Em meio às denúncias de corrupção e superfaturamento de diversas obras da companhia, a presidente da Petrobras, Maria das Graças Foster, admitiu ontem ter pedido "duas ou três vezes" à presidente Dilma Rousseff para sair do comando da estatal. Graça afirmou que permanecerá no cargo enquanto "contar com a confiança" da presidente.

Vestindo uma camisa com o logotipo da Petrobras, azul com uma listra amarela, Graça convidou jornalistas para um café da manhã ao lado dos principais diretores da estatal. Na conversa, que durou quase três horas, Graça falou sobre os impactos dos escândalos, como a não publicação do balanço do terceiro trimestre deste ano, e da tentativa de reverter a enorme crise com a criação da nova diretoria de Governança.

- Eu preciso ser investigada. Nós, diretores e gerentes, precisamos ser investigados. E isso leva tempo. Um, dois, três, quatro meses. Então me perguntam se conversei com a presidenta Dilma sobre minha saída e a dos diretores? A resposta é sim. Quantas vezes? Uma, duas, três vezes. Porque a coisa mais importante para esta diretoria é a Petrobras, muito mais importante do que meu emprego ou qualquer coisa. Hoje, eu estou presidente da Petrobras enquanto eu contar com a confiança da presidenta e ela entender que eu deva ficar - disse Graça.

Balanço motivou pedido de demissão

Segundo ela, seu pedido de demissão foi motivado pela não publicação do balanço financeiro da empresa, que estava originalmente previsto para ser divulgado no dia 14 de novembro e, depois, anunciado para o dia 12 de dezembro, mas postergado novamente devido às investigação da PF. A empresa precisa ter uma sinalização positiva de que a diretoria está em condições, do ponto de vista de suas práticas gerenciais, de assinar o balanço.

Com base nos depoimentos dos envolvidos em corrupção à Justiça Federal, a estatal calcula os valores relativos à propina para fazer uma redução de seu patrimônio líquido no balanço. Assim, Graça destacou que sua intenção de se desligar da empresa é "não travar a autorização da assinatura do balanço da Petrobras".

- A justificativa de discutir a conveniência de estarmos aqui (na companhia) é a motivação do nosso balanço. Essa foi a motivação que me levou a conversar sobre esse assunto com a presidenta Dilma. O retorno da presidenta, eu não vou passar. Ela é que tem que falar. Quanto aos diretores, eu não conseguiria trabalhar sem eles. Temos uma convivência dentro da companhia e compartilhamos as dificuldades e preocupações - afirmou Graça.

Durante o encontro, Graça disse que "está absolutamente confortável para responder às investigações" da Operação Lava-Jato, e que não tem "receio da verdade". Ela alegou que, antes de a operação ser deflagrada, em março deste ano, a atual direção da companhia não tinha informações sobre desvios de recursos nas obras da estatal.

- Com as informações que a gente tinha na época (do projeto), não havia nada além de preços mais altos do que os preços praticados ou projetados no início dos trabalhos. Então, você projeta uma refinaria que vai custar US$ 2,5 bi no papel. Aí depois, no papel, você diz que vai custar US$ 4 bi. E depois, no papel, vai para US$ 12 bi ou US$ 15 bi e, depois, para US$ 18 bi. Aí começam a aparecer as evidências de que havia corrupção, lavagem, transferência de recursos, mas isso no ano de 2014, com as revelações que foram feitas pelo ex-diretor Paulo Roberto - afirmou Graça, que em alguns momentos da entrevista recebeu apoio dos demais diretores, como um aperto de mãos dos diretores José Formigli (Exploração & Produção) e Alcides Santoro (Gás e Energia).

Sobre o futuro da estatal, Graça disse que pediu ao governo federal uma posição urgente sobre a situação das empresas privadas envolvidas na Operação Lava-Jato, como Camargo Corrêa, OAS, Queiroz Galvão, UTC, Engevix, entre outras. Isso porque essas companhias, por estarem envolvidas em denúncias de corrupção, podem ficar proibidas de participar de novas licitações da estatal. Graça teme que, sem uma solução para essa questão, os atrasos nos projetos causem impacto nas metas de crescimento da produção nos próximos anos.

