Ministro da Justiça anula decreto de saída forçada de nove chineses torturados, acusados de espionagem

Jailton de Carvalho

Brasília - Cinquenta anos depois da prisão, tortura e expulsão de nove chineses acusados de espionagem e subversão, o governo brasileiro reconheceu formalmente o erro cometido pela ditadura militar. Numa portaria publicada no Diário Oficial de ontem, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, anulou decreto de expulsão dos chineses assinado pelo ex-presidente Castelo Branco em 1965. Entre os inocentados estão Wang Wei Chen, Chu Ching-Tung, Hou Fatseng, Wang Chin, Su Tse-Ping, Chyang Pao-Sheng, Wan Yao-Ting, Ma Yao-Tseng e Sung Kuei Pao.

Na portaria, Cardozo explica que anulou o decreto de Castelo Branco com base em decisão da Comissão Nacional da Verdade. A comissão reconheceu que os nove chineses foram "vítimas de graves violações de direitos humanos durante a ditadura militar iniciada em 1961, tendo sido a expulsão motivada por interesses políticos e econômicos, e não pela prática de qualquer crime por parte das vítimas". Esta é a primeira vez que o governo brasileiro adota uma medida de caráter público sobre o episódio, que teve grande repercussão na primeira fase da ditadura.

Os chineses foram presos em 3 de abril de 1964 como suspeitos de envolvimento em atividade subversiva no país. Eles estariam no país a serviço do governo chinês que, supostamente, fomentaria a revolução no Brasil. No grupo estavam jornalistas e integrantes de uma missão comercial que visitava o país naquele período. Para a Comissão Nacional, eles teriam sido vítimas da Guerra Fria e da campanha anticomunista que se espalhou pelo país depois da derrubada do presidente João Goulart.

"Tornaram-se vítimas da paranoia anticomunista da época, alimentada pelo governador Carlos Lacerda", sustentam os jornalistas Murilo Fiúza de Melo e Ciça Guedes em "O Caso dos Noves Chineses", lançado em agosto deste ano. Pela pesquisa dos dois jornalistas, policiais do Departamento de Ordem Política e Social (DOPS) prenderam os chineses em apartamento no Flamengo e no Catete em 3 de abril de 1964 e logo em seguida iniciaram uma sessões de tortura. A partir dali, foram condenados a 10 anos de prisão por subversão.

Mais de uma ano depois, Castelo Branco expulsou os chineses que, ainda ali, eram apontados como agentes internacionais da subversão comunista. Os dois jornalistas sustentam ainda que os policiais torturadores apreenderam aproximadamente R$ 800 mil com os chineses e que o dinheiro nunca foi devolvido aos donos. Cinco dos nove chineses ainda estariam vivos.