O Brasil pode ganhar ainda mais partidos nas eleições dos próximos anos para se somar aos 32 já existentes no país. São 41 novas siglas já fundadas, cujos estatutos foram publicados no Diário Oficial da União e que, segundo levantamento do GLOBO, estão na fase de recolhimento e validação de assinaturas nos estados, etapa que antecede a obtenção do registro no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Duas legendas aparecem na listagem dos Tribunais Regionais Eleitorais (TREs), mas já estão à espera do julgamento no TSE: o Partido Novo (Novo) e o Partido da Mulher Brasileira (PMB), que, embora tenha esse nome, aceita filiados homens.

O conjunto de partidos que se articula nos estados pode ser ainda maior porque, como a disponibilização dos dados não é obrigatória, seis TREs deixam de alimentar a plataforma da Justiça Eleitoral. As novas siglas são das mais variadas matizes e representam diferentes grupos - há o Partido dos Estudantes (PE), o Partido dos Pensionistas, Aposentados e Idosos do Brasil (Pai do Brasil), o Partido Carismático Social (PCS), o Movimento em Defesa do Consumidor (MDC) e a Aliança Renovadora Nacional (Nova Arena), de direita, como a da ditadura militar.

A lista conta com o Partido Liberal (PL), que existiu até 2006, quando se fundiu com o Prona de Enéas Carneiro e deu origem ao PR. Nos bastidores, atribui-se a articulação do novo partido ao ex-prefeito de São Paulo Gilberto Kassab, fundador do PSD.

- O crescimento do individualismo e um certo descrédito do projeto coletivo podem explicar o número de partidos em criação. Essa onda de fragmentação não é só aqui. Existe na França, na Itália, na Argentina, etc. - explica o cientista político Cláudio Gurgel, professor da UFF.

A Argentina tem 34 partidos, enquanto a França possui 33, dos quais 21 têm representação na Assembleia Nacional. Mas há países com menos legendas, como o Chile, que conta com 13.

Siglas receberam R$ 334 milhões

Se conseguirem o registro no TSE, as novas legendas terão direito à verba para se manterem, uma vez que 5% do Fundo Partidário são divididos igualmente entre todos os partidos com estatutos registrados no tribunal. Os outros 95% são distribuídos às siglas na proporção dos votos obtidos na última eleição para a Câmara dos Deputados. Até novembro deste ano, R$ 334,3 milhões haviam sido rachados entre os partidos. Última legenda a obter registro no TSE, o Solidariedade recebeu, de janeiro até novembro deste ano, R$ 7,7 milhões. O Partido da Pátria Livre, aprovado no TSE em 2011, obteve nesse mesmo período quase R$ 607 mil.

- Considero uma hipótese provável que partidos possam ser criados para benefício financeiro. Seria leviano dizer que é o caso de todos, mas, assim como criaram igrejas para ganhar dinheiro, mal comparando, criam-se partidos para fazer tráfico financeiro - afirma Gurgel, para quem a solução não está na cláusula de barreira, mas nas mãos do eleitor, que só deveria assinar a criação de uma sigla se realmente se identificasse com ela.

A cláusula de barreira, assunto que ressurgiu com a discussão sobre reforma política, restringe o funcionamento parlamentar do partido que não alcançar 5% do total de votos para a Câmara dos Deputados. Eles perderiam o fundo partidário e ficariam com tempo restrito de propaganda eleitoral em rede nacional de rádio e de TV. O mecanismo foi aprovado pelo Congresso em 1995 e valeria nas eleições de 2006, mas foi considerado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF) porque prejudicaria os pequenos partidos.

Após a decisão do Supremo, a presidente Dilma Rousseff sancionou, em 2013, uma lei que inibe a criação de novos partidos. Com ela, o fundo partidário e o tempo de TV só estarão disponíveis às novas agremiações depois que elas participarem da primeira eleição.

São tantas as agremiações na tentativa de obter o registro, mesmo depois da lei sancionada, que existe até sigla repetida em meio a essa sopa de letrinhas. O Partido da Educação e Cidadania e o Partido Ecológico Cristão, por exemplo, querem a abreviação PEC. Tem briga até pelo número com o qual a sigla vai pedir voto.

Sete dos partidos do levantamento do GLOBO já pediram registro ao TSE, mas não tiveram êxito - boa parte por ausência do número mínimo de assinaturas, caso da Rede Sustentabilidade, da ex-senadora Marina Silva. Eles estão refazendo os procedimentos para tentar de novo o registro nacional.

A Rede e o Partido da Transformação Social (PTS) estão mobilizados em mais estados: 12. Apenas cinco agremiações têm assinaturas em ao menos nove unidades da federação, como determina a regra para a criação de legenda. O número pode ser maior, por conta dos seis TREs que não atualizam os dados.

O fato é que, com mais partidos, os pleitos terão cada vez mais candidatos, principalmente nas eleições proporcionais. Quanto mais postulantes, mais registros e processos a Justiça Eleitoral deverá analisar sem que mude os prazos.

 

 

Novas siglas dizem não se sentir representadas

 

Em seus sites, alguns partidos que se mobilizam nos estados para, depois, pedirem o registro no TSE alegam que não se sentem representados por nenhuma das 32 siglas existentes no país e que, por isso, a criação deles é justificada.

Esse é o caso do Partido Novo, fundado em 2011 e cujo registro está prestes a entrar em julgamento no TSE. Entre as bandeiras da nova agremiação está a desestatização das empresas públicas. Para seus simpatizantes, o Estado deve atuar apenas em áreas fundamentais, como Saúde, Educação e Segurança. Como, na concepção dos criadores da legenda, nenhum partido atual prega essa bandeira e nem atrairia novas lideranças, a via foi criar o Novo.

O presidente da legenda é João Dionísio Amoedo, membro do Conselho de Administração do Itaú-BBA e da João Fortes Engenharia. Para ele, o problema não é a quantidade de partidos, mas o uso de verba pública para mantê-los:

— Não deveria ter fundo partidário e nem horário gratuito. Vamos aceitar o fundo porque senão ele será distribuído, mas o usaremos para fazer propaganda pelo fim dele.

O Partido da Mulher Brasileira (PMB) também alega que sua bandeira não é levantada por nenhuma outra legenda.

— O PMB foi criado em 2008 pela necessidade de reafirmar o processo de inserção da mulher na política partidária porque isso nunca foi respeitado — afirma a presidente do PMB, Suêd Haidar.

Suêd contou que tinha um comércio no Rio, mas, há seis anos, só se dedica à criação do partido. Ela diz que os custos com sala e viagens são bancados pelos colaboradores. Perguntada se o país já não tem partidos demais para criar mais um, ela é sucinta:

— Vivemos num país democrático, isso é democracia.

Nesse ambiente democrático, pode voltar a existir a Aliança Renovadora Nacional (Nova Arena), partido que atuou nos tempos da ditadura militar.

— Não apoiamos uma intervenção militar. Estamos em 2014, não funciona dessa forma — afirma o vice-presidente da Nova Arena, Kleyton José.

A articulação para a criação da Nova Arena começou em 2005, após o escândalo do mensalão. Os fundadores convidaram Jair Bolsonaro (PP-RJ) e seus filhos para o Arena e, em breve, querem conversar com o cantor Lobão.

— Somos o único partido de direita, essencialmente conservador e nacionalista — afirma Kleyton.