- Uma vez evidenciado práticas de corrupção, de fraude, a gente não pode contratá-las. Essa é que a grande ameaça à curva de produção. É urgente que o governo se posicione para resolver os impactos da Operação Lava-Jato no que se refere às empresas. Porque as grandes empresas, nós precisamos delas. Ou então vamos ter de fazer licitações internacionais a toda hora - afirmou Graça.

Sobre Venina

As denúncias de corrupção ganharam novo capítulo com as declarações de Venina Velosa da Fonseca, ex-gerente executiva da área de Abastecimento da Petrobras, que revelou ao jornal "Valor Econômico" ter enviado e-mails para Graça em 2009, 2011 e 2012 alertando sobre irregularidades em contratos. Graça falou ontem em retaliação da ex-funcionária.

Disse que ficou sabendo pelo atual diretor de Abastecimento, José Carlos Cosenza, que Venina havia afirmado que "iria colocar na imprensa alguns fatos como retaliação por ela ter tido o nome dela na comissão interna de apuração da Rnest (Refinaria Abre e Lima)".

A executiva diz que Venina foi apenas uma das doze pessoas que perderam seus cargos de confiança na estatal por terem participado de projetos envolvidos em casos de corrupção, assunto que está sendo investigado internamente.

Graça alegou que o e-mail recebido em 2009 era referente a contratos na área de comunicação da Diretoria de Abastecimento, comandada pelo então diretor Paulo Roberto Costa, que confessou ter recebido propina.

- Eu recebi o e-mail de 2009. Foi um momento em que ela (Venina) teve uma briga com o Paulo Roberto, eu não sei o porquê. O assunto de 2009 era referente à área de comunicação. Ela trabalhou cinco anos com ele. E ela era da área corporativa, área que era responsável pelas obras. E, quando ela conversou comigo sobre essa questão da área de comunicação, foi a primeira vez que eu soube que ela e o Paulo tinham se desentendido. E eu falei: "Paulo Roberto, a Venina precisa conversar com você. Vocês precisam conversar e vocês estão trabalhando juntos há tantos anos porque vocês não sentam para conversar e não discutem. O e-mail dela é curto e isso é um assunto seu. A área de comunicação é um assunto seu" - lembrou Graça.

Ela classificou o e-mail que recebeu em outubro de 2011 como "cifrado e muito emocionado":

- O fato é que tomei posse em fevereiro (de 2012) e em março e abril a diretoria mudou. E não mudou por conta de um e-mail que recebi cifrado e muito emocionado. A Venina vai ter o momento dela de apresentar essa farta documentação que ela diz que tem, e que acumula, até onde entendi, há muitos anos. E ela só vai ajudar. O que nós mais queremos é passar essa página.

Graça lembrou ainda que em 2011 o e-mail de Venina falava "das questões pessoais e das filhas". A presidente citou ainda expressões presentes na mensagem eletrônica, como esquartejamento de projeto e licitação ineficiente. Expressões que Graça disse não ter entendido. A presidente da Petrobras mencionou o trecho em que Venina disse que "é tarde demais para dar detalhes".

- De novo, eu levei para o Paulo Roberto e falei: "Olha, Paulo Roberto, a Venina se ressente de ineficiência nessas licitações". Ele era diretor e o Gabrielli (José Sérgio) era o presidente. E ela diz: "Parte você conhece". O que eu posso entender de que parte eu conheço? Eu era diretora na época e via o quebra-pau danado que havia em 2011 por conta de Comperj e Rnest, que muda muda muda e discute e vai mudar de novo.

Graça lembrou que, com base em todas as denúncias, a primeira ação tomada foi a contratação pela companhia de dois escritórios de investigação:

- A prioridade absoluta é a diretoria da Petrobras na investigação, principalmente eu, meus diretores, os gerentes executivos e os gerentes responsáveis pela assinatura do balanço. Esses consultores abrem seus armários, olham seus papéis, mexem no computador, levam iPhone e iPad. E isso é muito bom porque é uma investigação independente - disse Graça.