No ano em que foi reeleita e enfrentou várias rebeliões nos partidos que apoiam seu governo no Congresso, a presidente Dilma Rousseff viu a disciplina da sua base na Câmara dos Deputados atingir o ponto mais baixo desde a chegada dos petistas ao poder.
Os deputados federais das nove siglas que formam a coalizão governista votaram 66% das vezes de acordo com a orientação da liderança do governo na Câmara neste ano, segundo o banco de dados legislativos mantido pelo Cebrap (Centro Brasileiro de Análise e Planejamento).
Isso significa que a base de Dilma é a mais indisciplinada com a qual um governo contou na Câmara desde a volta das eleições diretas para presidente, em 1989. Em 34% das vezes, os deputados governistas votaram contra o governo.
Ex-presidentes que enfrentaram graves crises políticas tiveram mais apoio parlamentar do que Dilma. Em 1992, quando Fernando Collor (1990-1992) sofreu impeachment, a taxa de fidelidade de sua bancada atingiu 92%. Em 2005, quando o mensalão foi revelado, Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010) teve 79%.
Para o cientista político Carlos Pereira, professor da Fundação Getulio Vargas do Rio, a baixa disciplina da base governista é resultado de erros cometidos por Dilma na gerência de uma coalizão partidária muito grande, e que reúne siglas muito distintas.
"O PT não compartilha poder com parceiros diferentes", afirma. "Cedo ou tarde, eles inflam o preço do apoio." Principal aliado dos petistas, o PMDB tem peso maior na Câmara do que sua participação no ministério de Dilma.
Criticada pela falta de diálogo com o Congresso, a presidente viu a fidelidade de sua base aliada diminuir ano a ano durante o primeiro mandato. A taxa de disciplina alcançou 89% em 2011, quando ela tomou posse, caiu para 76% no ano seguinte, para 74% em 2013 e 66% neste ano.
Em 2014, a presidente teve uma relação conturbada com siglas da base aliada e sofreu derrotas significativas. Dois partidos, o PSB e o PTB, deixaram a coligação governista para apoiar adversários de Dilma na eleição presidencial.
Em outubro, apenas dois dias após sua reeleição, a Câmara derrubou o polêmico decreto que incentivava a criação de conselhos populares, anulado com apoio do PMDB e da bancada oposicionista.
Dilma decidiu usar a reforma de seu ministério para se reaproximar das lideranças no Congresso, ampliando o espaço do PMDB em seu segundo mandato e recrutando políticos com maior influência sobre as suas bancadas.
O PP, que hoje controla o Ministério das Cidades e deve trocá-lo pelo da Integração Nacional no próximo ano, foi o aliado mais infiel no ano passado, votando com o governo apenas 46% das vezes.
A taxa de apoio na bancada do PMDB foi 54%. O partido, que deverá manter o controle sobre a agenda do Congresso no próximo ano, passará a administrar seis ministérios, um a mais do que hoje.
A bancada mais fiel à orientação da liderança governista foi a do PT, o partido de Dilma, que votou com o governo 91% das vezes. O PC do B, que será transferido do Ministério do Esporte para o da Ciência e Tecnologia, votou alinhado com Dilma 86% das vezes.
Mesmo com as mudanças em andamento no ministério, o Palácio do Planalto acredita que sua relação com o PMDB continuará difícil.
Favorito para assumir a Presidência da Câmara em 2015, o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) contrariou interesses do governo várias vezes como líder da bancada, como na votação da medida provisória que mudou regras para exploração dos portos pelo setor privado em 2013.