconômico impõem ainda aos administradores de fundos novas condições para defender os retornos dos ativos. O consultor de investimentos Sérgio Belleza Filho assinala que a grande preocupação agora é manter os inquilinos, lembrando que esse é um mercado no qual predominam carteiras voltadas à renda, com imóveis corporativos.

“Depois de três anos, qualquer um dos lados [locatário ou locador] pode pedir uma revisional do contrato. Na época de alta do mercado, muito administrador fez isso e até abusou. Agora é uma preocupação, ele tem que tratar bem o inquilino”, diz Belleza.

Moraes também recomenda ficar atento ao calendário de reajustes e vencimentos de contratos, em um momento mais favorável ao locatário que ao locador. “É obrigação do investidor ler pelo menos uma vez por mês o relatório de seus fundos”, ressalta.

O sócio da gestora de patrimônio Taler, Richard Ziliotto, ressalta que o mercado de fundos imobiliários ainda é novo e não tem uma precificação de cotas “crível”. “Boa parte dos investidores opta por uma alternativa de renda, mas não sabe avaliar os ativos que estão nos fundos, se estão bem negociados em termos de contrato, quando vai haver remarcação. Eles olham basicamente o preço da cota e fazem a divisão para saber quanto o fundo vai pagar de dividendo.”

Ainda que não seja um mercado simples de ser analisado, Ziliotto destaca que cabe ao investidor analisar os contratos e entender o que sua carteira abriga. “Não é fácil, mas dinheiro não se acha em árvore”, reforça.

Para Belleza, também é hora de as instituições financeiras analisarem bem o mercado para estudar eventuais medidas para amenizar os efeitos dos juros em alta sobre as receitas das carteiras.

No caso da CSHG, por exemplo, Freitas afirma que, para defender o portfólio, a instituição vendeu cerca de 20 imóveis ao longo do ano que não eram considerados estratégicos para os fundos, aproveitando oportunidades de preços. “É uma estratégia defensiva, que nos garante uma constância”, diz.