Na ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), divulgada ontem, o Banco Central dá sinais de que já trabalha em sintonia com a futura equipe econômica, mesmo antes da posse. Os diretores revisaram todo o cenário para o ano que vem e indicaram que a política de contenção dos gastos públicos pode ser favorável ao combate à inflação.

Além disso, previram que a mudança na política fiscal fortalecerá os investimentos. A ata projeta ainda que os subsídios ao crédito devem diminuir, em linha com o discursos dos futuros ministro Joaquim Levy (Fazenda) e Nelson Barbosa (Planejamento) e isso também ajudará a segurar os preços.

"No horizonte relevante para a política monetária, o balanço do setor público tende a se deslocar para a zona de neutralidade (...) não se pode descartar migração para a zona de contenção fiscal", afirma a ata. O texto acrescenta que isso "contribuirá" para o aumento da credibilidade, redução do custo financeiro no país e "estimulará" o investimento privado. Nos documentos anteriores, esses verbos estavam na condicional.

Crescimento adiado

Os membros do Copom reconhecem, entretanto, que as medidas de controle fiscal serão um freio para a economia, que só voltará a crescer no segundo semestre de 2015. Por todo esse quadro, o texto afirma que os próximos aumentos da taxa básica de juros (Selic) devem ser feitos com "parcimônia". Semana passada, por unanimidade, o Copom elevou os juros em 0,5 ponto percentual, o dobro da alta de outubro. Com isso, os juros subiram de 11,25% ao ano para 11,75% ao ano, o maior patamar desde agosto de 2011. A cautela defendida a partir de agora pode significar um ritmo menor de alta, mesmo com riscos maiores para a inflação por causa do aumento do dólar.

"Considerando os efeitos cumulativos e defasados da política monetária, entre outros fatores, o Comitê avalia que o esforço adicional de política monetária tende a ser implementado com parcimônia", afirma o documento.

A moeda americana mais cara afeta diretamente o preços dos produtos importados. Por isso, o BC admite que a inflação estará mais alta no curto prazo, permanecerá elevada em 2015 e entrará na trajetória de metas em 2016. O cenário previsto na ata foi reforçado, ontem, pelo presidente do Banco Central, Alexandre Tombini.

- Não deveria ser uma surpresa, nos próximos meses, um cenário que contempla inflação acima dos níveis atuais. Mas estou convencido que a inflação iniciará um longo período de declínio, até chegar nos 4,5% ao final de 2016 - afirmou em discurso no evento de confraternização da Federação Brasileira dos Bancos (Febraban), em São Paulo.

No acumulado dos 12 meses encerrados em novembro, o IPCA está em 6,56%, pouco acima do teto da meta, que é de 6,5%. Apesar da pressão no curto prazo, Tombini vê um cenário favorável para que a inflação comece a convergir para o centro da meta já em 2015. Segundo ele, isso será possível, porque o hiato de tempo entre o aumento da taxa básica de juros e seu efeito na economia já terá ocorrido.

- Quero reforçar que o Banco Central fará o que for necessário para viabilizar um cenário de inflação mais benigno no período de 2014 e 2015, horizonte relevante para a política monetária neste momento, cujos benefícios deverão extrapolar esse período de dois anos - afirmou.

Além de usar a arma dos juros para conter a inflação, o BC considera na ata os novos ingredientes que virão com a mudança da equipe econômica, como o corte de gastos prometido pelo futuro ministro da Fazenda, Joaquim Levy.

- A parte fiscal (contenção de gastos públicos) é a maior novidade da ata - destaca o economista do Banco Espírito Santo (BES) Flávio Serrano.

Contenção do crédito

Outra mudança importante no documento é o fim de uma discussão pública entre o BC e a Fazenda. O ponto de discórdia era o crédito subsidiado, principalmente, o do BNDES. Na visão do BC, ter duas taxas de juros no país limita o poder do Copom no combate à inflação, já que, na prática, os diretores têm instrumentos para interferir em pouco mais da metade do crédito no país. Agora, o Banco Central indicou que esses subsídios diminuirão rapidamente com a nova equipe econômica.

- Eles mostraram que acreditam muito nessa nova equipe econômica e nas promessas de ajuste fiscal. Isso terá um impacto importante no controle da inflação. Finalmente uma ata que deu vontade de ler - disse o economista-chefe da corretora Gradual, André Perfeito.

Alexandre Póvoa, sócio da Canepa Asset Management, discorda. Ele considera que o BC ainda erra na comunicação.

- Aumenta o ritmo (de alta de juros) e vem a palavra parcimônia. Não é uma comunicação muito fácil - diz.

Alexandre Tombini também conta com a redução de gastos públicos e do crédito para conter a inflação. Mas apesar baixo crescimento econômico previsto para 2015, o presidente da Febraban, Murilo Portugal, espera que o crédito, no mínimo, repita o comportamento deste ano, quando deve registrar expansão de 11%.

- Esperamos que seja um pouco melhor ou ao menos em linha com o que aconteceu neste ano. O crédito cresce mais que o PIB há 11 anos - afirmou Portugal.