A Justiça Federal bloqueou, ontem, R$ 614,3 milhões de contas de sete empresas acusadas de participação no cartel de trens de São Paulo. No início do mês, a Polícia Federal (PF) já havia indiciado 33 pessoas — entre executivos das multinacionais, lobistas e representantes da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) — por corrupção ativa, corrupção passiva, cartel, crime licitatório, evasão de divisas e lavagem de dinheiro.

De acordo com as investigações, entre 1998 e 2008 — durante gestões do PSDB à frente do governo do estado — um esquema de corrupção foi montado para fraudar licitações do sistema metroferroviário de São Paulo. As irregularidades causaram prejuízo de R$ 834 milhões aos cofres públicos em valores não corrigidos.
A decisão do juiz João Batista Gonçalves, da 6 ª Vara Criminal Federal de São Paulo, atingiu as contas de investimento das subsidiárias brasileiras da Mitsui, Bombardier, CAF, Siemens e Alstom, além da empresa brasileira T"Trans. A decisão também atingiu as reservas do consórcio ADTRANZ — formado pelas empresas Alstom, CAF e ADTranz (extinta), hoje Bombardier. E já foi executada pelo Banco Central, que rastreia os valores na rede bancária
A medida atende um pedido da Polícia Federal, que encaminhou no início de dezembro, junto com o indiciamento, uma requisição solicitando o congelamento de valores das empresas para o ressarcimento dos recursos desviados.

SUPERFATURAMENTO DE 30%

As investigações mostram que as empresas se associaram em cartel para dividir obras de reformas de trens que operam no Metrô e na CPTM. A PF diz que era um jogo de cartas marcadas em que as empresas escolhiam quem ia ganhar a licitação e superfaturavam em até 30% o preço das obras e dos trens.
Pelo acordo, quem vencia a licitação subcontratava as perdedoras. Para o esquema funcionar, as empresas pagavam propina a servidores públicos. Segundo a PF, lobistas intermediavam os pagamentos
Os envolvidos no cartel ainda contavam com a ajuda de funcionários do Metrô e da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM). Para evitar que agentes públicos cancelassem os contratos superfaturados, o ex- diretor da Siemens (uma das que participava do cartel) Everton Rheinheimer, um dos delatores do esquema, afirmou que lobistas atuavam como consultores nos consórcios e eram responsáveis por pagar propina a agentes públicos ligados às estatais.
Entre os indiciados estão o atual presidente da CPTM, Mário Manuel Bandeira, e João Roberto Zaniboni, que integrou os quadros da estatal entre 1999 e 2003, além do consultor Arthur Teixeira, tido como lobista e pagador de propinas. Na semana passada, promotores suíços confirmaram ao Ministério Público estadual de São Paulo que Teixeira movimentou "várias" contas no país europeu nos últimos anos.
O esquema começou a vir à tona em 2008, a partir de investigações realizadas por autoridades suíças e francesas, que levantaram indícios de que a multinacional Alstom (outra que consta do cartel) teria pago propinas para obter contratos com o Metrô de São Paulo.
Em relação à determinação da 6ª Vara da Justiça Federal de SP para bloquear as contas, a Alstom Brasil informou, em nota, que entrará com as medidas cabíveis legais para reverter a situação.

EMPRESAS DIZEM COLABORAR

Através de sua assessoria, a Siemens disse que "proativamente compartilhou com as autoridades os resultados de sua auditoria interna que deram origem às atuais investigações".
Também em nota, a Mitsui confirmou que tem conhecimento sobre a solicitação da Polícia Federal para o bloqueio de bens. Contudo, a companhia disse que não comentará o fato, já que a ação é parte de uma investigação em andamento, sob segredo de justiça.
Já a CAF informou que não comentará o assunto, mas destacou que "está colaborando com as autoridades e espera que as investigação se encerrem os mais rápido possível para que tudo se esclarece à opinião pública".
Até o fechamento desta edição, a assessoria de imprensa da Bombardier não retornou os contatos feitos pelo GLOBO. A reportagem não conseguiu localizar representantes da T"Trans para comentar o bloqueio das contas.