O dólar em alta pressiona a inflação, mas agrada à indústria. Muitas empresas que sofreram com a economia doméstica patinando em 2014 já planejam exportar mais no próximo ano e preveem um incremento de até 20% na receita com as vendas ao exterior, com o dólar na faixa de R$ 2,60. Com produtos mais baratos por causa do real desvalorizado, essas companhias ganham competitividade e começam a mirar novos mercados. Esse movimento pode fazer a balança comercial sair de um déficit estimado pelo Banco Central de US$ 2,5 bilhões este ano, para um superávit de US$ 1,5 bilhão em 2015, preveem economistas.

Bastou o dólar valorizar em outubro, mês das eleições presidenciais, para que os telefones da Metalplan, fabricante de máquinas industriais de São Paulo, começassem a tocar com mais frequência. Eram novos clientes procurando produtos com preços mais competitivos. Foram chamadas de países como Estados Unidos, Espanha, França e Rússia. Dois embarques de maquinário já foram feitos para os novos clientes americanos. O diretor comercial da empresa, Edgard Dutra, prevê que o câmbio favorável ajude a receita da empresa a crescer entre 10% e 20% no ano que vem.

– Em 2013, não tínhamos certeza se o câmbio seria mais favorável. Este ano ficou claro que o dólar se desvalorizaria. Começamos a focar no mercado externo com mais força. Os Estados Unidos, por exemplo, eram nosso principal cliente há uma década, quando o dólar chegou a R$ 3. O real se fortaleceu, perdemos competitividade e clientes americanos. Com o dólar chegando a R$ 2,60, conquistamos dois novos clientes dos EUA – diz Dutra, que aposta também no sucesso da parceria com a Rússia, embora seja uma negociação mais complexa.

Governo deve deixar moeda oscilar, diz analista

As exportações da Metalplan correspondem a 7% das receitas da empresa. Há dez anos, quando os EUA eram um dos principais clientes no exterior, a fatia das exportações correspondia a 15%.

– Com a valorização do real, as vendas ao exterior representavam 3% da receita. No próximo ano, poderá subir para algo entre 10% e 20%, dependendo do comportamento dos mercados. Um câmbio a R$ 2,60 já é interessante. Uma alta para R$ 2,80 seria ainda mais favorável, e o patamar de R$ 2,90 seria o ideal. Mas é preciso haver um equilíbrio, já que temos muitos componentes das máquinas que são importados – diz Dutra.

Na Weg, de fabricação de motores, o Leste Europeu surgiu no radar. O diretor internacional da empresa, Luís Gustavo Iensen, explica que vários países dessa região ainda não estão na União Europeia e se beneficiavam do câmbio favorável em relação ao euro. Era difícil vender por lá. Agora, com a desvalorização do real, a empresa entrou no páreo:

– Estamos entusiasmados com o Leste Europeu. O que ainda nos preocupa é a volatilidade. Precisamos de um pouco mais de previsibilidade em relação ao câmbio para concluir o orçamento de 2015.

Os especialistas acreditam que o dólar vai continuar subindo no próximo ano, mesmo com as intervenções do Banco Central (BC) no mercado, já confirmadas pelo presidente do BC, Alexandre Tombini. Para esses especialistas, a divisa americana deve fechar 2015 mais próxima de R$ 2,90.

– O dólar está num movimento global de alta frente às demais moedas, especialmente de países emergentes. Há a expectativa de que o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) eleve os juros já em 2015, atraindo mais capital para o país, e pressionando com mais força o dólar - diz o economista Bruno Lavieri, da consultoria Tendências.

Além da alta dos juros nos EUA, a Rússia tornou-se um ingrediente a mais na escalada da moeda americana. A crise do rublo contamina as divisas de outros emergentes, como o real brasileiro, já que os investidores se desfazem desses ativos considerados mais arriscados e compram dólares.

Para o sócio da corretora de câmbio NGO, Sidnei Nehme, o governo não vai mais tentar segurar a cotação da moeda americana em 2015, como vinha fazendo até agora através da oferta de contratos de Swaps cambiais (equivalentes a uma venda de dólares no mercado futuro). Para ele, o programa de Swaps servirá para amenizar a volatilidade (altas muito bruscas) da divisa americana, que prejudica os planos das companhias.

– O governo ficou induzindo o dólar a um preço irreal. Agora deve deixar a divisa atingir sua cotação ideal, favorecendo a competitividade da indústria brasileira - diz Nehme, que observa que, além da pressão que vem dos EUA, a queda no preço das Commodities também acaba pressionando a divisa americana por aqui.

Segundo o analista, o desafio do governo, com um dólar mais alto, será manter a inflação domada, usando para isso uma política fiscal mais austera.

A BRF, controladora da Sadia e da Perdigão e maior exportadora global de frango, é uma das companhias brasileiras que se beneficiam com a valorização do dólar, segundo Augusto Ribeiro, diretor financeiro da empresa. Ele diz que o cenário ideal seria que a moeda ficasse "mais estabilizada, oscilando menos", já que isso facilita planejamentos de médio e longo prazos, bem como negociação e formação de preço:

– Volatilidade não é bom para nenhum exportador. Mas, sem dúvida, estamos vendo com bons olhos a cotação do dólar, que nos traz bons resultados.

Ribeiro não fala em números, mas explica que a companhia é beneficiada com a desvalorização do real porque a base dos custos da BRF é concentrada em moeda local, enquanto 50% da receita são gerados em dólares.

– Ajuda no resultado. Seria muito bom se no próximo ano o dólar ficasse perto de R$ 2,60.

Na Romi, que fábrica bens de capital, o diretor financeiro e responsável pelo mercado externo, Luiz Cassiano Rosalen, afirma que o dólar valorizado incentiva a empresa a buscar mais exportações. A receita com as vendas ao exterior cresceu pelo menos 10% desde que a moeda americana começou a subir frente ao real. Mas ele lembra que isso só foi possível porque a empresa começou a fortalecer suas subsidiárias no exterior há dois anos. Ele revela que 30% da receita já vêm do mercado externo:

– Hoje é o mercado externo que faz as vendas crescerem ao ritmo de dois dígitos.