Moeda norte-americana encerrou a sessão cotada a R$ 2,702, mas especialista acreditam que calmaria do mercado não se manterá

Veio da Rússia ajuda de que o Brasil precisava para reverter uma tendência de perdas na bolsa e de disparada do dólar, que, após cinco sessões seguidas em alta, finalmente fechou o dia em queda frente o real. A moeda norte-americana caiu 1,23%, cotada a
R$ 2,702 para a venda. Já o índice que mede o comportamento das principais ações negociadas no pregão paulista, o Ibovespa, teve alta de 3,63%, aos 48.713 pontos.
As boas notícias nos mercados locais só foram possíveis porque Moscou intensificou o arsenal de medidas para conter a maxidesvalorização do rublo, que desde o início do ano já perdeu quase 50% de seu valor ante o dólar, refletindo o aprofundamento das tensões geopolíticas da Rússia com a Ucrânia e o colapso nos preços do petróleo, que ajudaram a dar corpo à maior crise cambial pela qual o país já passou desde 1998.
Em meio à derrocada de seu mercado local, a Rússia agiu em duas frentes. Em decisão surpreendente na última segunda-feira, o banco central daquele país decidiu elevar os juros básicos em 6,50 pontos percentuais, de 10,5% para 17% ao ano, numa tentativa de evitar que investidores estrangeiros partissem em retirada do país e levassem consigo bilhões de dólares aplicados em empresas locais, suspendeu, inclusive, as negociações de consumidores pela internet. O aumento dos juros, no entanto, não surtiu o efeito esperado e, na terça-feira, o rublo chegou a cair cerca de 20%.

Ontem veio a segunda ofensiva para tentar conter a crise cambial. Em ação coordenada, o Ministério das Finanças e o banco central daquele país anunciaram sete medidas técnicas para tentar facilitar o acesso das empresas russas a divisas estrangeiras e de proteger os bancos de possíveis perdas contábeis.
As medidas foram bem recebidas pelo mercado, tanto que ,após dois dias de fortes perdas, o rublo inverteu a tendência e fechou em alta de 9,76% sobre o dólar e de 11,86% sobre o euro. Já a bolsa russa reverteu perdas superiores a 10% registradas entre segunda e terça-feira e fechou em alta de 17,47%, ontem.
A euforia com a Rússia repercutiu nos negócios nos principais centros financeiros mundiais. Em Nova York, o índice que acompanha as ações das principais empresas negociadas em Wall Street, o S&P 500, avançou 2%. Já a bolsa de tecnologia Nasdaq, também dos EUA, registrou alta de 0,75%, seguida de perto da bolsa de Tóquio, com valorização de 0,38%. No Brasil, apenas três empresas registraram perdas na bolsa. O efeito-calendário também contribuiu para os bons resultados do pregão no Brasil. Ontem foi o último dia do ano para que investidores exercessem o direito de negociar papéis em operações acertadas previamente. O vencimento de opções elevou o volume financeiro negociado na bolsa para R$ 44,9 bilhões, o maior valor já registrado pela BMF&Bovespa.
A recente calmaria nos mercados, no entanto, não deve durar muito tempo, alertam especialistas em finanças internacionais, que citam como fatores de preocupação para os países emergentes a derrocada dos preços do petróleo e o provável aperto monetário a ser adotado pelos Estados Unidos.
Não por outro motivo, o economista-chefe Austin Rating, Alex Agostini, prega cautela. “A gente comemora aniversário depois de 12 meses, e não de um dia para o outro”, disse, reforçando que o bom humor que prevaleceu ontem são fatores “conjunturais e momentâneos”. Agostini não tem dúvidas de que os tempos ainda serão difíceis para os países emergentes, em função da elevada aversão a risco nos mercados e, principalmente, às fragilidades econômicas dessas economias.

Moratória russa

Além de vender dólares diretamente ao mercado, para tentar estancar a alta da moeda sobre o rublo, o Kremlin decidiu estender de um ano para dois o prazo em que bancos deixarão de contabilizar as perdas dos ativos penalizados pela forte desvalorização cambial. A moratória temporária sobre provisões adicionais para empréstimos a tomadores de crédito com dificuldades foi uma tentativa de evitar que empresas endividadas em dólar sofram com a alta cavalar de juros combinada a uma perda de receitas por conta da queda do rublo.

