A conta dos problemas enfrentados hoje pela Petrobras baterá inevitavelmente no bolso da nação. Seja por meio dos investimentos da estatal que podem ser seriamente prejudicados - o que abalaria de forma importante o Produto Interno Bruto (PIB) - seja por meio da redução de dividendos e pagamentos de impostos da gigante do petróleo ou, hipótese mais remota, pela necessidade de o maior acionista, a União, injetar recursos na empresa.

Sem a publicação do balanço auditado - o que fecha a possibilidade de captações - e em meio a forte crise institucional por conta dos desdobramentos da Operação Lava-Jato, a Petrobras tem hoje nebuloso o caminho pelo qual dará prosseguimento ao seu bilionário plano de investimentos, o que pode ter repercussões dramáticas para a economia brasileira.

Em uma conta difícil de fazer pois inclui não só o plano de negócios previsto pela companhia para os próximos anos, mas o impacto dele sobre variáveis diversas, como serviços ligados aos projetos, pagamento de salários, material de construção, aquisição de máquinas e equipamentos, dentre outros pontos, consultorias ouvidas pelo Valor preveem que uma queda de 10% nos investimentos da Petrobras já a partir de 2015 pode tirar de 0,1 ponto a 0,5 ponto do PIB ao ano. Não é pouca coisa. Basta lembrar que nas projeções colhidas pelo boletim Focus do Banco Central (BC), economistas esperam uma alta de apenas 0,8% para o PIB de 2015, com um cenário menos desolador para 2016, quando a atividade econômica deve crescer 2%.

Embora seja complexo quantificar qual pode ser a dimensão da necessidade de redução do plano de investimentos da Petrobras por causa das denúncias, Adriano Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), avalia que um corte de 10% pode ser considerada uma hipótese conservadora em função do contexto adverso para a empresa no momento.

Além das denúncias de corrupção, a queda da cotação do petróleo nos mercados internacionais também pode atrapalhar os planos da estatal, diz Pires. No plano para 2014-2018, a empresa projetava que o barril do tipo Brent teria preço médio de US$ 105 em 2014 e se manteria em torno de US$ 100 até 2017. A commodity, porém, registrou forte queda ao longo deste ano e vem sendo negociada a US$ 80 no período mais recente.

Outro ponto que a estatal mencionava como premissa para manutenção do nível de investimento era uma taxa de câmbio média de R$ 2,23 em 2014, com valorização para R$ 1,92 no longo prazo. O real, porém, perdeu força em relação ao dólar ao longo do ano e, segundo o boletim Focus, deve registrar cotação média de R$ 2,35 neste ano, mantendo-se entre R$ 2,60 e R$ 2,70 até 2018.

"A empresa tem um orçamento de investimento elevado que já foi contratado, está bastante endividada, enfrenta denúncias de corrupção e, por último, o setor de petróleo está entrando em um ciclo de preços mais baixo", diz Pires. Nesse cenário, "uma queda de 10% pode até ser conservadora".

A importância da Petrobras para a economia como um todo só cresceu. Os investimentos da estatal saltaram de 4,9% para 10% da formação bruta de capital fixo (FBCF, o investido em máquinas e equipamentos e na construção civil) entre 2000 e 2014. Em proporção do PIB, o investimento que equivalia a apenas 0,8% em 2000 hoje alcança o dobro (1,6%). Uma conta simples, portanto, sugere que uma redução de 10% dos investimentos da Petrobras tenderia a afetar negativamente o crescimento do PIB brasileiro em cerca de 0,16 ponto percentual.

Ao incluir nessa conta os impactos diretos e indiretos da evolução dos investimentos da companhia, a LCA Consultores estima um efeito total negativo (em caso de queda de 10% dos investimentos) de cerca de 0,5 ponto sobre a expansão do PIB. "O impacto pode ser maior ou menor a depender dos desdobramentos dessa história da Lava-Jato", diz o economista-chefe da LCA, Bráulio Borges.

Para a Tendências Consultoria, o impacto negativo seria um pouco menor. Segundo Alessandra Ribeiro, a queda de 10% dos investimentos reduziria o efeito positivo que a companhia tem sobre a economia em 0,1 ponto. Para chegar a esse número, a economista considerou os US$ 220 bilhões previstos no plano de negócios da companhia entre 2014 e 2018 convertidos ao câmbio de ontem (R$ 2,59).

Além disso, Alessandra considerou que cada R$ 1 em investimentos da Petrobras geraria um incremento de R$ 1,9 no PIB. Com base nesses parâmetros, a estatal adicionaria 0,75 ponto percentual ao ano ao PIB de 2014 a 2018, caso conseguisse concretizar os investimentos previstos. Se houvesse um corte de 10% no orçamento de investimento da companhia, porém, esse efeito positivo seria reduzido para 0,65 ponto, uma queda, portanto, de 0,1 ponto do PIB.

No início da semana, a presidente da empresa, Maria das Graças Foster, afirmou que as obras que estão em curso vão continuar, independentemente da Lava-Jato. Nas novas obras, a expectativa é que a empresa toque os projetos sem as empresas envolvidas na operação. Mas o clima de insegurança jurídica que ronda a estatal, diz Pires, tende a aumentar o custo de financiamento da empresa, o que pode vir a ser agravado caso o Brasil perca o grau de investimento em 2015.

Para o banco UBS, custos pressionados e espaço limitado para reajuste de combustíveis tornam necessária emissão de dívida de R$ 45 bilhões nos próximos 12 meses, a custos mais elevados, com o crescente temor do mercado frente ao atraso na divulgação dos resultados do terceiro trimestre da empresa. Maurício Canêdo, pesquisador do Ibre-FGV, avalia que um dos desdobramentos prováveis da Operação Lava-Jato é o encarecimento do custo de capital para a empresa, além de maior dificuldade de acesso a fontes internacionais de financiamento.

"Recentemente, a empresa teve nota de crédito rebaixada, está envolvida em escândalos de corrupção, então provavelmente terá mais dificuldades de captar no mercado depois disso", diz Canêdo. Até janeiro, quando a empresa deve publicar o balanço auditado do terceiro trimestre, a Petrobras não pode emitir ações ou dívida nos Estados Unidos. O diretor financeiro da empresa, Almir Barbassa, disse que a empresa tem caixa suficiente para operar neste período.

Canêdo avalia que os riscos de falta de caixa para a empresa no curto prazo são de fato pequenos, mas avalia que a possibilidade de redução de investimentos no longo prazo pode comprometer a capacidade da estatal de elevar a produção de petróleo, após anos de estagnação.