Além das consequências para os investimentos e a dívida da Petrobras, a queda de preços do petróleo no mercado internacional deve tirar da União, Estados e municípios parte da receita adicional que era esperada a partir da elevação de produção de petróleo no Brasil. Isso vai acontecer justo quando a Petrobras, que responde por 91,6% dessas receitas, começa finalmente a elevar os volumes produzidos depois de um período de queda.
Para 2015, as estimativas de aumento da produção da estatal variam entre 7% e 11%, que é um número forte e resultado da entrada em operação de nove plataformas que começaram a ser entregues em 2013. Este ano a produção deve fechar com aumento de aproximadamente 6,5% depois de apresentar queda desde 2011.
Se por um lado o declínio acelerado dos preços no mercado internacional pode ajudar a Petrobras a pagar menos participações governamentais (o que reduz sua despesa), o efeito é adverso para quem recebe. Para se ter uma ideia do impacto, a Petrobras pode chegar a pagar 20% a menos se o petróleo baixar para US$ 80 em 2015.

No ano passado o barril foi comercializado por um preço médio de US$ 108,07 e no segundo semestre deste ano já está em US$ 100,56. O Goldman Sachs baixou sua estimativa de preço em 2015 para US$ 84 o barril, valor mais alto do que o estimado pelo banco norueguês DNB, que na semana passada reduziu sua previsão de preço de US$ 100 para US$ 80 no próximo ano, uma queda abrupta de US$ 20.
O novo cenário externo pode adiar a melhora na arrecadação dos governos, que só permanecerá nos níveis atuais se o real se desvalorizar, com cada dólar passando a valer algo próximo de R$ 2,77 em 2015, segundo cálculo de uma instituição financeira. O efeito também atormenta grandes exportadores de petróleo como a Venezuela, onde o petróleo responde por 56% das receitas previstas no orçamento federal, Nigéria (80%) e Iraque (90%), segundo a consultoria Eurasia, baseada nos EUA.

A pedido do Valor, a Tendências Consultoria estimou o impacto da redução de preço do petróleo para os pagamentos de royalties e participação especial a Estados e municípios no próximo ano. Ao preço de US$ 80 o barril do petróleo, os pagamentos a governos locais em royalties e participação especial somariam R$ 18,95 bilhões, o que significaria redução de 5,9% no valor em moeda nacional na comparação com os R$ 20,13 bilhões projetados para este ano. A US$ 85 o barril, o valor das transferências ficaria praticamente estável, com leve redução de 0,3%. A US$ 90 o barril, haveria elevação de 5,3%, e a US$ 105,92, alta de 21,6%.
O preço do barril a US$ 90 ao fim de 2025 seria um preço baixo em relação aos patamares médios dos últimos anos. Um valor 8,4% menor, por exemplo, que o de US$ 98,21 por barril projetado pela Tendências para o fim deste ano. Mesmo assim haveria, nesse cenário, uma elevação no valor dos royalties a Estados e municípios por conta do câmbio e da produção. As projeções consideram dólar a US$ 2,58 ao fim deste ano e US$ 2,79 ao fim de 2015, diz Felipe Salto, economista da Tendências.
Essa desvalorização aumentaria os valores em reais a serem pagos. Em todas as estimativas levou-se em consideração alta de 7,1% no volume de produção. Para alguns governos locais, a alta na produção é variável importante no médio e longo prazo.

No ano passado a Petrobras pagou sozinha R$ 30,218 bilhões em royalties e Participação Especial (PE), as duas principais participações governamentais que recaem sobre a produção de petróleo e gás no Brasil. Somando-se os valores pagos por outras empresas que operam no país, a soma chegou a R$ 31,8 bilhões pagos a Estados, municípios, Marinha, Ministério da Ciência e Tecnologia e ao Fundo Social.
O cálculo dos royalties e da PE leva em conta volumes de produção e o preço internacional do "brent" convertido para o real com base na taxa de câmbio média. Este ano foram pagos, até setembro, R$ 26,203 bilhões, sendo R$ 13,9 bilhões em royalties e R$ 12,2 bilhões em PE pela produção em 21 campos considerados de alta lucratividade.
O tamanho do impacto nas receitas de Estados, municípios e da União dependerá do preço do petróleo. E como já dito, o aumento de produção e a desvalorização cambial que geraria valores maiores na conversão para a moeda nacional, porém, podem neutralizar essa queda em determinados patamares de preço.

No Estado de São Paulo, a Secretaria de Fazenda calcula que até 2020 a produção total de petróleo no Estado deve aumentar de três a quatro vezes em relação ao quadro atual. Isso deverá elevar em proporção parecida, estima a Fazenda, o recebimento de participações especiais. A curva ascendente de produção estimada pelo governo estadual deve-se à produção nos campos de Baúna e Sapinhoá, este último no polo pré-sal da Bacia de Santos.
Atualmente, as participações de São Paulo na exploração de petróleo representam R$ 650 milhões anuais. No ano passado o Estado arrecadou R$ 172 milhões com os recursos. Este ano já recebeu R$ 371 milhões, segundo levantamento na ANP. O valor previsto para este ano, dizem técnicos da Fazenda, é baixo em termos relativos, mas em termos absolutos é importante. Somente a arrecadação de ICMS orçada pelo Estado para 2015 é de R$ 129 bilhões.

