Após anunciar uma equipe econômica de viés ortodoxo, tendo à frente Joaquim Levy em substituição ao desenvolvimentista Guido Mantega no Ministério da Fazenda, o governo deu um novo passo rumo a uma política mais dura no combate à inflação. Após ter autorizado uma elevação de 0,25 ponto percentual na taxa Selic em outubro, em decisão dividida, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) entrou em consenso ontem por um aperto ainda maior, desta vez de 0,5 ponto percentual. Com isso, os juros básicos da economia foram a 11,75% ao ano - o maior patamar desde agosto de 2011. 

A reunião de ontem foi a última do Copom neste ano. Dessa forma, a presidente Dilma Rousseff, que tentou fazer da redução dos juros uma bandeira de seu governo, encerrará o primeiro mandato com uma taxa básica um ponto percentual acima daquela recebida pelo seu antecessor, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. 

Em uma curta nota divulgada logo após o encontro, o BC fez questão de enfatizar que o combate à inflação não será necessariamente feito com doses cavalares de juros, ao contrário do que previa parte do mercado financeiro. No documento, o órgão chama a atenção para os efeitos "cumulativos e defasados" da alta de juros. E reforça que o "esforço adicional" da política monetária "tende a ser implementado com parcimônia". 

No entender do economista-chefe da Franklin Templeton Investments, Carlos Thadeu Filho, o comunicado deixa claro que o BC não deve intensificar ainda mais a alta de juros, que não se estenderá por muito tempo. "O comunicado quis enfatizar que o país passa por um ciclo de incertezas e que os próximos eventos econômicos dirão se o aperto monetário poderá prejudicar ou não ainda mais o já fraco ritmo de atividade", assinalou. "No fundo, o BC está reconhecendo que o crescimento está muito lento. Por isso, está tratando com mais parcimônia", disse. O tom da nota sugere também que o BC está dando uma chance à política fiscal: se o governo conseguir controlar os gastos públicos, como tem prometido, o aperto dos juros pode ser menor. 

Radicalização 
Parte dos economistas de bancos e corretoras apostava que a Selic, que serve de parâmetros para a concessão de financiamentos, poderia chegar a 13% até dezembro de 2015. Mesmo ontem, uma parte considerável do mercado precificava, em contratos financeiros negociados na bolsa de valores, uma elevação de 0,75 ponto percentual na Selic. Seria uma decisão radical do Copom, tomada pela última vez apenas em junho 2010, quando os juros subiram, de uma vez, de 9,5% ao ano para 10,25%, em decisão surpreendente. 

Significaria um peso ainda maior no custo de tomar empréstimos, e um incentivo a mais para os bancos pesarem a mão sobre os juros ao consumidor, que já estão no maior patamar em três anos (veja arte). Mas, ainda pior para o bolso do consumidor é a escalada da inflação, que tem como efeito a redução do poder de compra dos trabalhadores e o estrangulamento do orçamento doméstico. 

Não por outro motivo, os economistas que defendiam essa radicalização nos juros eram justamente os que viam como preocupante o comportamento da inflação, que está há cinco anos acima do centro da meta, de 4,5% ao ano. Em outubro, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) cravou alta de 6,59% no acumulado em 12 meses. O BC estima que a carestia recuará para "trajetória de conversão à meta" apenas em meados de 2016, período considerado o horizonte relevante da política monetária. 

Pressão do dólar 
O que poderia colocar esse objetivo em xeque, admitem fontes governistas, é a escalada do dólar, que contribui para elevar ainda mais os preços de mercadorias importadas e daquelas produzidas no país com insumos estrangeiros - como eletrodomésticos e automóveis. "O dólar subiu 4% neste mês e 9% no ano, o que subentende uma nova pressão sobre os preços já elevados de diversos produtos da cesta de consumo dos brasileiros", disse o economista-chefe da Sul América Investimentos, Newton Rosa. 

Para evitar surpresas na condução da política monetária, diz o analista, o Copom deve manter o ritmo de aperto nos juros e elevar a Selic em mais 0,5 ponto percentual na próxima reunião, em janeiro. Uma última alta ocorreria em março de 2015, mas, desta vez, num patamar menos intenso, de 0,25 ponto, acredita Rosa. 

José Francisco de Lima Gonçalves, economista-chefe do Banco Fator, aposta que o BC adotará uma postura mais cautelosa. Para ele, após a alta de 0,5 ponto anunciada ontem, o Copom reduzirá o aperto da Selic para 0,25 ponto em janeiro, quando encerrará o ciclo de aumento. 

Gonçalves acredita que essa estratégia surtiria efeito imediato nas expectativas de empresários e investidores, que passariam a ver que o BC está, de fato, mais comprometido com o combate à carestia. 

Ex-economista-chefe da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), Roberto Luis Troster diz que decisão do Copom sinaliza que o BC preferiu agir com mais rigor agora - ainda que isso possa acarretar menor crescimento do PIB - para evitar que a escalada dos preços aborte de vez a possibilidade de recuperação da economia. 

"Se você faz um acerto rápido nos juros, o resultado é mais eficiente", assinalou Troster. Para ele, é como brecar um carro em alta velocidade. "Quanto mais rápido você pisa no freio, menos tempo fica com o pé no pedal", disse.