Em meio ao escândalo da Petrobrás e sob ataque da oposição em razão da flexibilização das metas fiscais do País, a presidente Dilma Rousseff defendeu, em discurso de improviso realizado ontem em Brasília, o respeito ao "resultado das urnas" e às "escolhas legítimas da população brasileira".

 

A afirmação foi feita durante cerimônia de assinatura de convênio com o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, no Palácio do Planalto. A declaração ao lado do tucano explicita dois rumos que vêm sendo tomados pelos líderes do PSDB em relação ao governo federal petista. Alckmin tem adotado um tom conciliador. Já Aécio Neves, derrotado por Dilma na disputa presidencial, faz uma oposição sem tréguas desde que a eleição foi encerrada, em 26 de outubro.

Dida Sampaio/Estadão

Dilma e Alckmin conversam durante solenidade em Brasília

 

 

 

No discurso de ontem, Dilma lembrou que "é fato que durante a campanha é natural divergir, é natural criticar, é natural disputar", assim como "as temperaturas se elevem", mas reiterou que, passada esta fase, é preciso reconhecer "as escolhas legítimas", já que este é um país que "preza a democracia" e que ela está se aprofundando e "ficando cada vez mais madura".

 

Em um outro evento em Brasília, o vice-presidente da República, Michel Temer, fez coro com Dilma. "O sujeito perdeu a eleição, ele acha que tem que destruir aquele que foi eleito", afirmou ele, que passou a defender a "harmonia" entre base e oposição. "Interessante como temos no Brasil o conceito de oposição e situação que é político e não jurídico. O conceito jurídico leva, necessariamente, ao apartamento de dois momentos. O eleitoral, em que litigam, controvertem, disputam, se desentendem. Para, passada a eleição, atingir outro momento, político-administrativo, e todos sem exceção irão em busca do bem comum", comentou.

 

As declarações mais duras partiram do ministro-chefe da Secretaria-Geral, Gilberto Carvalho, que reagiu às acusações de que dinheiro de propina da Petrobrás abasteceu contas do partido entre 2008 e 2012, conforme delação premiada do executivo Augusto Mendonça, do grupo Toyo Setal. O empresário citou repasses registrados na Justiça Eleitoral, inclusive no ano de 2010, quando Dilma disputou sua primeira eleição.

 

O executivo disse que essas contribuições oficiais também faziam parte do esquema de pagamentos de comissões das empreiteiras a fim de obter contratos na estatal de petróleo. Além das doações oficiais, ele afirmou que as propinas também eram pagas em dinheiro vivo e por meio de depósitos em contas no exterior. Em razão disso, parte da oposição passou a dizer que o escândalo estava se aproximando da presidente e a possibilidade de impeachment, crescendo. Isso porque, segundo a oposição, o dinheiro da propina pode ter bancado a eleição de Dilma em 2010.

 

Carvalho afirmou em um evento em Luziânia, em Goiás: "Temos de reagir com muita força. Nós temos uma dignidade, nós governamos esse país há 12 anos, nós estamos mudando as relações econômicas do País. Nós incluímos mais de 40 milhões de brasileiros (retirados da pobreza), não vamos aceitar a pecha de ladrões, de bandidos".

 

O ministro, que está de saída do governo, fez questão de rebater diretamente Aécio, que em entrevista no início da semana chamou o PT de "organização criminosa". "Nós somos aqueles que, pelo contrário, estão combatendo a corrupção. Ou o dinheiro do doutor Aécio Neves na sua campanha brotou do céu? Ou o dinheiro do financiamento de outros partidos veio da onde?", questionou. "Chega desse tipo de acusação absolutamente irresponsável, tentando jogar na vala um partido que tem uma dignidade, um governo que tem a honestidade e a coragem que eles (oposição) não tiveram."

 

Do 'punho de renda' à estratégia selvagem contra o governo

JOÃO DOMINGOS

 

Após a eleição, PSDB foi para o ataque, com ações diferentes das adotadas ao longo dos últimos 12 anos

De origem acadêmica, o PSDB fez ao longo dos 12 anos dos governos Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff uma oposição "punhos de renda" que, segundo parlamentares tucanos, não se traduzia em ações de contenção ao poder do PT. A reeleição da presidente Dilma Rousseff serviu de "rito de passagem" para o partido, que abriu a caixa de ferramentas antes mesmo do início do segundo mandato.

Logo após a eleição, o partido - com o argumento de responder aos questionamentos nas redes sociais sobre a confiabilidade das urnas eletrônicas - pediu à Justiça Eleitoral uma auditoria no resultado das eleições. No momento seguinte, os principais líderes da legenda, como o senador Aécio Neves (MG) - candidato à Presidência derrotado no 2.º turno por Dilma -, iniciaram uma blitz retórica, como chamar o PT de "organização criminosa".

 

Agora, dizem os tucanos, com a votação do projeto que flexibiliza a meta fiscal, é o momento da ação legislativa. "O governo saberá daqui para a frente o que é fazer oposição selvagem", disse ao Estado o líder do PSDB na Câmara, Antonio Imbassahy (BA), ele próprio autor de 12 discursos de ataques ao governo Dilma na sessão de 18 horas que aprovou a flexibilização das metas fiscais - iniciada anteontem e encerrada na madrugada de ontem.

 

O primeiro discurso de Imbassahy foi feito às 10h28, 25 minutos antes de a sessão do Congresso alcançar o quórum mínimo necessário para apreciar dois vetos da presidente e as mudanças na meta fiscal. O último ocorreu às 4h38 minutos de ontem, antes do encerramento da sessão, às 5 horas. Em cada um deles, Imbassahy acusou o governo de envolvimento em corrupção, de ter quebrado o País e de fazer maquiagem para tentar se salvar. Também citou a delação do executivo Augusto Mendonça, do grupo Toyo Setal, que disse que doações eleitorais ao PT eram parte da propina cobrada em contratos da Petrobrás.

 

Na mesma linha "oposição selvagem" dos tucanos, o deputado Domingos Sávio (MG) fez 15 pronunciamentos. Já o líder do PSDB no Senado e parceiro de Aécio na chapa presidencial, Aloysio Nunes Ferreira (SP), fez seis intervenções. Numa delas, evocou o segundo livro de Samuel, na passagem em que o rei Davi é perdoado depois de reconhecer que errou ao seduzir a mulher de Urias. "A presidente errou, mas não reconhece. E erra de novo. Não será perdoada", sentenciou Aloysio Nunes. O senador paulista, ao lado dos deputados Imbassahy e Domingos Sávio, fazem parte da tropa de choque do PSDB que está disposta a não dar sossego ao PT.

 

Mas o próprio Aécio, que é o presidente nacional do partido, também foi para o ataque, durante a longa sessão que tratou da mudança na meta de ajuste fiscal. Disse que Dilma tinha posto o Congresso "de cócoras" ao editar decreto condicionando a liberação de emendas parlamentares à aprovação da proposta do ajuste fiscal. O senador mineiro fez as contas e chegou à conclusão de que cada parlamentar valia R$ 748 mil para o governo.

 

Imbassahy diz que os tucanos estão animados. "É como se a gente estivesse numa partida de futebol, com o estádio cheio. Nosso candidato à Presidência da República teve 51 milhões de votos. Cada vez que nos manifestamos aqui, estamos nos manifestando para 51 milhões de eleitores. Isso dá um ânimo danado para brigar", afirmou o deputado baiano.