 

 

Fed: paciência na alta do juro

 

 

A mudança do termo “tempo considerável” para “improvável” no relatório da última reunião do Federal Reserve (Fed — banco central dos Estados Unidos) sobre a possibilidade elevação dos juros dividiu opiniões no mercado. Enquanto para uns, o significado da alteração é de que a elevação dos juros no país está mais próxima, para outros é pouco provável que a alta ocorre nos primeiros meses do ano.
De acordo com o documento, o Fed adotará uma postura “paciente” para decidir quando elevar os juros. Em discurso, a presidente do BC norte-americano, Janet Yellen, afirmou que a mudança no discurso não representa modificação nas intenções da autoridade monetária e que o termo condiz com o atual momento de recuperação da economia. Ela afirmou ainda que é “improvável que as taxas sejam elevadas nas próximas reuniões”. Os encontros estão marcados para janeiro, março, abril e junho.
Embora o quadro de crescimento dos Estados Unidos tenha permanecido sólido, o Fed indicou que adotará uma postura mais lenta em relação ao ritmo da taxa, acenando para o quadro de inflação ainda fraca.
Yellen disse também que a autoridade está confiante que o retorno da inflação para 2% é um fator chave para que ocorram as altas de juros. A líder do Fed destacou ainda que a taxa de desemprego deve cair para o seu “nível normal” de cerca de 5,2% no próximo ano e continuar a recuar em 2016 e 2017. Isso seria uma grande notícia para os trabalhadores, que seguem com salários estagnados. 

 

Brasil à espera de mais turbulências

 

"Achamos que um processo de consolidação entre receitas e despesas certamente vai ajudar o nosso objetivo de trazer inflação para o centro da meta”

 

 

A volatilidade recente nos principais mercados financeiros é consequência de um sentimento dominante de aversão a risco por parte de investidores estrangeiros e da queda abrupta dos preços do petróleo, que afeta, principalmente, países emergentes exportadores do óleo. A avaliação é do presidente do Banco Central (BC), Alexandre Tombini, que assegurou ontem, durante café da manhã com jornalistas, que, mesmo diante de um cenário “desafiador”, o Brasil estará “preparado” para trafegar com “certa tranquilidade” por um período de aprofundamento das tensões mundiais.
Para isso, o país conta com US$ 375 bilhões em reservas internacionais constituídas durante período de maior liquidez nos mercados internacionais. Tombini assegurou que o BC acompanha “diariamente” a reversão desse ciclo de dinheiro farto no mundo, que se dará a partir da esperada alta de juros na economia norte-americana. “Nunca na história econômica recente se teve um período tão longo de expansão monetária, então a reversão disso será algo sem precedentes”, frisou.
Não por outro motivo, Tombini disse ter “muita expectativa” sobre como se dará o processo de normalização da política monetária dos EUA. Segundo ele, seja qual for o caminho adotado pela maior economia do mundo, o Brasil saberá como lidar com a situação. “Mas isso não quer dizer que será tranquilo”, completou.

Nesse cenário, disse o presidente do BC, sofrem mais os países intensivos na produção de petróleo e que, além de tudo, enfrentam problemas internos. “Nós vimos o que se passou com a Rússia nos últimos dias. É uma economia que está muito atrelada ao preço do petróleo.” Ele frisou que, há cinco meses, o preço do barril petróleo era de, em média, US$ 110 e não havia expectativa de queda das cotações. “Cinco ou seis meses depois, estamos com um preço a metade que era em junho deste ano”, disse. “Difícil dizer se esse preço é sustentável. Mas a oferta tende a se ajustar (à demanda mais fraca)”, frisou.
O Brasil tem a ganhar com esse cenário, disse o chefe da autoridade monetária. “Nós ainda somos importadores de petróleo. Uma vez que sustenta os níves
atuais de preço nós teríamos um benefício de US$ 5 bilhões a US$ 10 bilhões no saldo da balança comercial (por ano).” Por fim, Tombini mencionou que a perspectiva de uma política fiscal mais austera: “Achamos que um processo de consolidação entre receitas e despesas vai ajudar o nosso objetivo de trazer inflação para o centro da meta”.