Título: Tribunal da ONU condena ex-ministra
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Fonte: Correio Braziliense, 25/06/2011, Mundo, p. 21

Pauline Nyiramasuhuko é a primeira mulher sentenciada à perpétua pelo massacre

O Tribunal Penal Internacional para Ruanda (TPIR) condenou ontem pela primeira vez uma mulher à prisão perpétua por genocídio. Pauline Nyiramasuhuko, ex-ministra da Família, foi julgada em Arusha, na Tanzânia, por sua participação no extermínio de quase 1 milhão de ruandeses da minoria étnica tutsi, durante a guerra civil que irrompeu no país em 1994. Pauline, 65 anos, e seu filho, Arsene Shalom Ntahobali, ex-miliciano de 30 anos, pertencem à maioria hutu. Como a mãe, ele foi sentenciado à perpétua pela autoria de agressão e estupro contra milhares de vítimas.

A ex-ministra foi considerada culpada em sete das 11 acusações, entre elas genocídio, conspiração para cometer genocídio, extermínio e violação ¿ todos considerados crime contra a humanidade. Segundo a procuradora Holo Makwaia, sem a participação de Pauline e dos demais acusados, "o genocídio não teria sido possível." A função que ela ocupava no governo foi enumerada como agravante: "Ao invés de proteger as famílias, como estipulava o mandato de seu ministério, ela decidiu exterminá-las".

Com a ex-ministra e o filho foram condenados o ex-prefeito de Butare, Sylvain Nsabimana (a 25 anos de prisão), seu sucessor no cargo, Alphonse Nteziryayo (30 anos), e dois ex-prefeitos da região, Joseph Kanyabashi (35 anos) e Elie Ndayambaje (perpétua). Os advogados de defesa chegaram a tentar apontar contradições nas declarações das testemunhas, na tentativa de obter a absolvição dos réus, mas não obtiveram êxito.

Pauline foi nomeada ministra da Família e da Promoção Feminina em 1992, na época uma das quatro primeiras mulheres a assumir uma pasta ministerial em Ruanda. Seu mandato foi prorrogado duas vezes, inclusive durante o genocídio. Depois da vitória militar da guerrilha tutsi Frente Patriótica Ruandesa (FPR, atualmente no poder), a ex-ministra refugiou-se em Bukavu, na hoje República Democrática do Congo. Desde então, foi acusada por várias organizações internacionais de defesa dos direitos humanos por seu papel no massacre. Em 1997, foi detida no Quênia, e desde 2001 era julgada pelo tribunal instalado especialmente pelas Nações Unidas.

Guerra civil O estopim da guerra civil entre as duas principais etnias que compõem a população de Ruanda ¿ a maioria hutu e a minoria tutsi ¿ foi o assassinato do presidente Juvenal Habyarimana, um hutu, cujo avião foi abatido quando se aproximava do aeroporto da capital, Kigali, em 6 de abril de 1994. Setores radicais da etnia majoritária, que dominava o governo, responsabilizaram os tutsis pelo atentado, desencadeando uma onda de violência conduzida por milícias diante da passividade do Exército. Emissoras de rádio foram utilizadas para convocar a população hutu a matar os rivais, e em pouco mais de três meses o país mergulhou no massacre, retratado no filme Hotel Ruanda.

De acordo com estimativas da ONU, o banho de sangue deixou no mínimo 800 mil civis mortos, incluindo hutus moderados. Centenas de milhares buscaram refúgio em países vizinhos. A rivalidade interétnica é herança da colonização belga, que manipulou os conflitos de maneira a preservar sua influência no país mesmo depois da independência.