A inflação brasileira aponta sinais consistentes de persistência e uma parcela importante dela está associada à dinâmica do mercado de trabalho, que acumulou ganhos reais expressivos de salários e queda do desemprego, mas sem uma expansão proporcional da produtividade.

Junto com boa parte dos economistas que já prevê alta do desemprego em 2015, estudo realizado pelo economista-chefe da INVX Global Partners, Eduardo Velho, aponta que o reequilíbrio do ciclo econômico pressupõe uma alta de 0,8 ponto a 1 ponto na taxa de desemprego, de forma que o mercado de trabalho deixe de ter características inflacionárias.

A boa notícia é que o ajuste da economia não precisa necessariamente passar com tanta força pelo mercado de trabalho: um governo disposto a recuperar credibilidade afetaria as expectativas inflacionárias, reduzindo a necessidade desse aumento de desemprego para ajustar os preços. Para o economista, os primeiros sinais nesse sentido começaram a ser enviados. "A alta dos juros dá início a esse choque de credibilidade, embora ainda esteja incompleto", afirma Velho. "É uma mudança da política econômica que vai ser reforçada pela nomeação do ministro da Fazenda e pelo ajuste fiscal".

Segundo o economista, os esforços podem reduzir a chamada "taxa de sacrifício" (a diferença entre o desemprego observado e a taxa natural) de até 1 ponto percentual para algo próximo de 0,6 ponto. Com ou sem ajuste, no entanto, Velho avalia que o desemprego estrutural brasileiro não vai voltar ao nível de dois dígitos registrado no inicio dos anos 2000 por mudanças na demografia e no perfil dos jovens, que hoje estão estudando mais.

Segundo o estudo, um dos sinais importantes de que o custo de mão de obra está superando a produtividade - conferindo, portanto, um componente inflacionário ao mercado de trabalho - é a dinâmica da inflação de não comercializáveis. Outro indicador crucial desse componente inflacionário do mercado de trabalho é o hiato entre a chamada taxa natural de desemprego (ou Nairu, a taxa de desemprego que não acelera a inflação) e a taxa de desemprego efetiva.

Estudo do Banco Central apontava uma taxa natural de emprego de 6,3% no final de 2012. O autor reestimou essa taxa e calcula que ela esteja hoje em 5,7%. Ainda assim, ela permanece mais baixa do que a taxa efetiva apontada pela Pesquisa Mensal de Emprego (PME) do IBGE (de 4,9% em setembro), o que significa que o hiato do desemprego segue positivo e, na margem, inflacionário. É dessa diferença, considerando constantes outros fatores condicionantes do processo inflacionário, que o estudo indica que apenas uma elevação do desemprego de 0,8 a 1 ponto percentual abriria espaço para um ciclo desinflacionário.

Outro fator importante para explicar esse componente inflacionário do mercado de trabalho seria a inflação de bens não comercializáveis. Embora entre 1999 e 2002, a taxa de câmbio tenha sido o fator preponderante para explicar a inflação, a partir de 2003 essa dinâmica muda. A inflação dos bens não comercializáveis medida pelo IPCA acelerou de uma média de 0,38% ao mês entre 1999 e 2002 para 0,57% ao mês entre 2003 e 2014. Entre 2011 e 2014, essa média dispara ao atingir 0,66% ao mês, ou 8,2% em termos anualizados.

Para Velho, o Brasil perdeu capacidade de investimento, com redução de seu produto potencial. A taxa de desemprego atual seria compatível com crescimento de 4% do PIB, outro nível de produtividade, investimento e poupança. "A ideia não é que o mercado de trabalho vai gerar inflação. Mas a redução da taxa de investimento, a queda do PIB potencial e a política econômica em curso geraram um componente inflacionário no mercado de trabalho, o que significa que esse ajuste da economia talvez passe pelo mercado de trabalho", diz

Para Velho, a alta esperada do desemprego é algo "endógeno". "Um processo que já está acontecendo, embutido no ciclo econômico", diz. Mas como ocorreu no segundo mandato de FHC e no primeiro mandato de Lula, novas medidas econômicas podem reduzir a curva de expectativas inflacionárias, reduzindo também a taxa de sacrifício em termos de crescimento e desemprego. "O desemprego é um processo que já está ocorrendo, mas se a Dilma deixar a teimosia de lado, pode fazer com que esse ajuste seja menor. "