Título: Mínimo é privilégio para as domésticas
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Fonte: Correio Braziliense, 29/06/2011, Economia, p. 9

Pesquisa mostra que, em Salvador, 70% dos empregados do lar ganham menos que o previsto em lei. No Distrito Federal, o índice é de 29,2%

A empregada doméstica Oirta Alves Cavalcante, 45 anos, trabalha oito horas diárias em um apartamento da Asa Sul e ganha acima de um salário mínimo por mês. Com direito a férias e 13º salário, ela conta que já teve outras funções, mas diz que gosta da atual profissão. "Comecei há dois anos e estou adorando. Passei a ganhar R$ 700. Antes, recebia o mínimo", contou. A situação da trabalhadora pode ser considerada uma exceção no país. Em Salvador (BA), por exemplo, o percentual das domésticas que ganham abaixo do teto mínimo de remuneração chega a 70%, enquanto em Brasília é de 29,2%.

Os dados constam de um estudo de pesquisadores da Universidade de Brasília (UnB), em parceria com várias instituições, e mostram que a condição de trabalho doméstico ainda é precária no país. E nem mesmo o Distrito Federal, que ostenta a maior renda per capita do país e é a quarta capital com mais ricos do país, foge à regra. No geral, benefícios são mínimos. Em Brasília, apenas 8% das trabalhadoras recebem o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e 12% têm direito à licença-maternidade. Em Salvador, 4,8% têm a garantia do FGTS e 25% são beneficiadas pelo direito de ficar pelo menos quatro meses em casa depois de darem à luz. Nada a comemorar.

No país, a carteira assinada ¿ e, em consequência, contribuição à Previdência Social ¿ ainda é uma regalia no mercado de trabalho doméstico remunerado. Os profissionais sofrem também com o desrespeito à jornada de trabalho e com a sobrecarga do posto. "Ainda que o quadro não seja dos melhores, é preciso reconhecer que a situação das domésticas ¿ 7 milhões no total ¿ melhorou ao longo dos anos. Entre 2001 e 2009, o tempo trabalhado por semana diminuiu de 63 horas para 58 horas", observou o professor de sociologia da UnB Joaze Bernardino, integrante do estudo. Contraditoriamente, a exploração é ainda maior quando o patrão assina a carteira da doméstica. "Geralmente, quando o vínculo é formal, a empregada trabalha em apenas uma casa e dorme lá. Assim, fica difícil limitar uma jornada", frisou.

Educação Mesmo desvalorizada, a função exige aprendizado técnico. "São necessárias mais ações públicas para reverter esse quadro. As pessoas e o governo têm de aprender a prezar pela profissão", argumentou Bernardino. A doméstica Oirta concorda com o especialista. Ela tem o ensino médio completo e acredita que a educação é primordial para o exercício da profissão. "Às vezes, temos que fazer compras e anotar recados. Para isso, é preciso, no mínimo, ler, escrever e fazer cálculos", apontou.

Os números mais recentes da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostram um aumento no número das domésticas. Em 2002, eram 6,2 milhões de trabalhadores. Sete anos depois, esse exército somava 7,2 milhões ¿ a maioria, 5,2 milhões, na informalidade, sem carteira assinada. Ainda assim, o aumento do nível de escolaridade e a maior oferta de emprego tornam essa mão de obra cada vez mais escassa em cidades como Brasília.

Direitos e acesso à Justiça

Veja a situação das trabalhadoras - (Em %)

Salvador - Brasília » Carteira de trabalho assinada - 69,6 - 48,0 » Férias de 30 dias - 76,2 - 54,2 » Férias com, pelo menos, 1/3 de adicional - 66,6 - 45,8 » 13° salário - 87,0 - 68,0 » Licença às gestantes - 25,0 - 12,0 » Aviso prévio de 30 dias - 27,8 - 35,0 » FGTS (facultativo) - 4,8 - 8,0 » Auxílio-doença - 9,5 - 20,8 » Considera a Justiça do Trabalho confiável? - 70,6 - 60,0

Fonte: UnB em parceria com outras instituições.