Os controles de capitais usados pelo Brasil nos últimos anos foram eficazes para desvalorizar o câmbio, mas a experiência do país sugere que, para funcionar, eles precisam ser amplos e podem exigir várias rodadas de sintonia fina. Essas são algumas das principais conclusões de um estudo feito por Márcio Garcia, da PUC-Rio, e Marcos Chamon, do Fundo Monetário Internacional (FMI), analisando o recente histórico brasileiro nesse campo.

Do fim de 2009 até o começo de 2012, o Brasil utilizou 13 medidas para controlar o fluxo de entrada de recursos estrangeiros. Hoje, apenas duas continuam em vigor. "As medidas adotadas entre o fim de 2009 e meados de 2011 não se traduziram em mudanças significativas na taxa de câmbio, sugerindo sucesso limitado em mitigar a apreciação do real", dizem Garcia e Chamon. Entre elas, está a cobrança do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) nos fluxos para ações e renda fixa.

No entanto, o câmbio se depreciou com força depois da taxação, em julho de 2011, de operações com derivativos. As últimas medidas apontam uma desvalorização de 10% ou mais se as mudanças forem tratadas como permanentes. Segundo eles, é um efeito muito maior do que normalmente se encontra nos estudos sobre controle de capitais. Para Garcia, é difícil imaginar que as últimas medidas teriam sido tão efetivas se fossem tomadas isoladamente. Ele vê um efeito complementar em relação às primeiras, fechando brechas que permaneciam abertas.

Em entrevista ao Valor, o professor da PUC-Rio observou que o comportamento do câmbio também pode ter sido influenciado pelo ciclo de queda da Selic. No fim de agosto de 2011, o Banco Central (BC) cortou inesperadamente a taxa de 12,5% para 12% ao ano, invertendo o rumo dos juros, que estavam em trajetória de alta. A Selic foi reduzida até atingir 7,25% em outubro de 2012. Com juros menores, o país se torna menos atraente para o capital externo.

Garcia diz que os controles de capitais parecem ter trazido alguns benefícios do ponto de vista prudencial, ao ajudar a moderar o crescimento de empréstimos e financiamentos, por exemplo. No entanto, ao mesmo tempo em que essas medidas de controle de capitais eram adotadas, os bancos públicos continuavam a emprestar com força, diz Garcia. Isso mostra falta de coerência entre as políticas, segundo ele.

Outro benefício é que os fluxos externos para a dívida brasileira passaram a buscar instrumentos com vencimentos mais longos, embora seja difícil avaliar se isso se manteria numa crise, de acordo com o estudo. As medidas no Brasil foram usadas num cenário de grandes entradas de capitais nos mercados emergentes, no período que se seguiu à crise de 2008, caracterizado por juros muito baixos nos países desenvolvidos.

Garcia nota ainda que a política fiscal permaneceu expansionista durante quase todo o tempo em que os controles foram adotados, assim como a política parafiscal - uma referência aos empréstimos subsidiados por parte dos bancos públicos. "Os controles agiram como um substituto para essas políticas, enquanto deveriam ter sido um complemento temporário."

Vale a pena utilizá-los? "Eu só usaria se tivesse certeza de que as outras políticas estivessem corretas e precisasse dos controles de capitais por um período pequeno, algo como meses", diz Garcia. "Normalmente você advogaria os controles se todas as outras políticas estivessem ajudando a promover mais competitividade." A condução nada austera das contas públicas, com exceção de uma parte de 2011, e o expansionismo do crédito por parte dos bancos públicos jogam na direção oposta. 

O estudo observa ainda que, dada a baixa poupança doméstica, restringir o acesso ao financiamento estrangeiro pode ter contribuído para o baixo investimento e o desempenho do crescimento no período. Garcia diz que seria melhor investir com poupança interna, mas a questão é que o país não poupa o suficiente, sendo necessário contar com a externa. No segundo trimestre deste ano, o país poupou o equivalente a apenas 14,1% do Produto Interno Bruto (PIB). Para comparar, em 2013 a taxa de poupança do Chile foi de 24% do PIB; a da Índia, de 26% do PIB, e, a da Coreia do Sul, de 34% do PIB. Garcia apresentou o trabalho na sexta-feira, em Washington, num seminário no FMI.