Título: Deu Brasil na ONU
Autor: Queiroz, Silvio
Fonte: Correio Braziliense, 27/06/2011, Mundo, p. 12

José Graziano, ministro do Fome Zero no governo Lula, vence disputa apertada com europeu e vai comandar a Organização de Alimentação e Agricultura a partir de 2012

Quatro votos de vantagem deram ao Brasil sua vitória mais expressiva no âmbito da Organização das Nações Unidas (ONU): por 92 a 88, o agrônomo José Graziano, ministro do Fome Zero no governo Lula, venceu o ex-chanceler espanhol Miguel Ángel Moratinos na eleição do novo diretor-geral da Organização para Alimentação e Agricultura (FAO). "É o reconhecimento internacional do que o país fez nos últimos anos, com o presidente Lula, e da determinação da presidente Dilma Rousseff em levar adiante essa política, com o Brasil sem Miséria", disse ao Correio o ministro das Relações Exteriores, Antonio Patriota. Em nota oficial, Dilma manifestou "enorme satisfação" pela escolha do candidato brasileiro, cumprimentou o "amigo" Graziano e ressaltou sua "reconhecida contribuição" no combate à fome. "Não sou mais o candidato do Brasil, sou o diretor-geral de todos os países", declarou Graziano em espanhol, visivelmente emocionado, após a divulgação do resultado. Um dos principais técnicos do primeiro mandato de Lula, o agrônomo foi depois foi assessor especial da Presidência. "Com o passar dos anos, aprendi que é preciso caminharmos juntos, obter o consenso, para conquistar os objetivos", acrescentou, depois de agradecer aos países latino-americanos e africanos, à comunidade de língua portuguesa e também aos países europeus e aos desenvolvidos. "O professor Graziano deu um sinal nítido de que vai trabalhar com todos", afirmou o chanceler brasileiro.

O resultado apertado dará ao país, a partir de 1º de janeiro de 2012, o cargo de maior visibilidade já ocupado por um brasileiro na governança mundial. Patriota destacou os méritos do candidato, que desde 2006 era subdiretor da FAO para a América Latina e o Caribe, mas reconheceu que a chave da campanha foi a costura de uma frente com os países em desenvolvimento. "De certa maneira, foi uma disputa entre o norte e o sul", disse o ministro, "embora tenhamos recebido apoio de alguns europeus". Patriota apontou como decisiva a adesão em bloco dos países em desenvolvimento que formam o G-77: em uma reunião realizada entre os dois turnos da votação, dirigentes africanos e latino-americanos arrastaram o bloco para fechar o voto "com o candidato que restava do próprio G-77".

Além de Graziano e Moratinos, apresentaram-se candidatos de Iraque, Irã, Indonésia e Áustria. O brasileiro saiu em vantagem já no primeiro turno, com 77 votos, contra 72 do rival espanhol, em um total de 180 participantes. Sob queixas dos europeus, mas com o aval do consultor jurídico da FAO, a delegação brasileira pediu um recesso de meia hora, durante o qual os três candidatos asiáticos declararam apoio a Graziano. O chanceler brasileiro ressaltou a importância da diplomacia africana realizada nos últimos oito anos pelo Itamaraty, tendo como carro-chefe a cooperação em programas sociais, como o Bolsa Família, sucessor do Fome Zero. "A África era um dos cenários mais importantes de disputa, porque saímos com força na América Latina e no Caribe", analisa Patriota. "Pesou a nossa política de aproximação, com a abertura de embaixadas nossas na África e de países africanos aqui."

Fator Lula

O jornal espanhol El País lamentou a divisão do bloco europeu, que se apresentou também com o candidato austríaco, mas apontou como fator decisivo em favor do candidato brasileiro "o enorme prestígio internacional do ex-presidente Lula". A reportagem cita a intervenção da representante sul-africana em favor do Brasil na reunião do G-77: "Se Graziano falhar, nós pedimos ao Lula para consertar". O chanceler brasileiro comentou a declaração com bom humor: "O ex-presidente contribuiu muito, mas eu lembrei (à ministra sul-africana) que a gente agora tem uma mulher no comando, e a presidente quer levar essa parceria adiante."

"É o reconhecimento internacional do que o país fez nos últimos anos"

Antonio Patriota, ministro das Relações Exteriores