Em troca da remuneração futura de R$ 26,7 mil, os ministros indicados para a Fazenda e para o Planejamento, Joaquim Levy e Nelson Barbosa, deixaram salários vultosos nas instituições em que atuaram antes. Levy abriu mão de um vencimento de cerca de R$ 100 mil mensais como diretor de um braço de investimentos do banco Bradesco. E Barbosa, de uma somatória de salários das várias funções que exerce no Rio e em Brasília. 

O novo ministro da Planejamento é professor da Escola de Economia e pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV), e da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), além de acumular as funções de membro dos conselhos de administração do Banco Regional de Brasília (BRB) e da Central de Custódia e de Liquidação Financeira de Títulos (Cetip). Os valores pagos em cada um dos cargos não foi liberado. 

Até que seja votada no Congresso Nacional a alteração no Orçamento que modifica a meta de superavit primário, contudo, ambos devem trabalhar sem remuneração. "Eles não estão recebendo nenhuma ajuda de custo. A escolha já foi feita, eles vão colocar no currículo o título de ministro de Estado. E você acha que ele se preocupa em trabalhar alguns dias de graça? Ainda mais no terceiro andar do Planalto, ao lado do gabinete da presidente. Isso demonstra um prestígio imenso. Eles ainda terão tempo de escolher a equipe e conhecer a situação econômica do governo. Melhor cenário impossível", afirmou ao Correio um assessor do Planalto. 

No período de transição até a posse oficial, a nova equipe decide os rumos da próxima política econômica no terceiro andar do Palácio do Planalto, a algumas salas de distância da presidente Dilma Rousseff. O governo, contudo, tem que correr. Segundo a Lei nº10.609/2002, que define a instituição de cargos de transição, Levy e Barbosa só podem continuar nessa condição por 10 dias, ou seja, até a próxima segunda-feira. Em anos de eleição, segundo a lei, o Orçamento deverá prever dotações para sustentar 50 membros de uma equipe de transição. Essa medida não vale, no entanto, em casos de reeleição presidencial. 

Atípico 
Conforme Gil Castello Branco, da ONG Contas Abertas, a duração do período de transição cumprido pelos ministros indicados é atípica. Geralmente, diz ele, logo que é designado, o ministro é nomeado. "Existe uma intenção clara de deixar a gestão anterior responsável pelo entulho que é a aprovação da alteração da LDO. Para os novos ministros, é melhor ficar sem a nomeação no Palácio do Planalto. Eles não querem ser os autores dessa alteração. Essa deve ser a última missão de Mantega e Arno Augustin (atual ministro da Fazenda e secretário do Tesouro Nacional, respectivamente)", diz. 

Castello Branco lembra, contudo, que a prática da equipe de transição não remunerada é bastante comum nos governos estaduais e distritais. "No Governo do Distrito Federal, por exemplo, tem gente trabalhando há um mês de graça. No âmbito federal, isso geralmente ocorre por um período curto", afirma.

 

 

Descrédito com o PIB

 

 

O mercado reduziu pela segunda semana consecutiva a previsão de crescimento da economia brasileira para o ano. As projeções dos analistas consolidadas no boletim Focus, do Banco Central, apontam que o Produto Interno Bruto (PIB) terá a tímida expansão de 0,19%. Mas nem as estimativas de que a geração de riquezas será pífia em 2014 indicam mudanças na Taxa Básica de Juros. As expectativas majoritárias apontam para alta de 0,25% da Selic na reunião do Conselho de Política Monetária (Copom), que começa hoje. Entretanto, um grupo significativo de especialistas espera uma alta de 0,5%. 

Todo esse aperto monetário ocorre porque a inflação não dá trégua. O mercado estima que o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) termine o ano em 6,43% e em 2015 fique em 6,49%, colado no teto da meta, de 6,5%. Na avaliação do presidente da Datamétrica, Alexandre Rands, a necessidade de fazer ajustes de preços administrados, como o da gasolina e o das tarifas de ônibus, além das oscilações cambiais, pressionará a carestia. "Os analistas percebem que o carregamento para o próximo ano manterá o IPCA em alta", detalhou. 

Nas contas do professor do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) José Luis Oreiro, seria necessário uma Selic entre 12,5% e 13% no próximo ano para levar a inflação para meta. Ele ressaltou que a intensidade da alta dos juros dependerá do ajuste fiscal que será conduzido pela nova equipe. 

Para o economista da Tendências Consultoria Silvio Campos Neto, as estimativas do mercado apresentam um cenário de curto prazo. "Caso os ajustes sejam feitos, haverá um sentimento de confiança que pode reverter essa trajetória de baixo crescimento, inflação e juros altos a partir de 2017", comentou.

 

Balança fecha ano no vermelho

 

O Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (Mdic) reviu ontem a estimativa da balança comercial deste ano. "Diante dos números de novembro, o Mdic está revendo o desempenho da balança de superavit para deficit. O ministério está trabalhando agora com deficit na balança comercial em 2014", avaliou o diretor do Departamento de Estatística e Apoio à Exportação da pasta, Roberto Dantas. O país não registra deficit na balança comercial em um ano calendário desde 2000. 

A queda acentuada do preço das commodities da pauta brasileira, o enfraquecimento do comércio bilateral com a Argentina - principal comprador de produtos manufaturados do país -, e o elevado saldo negativo da conta petróleo tiveram forte reflexo na balança comercial de novembro, que fechou com deficit de US$ 2,350 bilhões, o pior resultado para o mês da série histórica, iniciada em 1994, segundo informou o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (Mdic), ontem. 

O resultado foi influenciado por uma queda generalizada das exportações, principalmente de minério de ferro, petróleo, veículos, soja e derivados. Em outubro, o saldo do comércio internacional já havia ficado negativo em US$ 1,177 bilhão. 

No acumulado do ano, o rombo atingiu US$ 4,22 bilhões, também o pior resultado para o período desde 1998, quando registrou deficit comercial de US$ 6,11 bilhões. De janeiro a novembro de 2013, as importações haviam sido maiores que as exportações em US$ 268 milhões. 

No mês passado, as vendas internacionais do país somaram US$ 15,646 bilhões, com queda de 25% pela média diária das operações em relação a novembro de 2013. Pesou no resultado a retração nas vendas das três categorias de produtos: básicos, manufaturados e semimanufaturados. Já as importações ficaram em US$ 17,996 bilhões, com retração de 5,9% pela média diária em relação a novembro de 2013, num desempenho influenciado por queda nas compras ao exterior de bens de consumo, matéria-primas e bens de capital. 

» Exportação 

A queda mais acentuada das vendas brasileiras de itens básicos foi a de minério de ferro, -47,5%, mas também impactaram negativamente o resultado, o petróleo bruto (-12,6%), o farelo de soja (-34,3%) e a soja em grão (-76,6%). Entre os manufaturados, destacam-se as retrações em veículos de carga (-46,8%) e em automóveis de passageiros (-39,8%); e na lista de semimanufaturados com desempenho ruim, estão o ferro fundido (-41%) e o açúcar bruto (-11,9%).