Caso Rosemary: 2 anos sem punições

Dez acusados de vender pareceres em órgãos públicos mantêm empregos no governo Autorização para viagem foi cancelada no sábado pelo relator do mensalão

­SÃO PAULO­ Dois anos depois de ter sido um dos principais alvos da Operação Porto Seguro, deflagrada pela Polícia Federal e pelo Ministério Público Federal, a ex­chefe do escritório da Presidência da República em São Paulo Rosemary Noronha mantém mistério sobre a sua vida profissional. A amiga do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva não revela como tem se sustentado. Sua família inaugurou, no início do ano, uma escola de inglês para crianças em bairro nobre de São José dos Campos (SP), no Vale do Paraíba. Até hoje, não houve punição a nenhum dos 24 citados no escândalo, e dez deles mantêm seus cargos no governo federal, com salários de R$ 3,9 mil a R$ 21,4 mil.

Durante as investigações que levaram à descoberta da quadrilha que vendia pareces em órgãos públicos federais, foi constatado que Rosemary e o ex­diretor da Agência Nacional de Águas (ANA) Paulo Vieira planejavam abrir uma escola de inglês. A Red Ballon, já aberta, está em nome de Meline e Mirelle, as duas filhas de Rosemary, e de seu ex­marido, José Claudio de Noronha, também acusado de participar do esquema.

Meline, que seria a responsável pela escola, se recusou, semana passada, a conversar com O GLOBO. No dia da operação, em novembro de 2012, foi determinado a policiais federais que cumpriram mandado de busca e apreensão no apartamento da outra filha de Rosemary, Mirelle, que buscassem documentos relacionados à escola.

O advogado de Rose, Celso Vilardi, informou que não faria comentários sobre o funcionamento da escola.

— A empresa foi aberta e está devidamente declarada por seus donos. Minha cliente não tem nada a ver com isso

— afirmou o defensor, ao ser questionado sobre a coincidência entre os planos de Rose descobertos durante as investigações da PF e do MPF e a instalação da unidade pelos parentes da exchefe do escritório da Presidência.

Vilardi também não quis revelar se Rosemary, exonerada logo após a operação, exerce alguma atividade profissional.

Rosemary foi a única dos servidores públicos citados na Operação Porto Seguro a receber punição administrativa da Controladoria Geral da União (CGU) até o momento. Em setembro do ano passado, o órgão apontou 11 irregularidades na conduta dela à frente do escritório da Presidência em São Paulo, e, assim, determinou que ela não pode voltar a ocupar cargos públicos.

Outros dez servidores apontados como participantes do esquema, entre eles Paulo Vieira, continuam a manter seus empregos, apesar de exonerados das funções comissionadas que ocupavam na época. Os processos administrativos disciplinares (PADs), que poderiam levar à perda da função pública desses funcionários, ainda estão em andamento. A Controladoria Geral da União (CGU) culpa as ações judiciais apresentadas pelos servidores para brecar as apurações como responsáveis pela demora na conclusão dos procedimentos.

Os processos judiciais também ainda estão em fase de apresentação de provas e defesa. A denúncia criminal contra os acusados, apesar de ter sido apresentada pelo Ministério Público Federal (MPF) menos de um mês depois da deflagração da operação, só foi aceita pela Justiça em fevereiro deste ano. Como há servidores públicos envolvidos, foi permitido que os acusados apresentassem defesa prévia, o que adiou a decisão do juiz. Dos 24 denunciados, 20 foram transformados em réus. A outros quatro, responsabilizados por crimes menores, foi proposta transição penal, que permite a extinção da ação em troca de cumprimento de serviços comunitários.

Rosemary e José Claudio de Noronha, respondem a um processo criminal. Ela é ré por corrupção passiva, tráfico de influência e falsidade ideológica. Ele responde apenas pelo último crime.

Réu nas cinco ações penais e nas duas de improbidade que resultaram da Operação Porto Seguro, Paulo Vieira exerce a função de analista de controle e finanças do Ministério da Fazenda, com salário mensal de R$ 19.437,76. O PAD contra ele já teve a fase de apresentação de provas concluída e também já houve o indiciamento.

TRABALHO NA AGU RENDE R$ 21 MIL

Na Justiça, Vieira responde pelos crimes de corrupção ativa setes vezes, tráfico de influência, falsidade ideológica duas vezes, falsificação de documento de particular e quadrilha. Ele é acusado de ter oferecido favores a Rosemary para ser nomeado para o cargo na ANA. Ao assumir o posto, teria comandado um esquema de venda de pareces em órgãos como a Secretaria de Patrimônio da União (SPU), a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Anataq) e a Advocacia Geral da União (AGU). O advogado de Vieira não foi localizado. Na defesa prévia, o ex­diretor da ANA questionou os procedimentos formais das investigações e pediu a transferência de todo o caso para Brasília, o que foi negado pelo magistrado de São Paulo.

Réu em uma ação penal e outra de improbidade, José Weber Holanda, ex­adjunto do advogado geral da União, Luís Adams, trabalha na escola da AGU, com salário de R$ 21,4 mil.

PRINCIPAIS PERSONAGENS

ROSE NORONHA.

Responde ação criminal na Justiça Federal de São Paulo por corrupção passiva, tráfico de influência e falsidade ideológica. Em setembro do ano passado, a CGU concluiu que ela cometeu 11 irregularidades no período em que ocupou a chefia do escritório da Presidência da República em São Paulo.

PAULO VIEIRA.

O ex­diretor da ANA é réu em cinco ações criminais e em duas por improbidade administrativa em São Paulo e no Distrito Federal. Apontado como chefe da quadrilha que negociava favores em órgãos públicos, é analista de finanças e controle na Secretaria do Tesouro, no Ministério da Fazenda. Seu salário é de R$ 19.437,76.

JOSÉ WEBER HOLANDA.

O ex­adjunto da AGU responde a processo em São Paulo por corrupção passiva e a ação de improbidade administrativa. Trabalha na escola da AGU e ganha R$ 21.424,30. Weber é suspeito de ter recebido dinheiro para ajudar na regularização do uso de ilhas no litoral de São Paulo.

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Após 5 dias em Vinhedo, Dirceu volta para Brasília

 ­BRASÍLIA­ O ex­ministro da Casa Civil José Dirceu, que tinha viajado para São Paulo, já está de volta a Brasília. Condenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no processo do mensalão, ele teve a autorização para viajar suspensa, tendo que retornar a Brasília, onde cumpre prisão domiciliar. A assessoria de imprensa do ex­ministro informou que ele saiu de carro de Vinhedo (SP) ao meio­dia da última segunda­feira e chegou a Brasília no fim da noite.

Dirceu viajou para Vinhedo na última quarta­feira, depois de ter obtido uma autorização da Vara de Execuções de Penas e Medidas Alternativas (Vepema) do DF. Ele alegou motivos profissionais para viajar e poderia ficar em São Paulo até 12 de dezembro. Mas, sábado, o ministro do STF Luís Roberto Barroso, relator do mensalão, suspendeu a autorização, alegando que a viagem não fora formalmente comunicada ao STF, que cuida da execução penal do condenado.

Para evitar aeroportos, o ex-ministro viajou de carro. Ele passou o fim de semana com a namorada e a filha de 4 anos, em sua casa num condomínio de alto padrão em Vinhedo, aguardando a notificação judicial da decisão de Barroso.