Movimentações suspeitas originaram Operação Lava-Jato

ALEXANDRE RODRIGUES

 

O Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) já produziu este ano mais de 3 mil relatórios sobre movimentações bancárias com indícios de lavagem de dinheiro no Brasil. O número faz de 2014 um ano recorde para o órgão desde a sua criação, em 1998, subordinado ao Ministério da Fazenda. No ano passado, o Coaf realizou 2.450 relatórios. Em 2012, foram 2.140. Os dados foram apresentados ontem pelo presidente do Coaf, Antonio Gustavo Rodrigues, durante uma palestra no I Seminário Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro, promovido pela Escola de Administração Pública e Negócios, no Rio.

Segundo Rodrigues, os relatórios realizados este ano se referem a operações com "fortes indícios" de crimes financeiros a partir de 73.773 comunicações de operações atípicas feitas por bancos ao Coaf até setembro, envolvendo 47.790 pessoas. As instituições financeiras são obrigadas a informar ao Coaf operações que ultrapassem R$ 100 mil. O órgão recebe, em média, 7 mil comunicações por dia.

Rodrigues confirmou que a origem da Operação Lava-Jato foram movimentações financeiras suspeitas das empresas de fachada do doleiro Alberto Youssef identificadas pelo Coaf, que enviou as informações para Polícia Federal e Ministério Público. Pessoas físicas e jurídicas investigadas nessa operação fizeram movimentações consideradas atípicas no valor de R$ 23,7 bilhões entre 2011 e 2014, segundo relatórios do Coaf revelados pelo GLOBO no mês passado. Só em espécie, o grupo movimentou R$ 906,8 milhões.

Segundo o presidente do Coaf, quando a investigação revelou o relacionamento de Youssef e Paulo Roberto Costa e o esquema de corrupção na Petrobras, analistas do órgão produziram relatórios para sobre a movimentação de novos envolvidos, como executivos da Petrobras. No total, foram produzidos 108 relatórios para a Lava-Jato.

A troca de informações entre o Coaf e as autoridades foi ampliada recentemente por meio de um sistema que inverte o fluxo original de informações, permitindo que investigadores do MP ou da PF também repassem informações ao órgão. Rodrigues explicou que, quando um nome suspeito é apontado ao Coaf, o histórico de movimentações atípicas do personagem é analisado e pode gerar relatórios.

- Acontecem bilhões de transações bancárias. O desafio é encontrar os ilícitos. A função do Coaf não é investigar, é alertar. Só a movimentação atípica não é suficiente. É a investigação que vai revelar se há crime ou não - afirmou ele.

Com a experiência de 11 anos à frente do Coaf, Rodrigues avalia que o sistema bancário ainda é o alvo preferencial dos interessados em ocultar dinheiro de crimes como o de corrupção. No entanto, ressaltou, o aprimoramento de mecanismos de controle no Brasil e a cooperação internacional crescente nessa área estão tornando cada vez mais difícil fazer passar despercebido dinheiro sujo por contas-correntes no Brasil e no exterior, inclusive em países que até pouco tempo eram considerados paraísos fiscais. É o caso do Uruguai e da Suíça, que ajudam o Brasil com informações de sigilo bancário.

- Hoje pegamos coisas que não era possível detectar cinco anos atrás - disse.

Rodrigues rebateu argumentos de juristas que questionam a constitucionalidade do Coaf, alegando que a notificação de autoridades por movimentações suspeitas configuraria quebra de sigilo bancário sem autorização da Justiça.