Para o ano que vem, porém, a expectativa é de que haja elevação de 30% a 35% nos royalties e participações de São Paulo. A estimativa foi feita em maio, levando em conta dólar a US$ 2,30 e preço de petróleo a US$ 100 o barril. Até agora, dizem os técnicos da Fazenda, a queda de preço tem sido compensada pela desvalorização cambial. O governo estadual não refez cálculos sobre a expectativa de ganho dos próximos anos em razão do recuo nos preços.
Luiz Faria, chefe de gabinete da prefeitura de Ilhabela, no litoral paulista, conta que a queda de preços do petróleo deve afetar menos os recebimentos do município, ao menos no curto prazo. Os repasses de royalties, diz Faria, já cresceram este ano em razão do aumento de produção em Sapinhoá e do câmbio mais favorável para quem recebe os direitos. Com isso, esses repasses, que variavam de R$ 2 milhões a R$ 3 milhões ao mês, saltaram para R$ 5 milhões a R$ 6 milhões mensais este ano, afirma.

 

Espírito Santo prevê recuo de 10% na receita em 2015

 

A queda de preços do petróleo no mercado internacional chega em má hora para os governadores do Rio de Janeiro e Espírito Santo, Estados com a maior produção atualmente. O Espírito Santo contabiliza redução de 10% na arrecadação projetada para 2015 e, para o governo fluminense, a redução do preço contribui para o quadro de incertezas conjunturais.

Em entrevista ao Valor Econômico, Paulo Hartung (PMDB), governador recém-eleito do Espírito Santo, estimou que a queda do petróleo, pode reduzir em 10% a arrecadação do Estado prevista no atual orçamento de 2015, ressaltando que “tudo vai depender do câmbio”.

Todas as previsões de arrecadação estão sendo revistas, incluindo a de royalties e a PE (Participação Especial). “Estamos trabalhando estimativas de receitas. As que temos não são realistas”, disse. Ele espera ter novos dados em dez dias.

A estimativa de receita do Espírito Santo com essas participações governamentais em 2014 é de R$ 1,6 bilhões. Até setembro, a ANP registra pagamento de R$ 1,2 bilhão. A previsão de orçamento para 2015 enviada para a Assembleia estadual, e que está sendo revista, prevê R$ 1,7 bilhão. No ano passado, o Estado recebeu R$ 1,55 bilhão em royalties e PE. Até setembro, o Espírito Santo, segundo maior produtor de petróleo do país, arrecadou quase R$ 1,22 bilhão, sendo R$ 540 milhões com royalties e R$ 678 milhões com PE.

“Ninguém imaginava o barril de petróleo voltar para o preço que está voltando. O que se lia é que haveria um aumento do consumo mundial enquanto não há grandes descobertas mundo afora”, diz Hartung. “E isso quando a Petrobras vive uma crise de caixa que se arrasta há quatro anos. Ela está muito endividada e com aquele plano de investimentos, em boa parte parado”, afirma.

Hartung enumera quatro projetos da Petrobras parados no Estado. O mais importante era um complexo gás-químico em Linhares que já tem projeto de engenharia pronto sem que a obra, prevista inicialmente para 2017, tenha começado. “Não tem nem um tijolo”, diz. “E isso tem Brasil afora.”

Os outros projetos da estatal em compasso de espera são uma planta de regaseificação de gás natural liquefeito (GNL) em Barra do Riacho e um terminal de suprimentos em Anchieta. segundo Hartung, a Petrobras desistiu desse terminal e vai contratar o serviço de empresas privadas.

Maior produtor do Brasil, o Rio espera fechar 2014 com arrecadação de R$ 8,76 bilhões com royalties e participação especial. Até aqui foram pagos, segundo a ANP, R$ 6,5 bilhões ao Estado. Em 2013, o Rio arrecadou 8,2 bilhões. Na previsão orçamentária para 2015, a estimativa é arrecadar R$ 9 bilhões. O secretário de Fazenda do Estado, Sérgio Ruy Barbosa Guerra Martins, reconhece, no entanto, que a previsão, feita em junho, não contava com a queda do petróleo.

“Como é um fenômeno muito recente, isso não afetou a nossa receita agora, na boca do caixa”, diz. “Mas a previsão foi feita em junho, bem antes dessa desvalorização. O cenário econômico mudou bastante nos últimos três meses”, reconhece o secretário.

Francisco Caldas, secretário de Planejamento e Gestão do Rio, afirma que é difícil fazer previsão sobre a expectativa de arrecadação futura. Nem o preço do barril do petróleo, nem a taxa de câmbio estão estáveis o suficiente para cálculos seguros sobre a arrecadação no momento. Para Caldas, o período eleitoral adicionou “alta incerteza” à economia. “Imagino que até a posse do governador [em janeiro] já se estabilize e se tenha algum cenário econômico”, disse.


Para o deputado da oposição no Legislativo do Rio, Luiz Paulo Corrêa da Rocha (PSDB), a estimativa de receita com royalties e participações é exagerada. O deputado aposta que o Estado deve enfrentar um contingenciamento nos gastos no começo de 2015 pelo cenário que se desenha também com o esfriamento da economia nacional desde junho, quando o planejamento para 2015 foi feito.