O relatório parcial da Comissão da Verdade do Estado de São Paulo, divulgado ontem, recomenda a desmilitarização das polícias no país e a revisão da Lei de Anistia para que torturadores possam ser punidos. O documento pede ainda a responsabilização penal e a perda do cargo de todos os agentes públicos que participaram de violações dos direitos humanos, por ação ou omissão, durante a ditadura militar.

O presidente da comissão, deputado Adriano Diogo (PT-SP), acredita que a desmilitarização é importante porque as polícias militares dos estados trabalham sob influência das diretrizes das Forças Armadas. Como exemplo, cita a existência de um serviço reservado, conhecido como P2, usado como uma forma de vigiar movimentos sociais, sindicatos e até a própria Comissão da Verdade.

- Em algumas audiências públicas da nossa comissão, que eram todas transmitidas pela internet, oito policiais se revezavam para nos monitorar, até em outros municípios. A gente até brincava que esses P2s iriam na festa de aniversários dos nossos filhos e netos - disse o deputado - Isso é um absurdo, ter uma polícia militarizada é um absurdo. Em nenhum lugar do mundo se tem duas polícias, esse assunto precisa ser discutido, não dá para ficar escondido dentro do armário.

A comissão paulista recomenda ainda a extinção da Justiça Militar e o fim dos autos de resistência seguida de morte, nome jurídico dado a casos em que suspeitos são mortos por policiais por, supostamente, terem reagido. Movimentos de direitos humanos costumam denunciar que policiais se usam desse artifício para justificar assassinatos em que não houve resistência.

- Realizamos um esforço de memória e verdade, mas ainda falta realizar a Justiça. Isso terá grande impacto sobre a realidade brasileira. A impunidade de ontem continua gerando resultados hoje. Ainda ocorrem desaparecimentos forçados, principalmente nas periferias - disse um dos pesquisadores da comissão, Pádua Fernandes, durante a leitura do relatório.

O deputado Adriano Diogo compara os desaparecimentos de jovens na periferia, como o de Amarildo, ao sumiço de presos políticos durante a ditadura. Segundo ele, não é só o comportamento da Polícia Militar que lembra o período ditatorial.

- Veja os casos das chacinas que não são resolvidos. No ano passado, tivemos uma grande letalidade, depois de ataques de uma facção criminosa a policiais, e poucos ou nenhum desses casos foram resolvidos. Esse é um modus operandi parecido com o do IML durante a ditadura, que, a mando da repressão, não identificava os corpos, o que atrapalhava a investigação.