O ministro da Agricultura, Neri Geller (PMDB-MT), que teve dois irmãos presos pela Polícia Federal na Operação Terra Prometida e foi citado por testemunhas como facilitador do esquema ilegal de vendas de terra da reforma agrária, usou a bancada ruralista da Câmara como claque para se defender. Durante audiência na Comissão de Agricultura, na manhã de ontem, Geller chorou, alegou inocência e pediu para não ser "achincalhado".

Os trechos dos depoimentos prestados à Polícia Federal em que o ministro é mencionado já foram encaminhados ao Supremo Tribunal Federal (STF) porque Geller tem prerrogativa de foro. As testemunhas alegam que ele utilizava o cargo para agilizar as negociações ilegais dos lotes de terra comercializados. Odair e Milton Geller, dois irmãos do ministro que continuam presos, são acusados de utilizar laranjas para fraudar a compra dos imóveis rurais. A investigação aponta que os Geller possuem, de maneira irregular, entre 15 e 18 lotes no Assentamento Itanhangá/Tapurah, principal alvo da operação.

Ontem, o ministro, que até então estava em silêncio, falou por 15 minutos. "Posso ser investigado, mas não quero ser achincalhado e não vou ser", afirmou. Emocionado, disse que é um homem honrado. "Eu não sou, nunca fui e, se Deus quiser, nunca vou ser malandro."

Ele afirmou que, se alguém errou, terá que ser punido. "Eu saio na mídia como quadrilheiro, como líder de um grupo organizado e afirmo categoricamente que nunca tive um lote lá. Tenho um irmão mais velho que mora no assentamento. Somos 11 irmãos, pode existir um desvio e, se tiver, é maior (ide idade) e pode ser punido", salientou.

O ministro ressaltou que, desde que assumiu o cargo, vem sendo perseguido politicamente. De acordo com ele, foram feitas quatro denúncias anônimas à PF. "A investigação está acontecendo desde 2009. Eu poderia ter sido investigado pela PF e não fui. Eu assumi em 17 de março. A primeira denúncia anônima foi feita em 29 de abril", destacou.

Ele aproveitou a presença da bancada ruralista para ressaltar o problema fundiário em Mato Grosso. "Tem um erro do Estado que vem desde a década de 1980, que é a regularização fundiária. Faz 20 anos que as pessoas estão lá e não têm o título", justificou.

Doação

O ministro, que recebeu, em 2010, durante campanha para deputado federal, doação eleitoral no valor de R$ 50 mil do empresário Marino José Franz, o braço financeiro da quadrilha, disse que conhece bem o assentamento investigado. "Esse assentamento eu conheço. A minha família foi em 1984 para Mato Grosso; eu primeiro, com 15 anos. Trabalhava para ajudar a sustentar minha família no Rio Grande do Sul. Eu fui para lá por obrigação, porque tinha o sentimento de obrigação para ajudar minha família", afirmou.

Durante o pronunciamento, a bancada ruralista, que prestou solidariedade integral ao ministro, aproveitou a oportunidade para levantar a bandeira da regularização fundiária. Amigo de Geller, o deputado Nilson Leitão (PSDB-MT) jogou a culpa no Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). "O Incra e o governo têm sido covardes. No caso de Itanhangá tem terra com 20 anos sem ser legalizada. São terras ilegais porque o Incra não regulariza. Quem deveria estar preso é funcionário do Incra", concluiu.

Entenda o caso

Fraude bilionária

Desencadeada há uma semana para desarticular uma organização criminosa que movimentou R$ 1 bilhão desde 2010, a Operação Terra Prometida, da Polícia Federal, prendeu 34 pessoas até o momento. Participam do esquema políticos, grandes empresários, servidores públicos e pistoleiros. Foram expedidos 52 mandados de prisão preventiva, 146 mandados de busca e apreensão e 29 medidas proibitivas em 10 municípios de Mato Grosso, além de Santa Catarina, Paraná e Rio Grande do Sul. A investigação comprova que os trabalhadores rurais beneficiados pela reforma agrária foram aliciados, coagidos e ameaçados para venderem ou entregarem os lotes de cerca de 100 hectares, avaliados em R$ 1 milhão cada.

O Ministério Público Federal informou que o foco da investigação são lotes do projeto de assentamento Tapurah/Itanhangá, em Mato Grosso, o segundo maior da América Latina. Possui 115 mil hectares e é dotado de 1.149 lotes. São terras de alta produtividade, localizadas próximo a municípios com grande produção de grãos. Conforme o MPF, a área foi alvo de crimes ambientais, de invasão de terras da União, de associação criminosa armada, de fraude documental nos processos do Incra, de estelionato, de corrupção ativa e passiva e de ameaça.