Prestes a iniciar um novo mandato em meio à crise provocada pelas investigações de corrupção na Petrobras, a presidente Dilma Rousseff repetiu a fórmula usada por seu antecessor, Luiz Inácio Lula da Silva, para consolidar a maioria no Congresso após o escândalo do mensalão: sacrificou o PT para abrir mais espaço aos aliados em sua equipe. A partir de hoje, o PT terá a menor participação no governo desde que chegou ao poder com Lula, em 2003, tanto em número de ministérios como no volume de recursos para investimentos que seus indicados vão administrar.

Em relação à equipe que tomou posse com Dilma em 2011, os outros partidos governistas avançaram no alto escalão, passando de 12 para 15 indicados. Já o PT perdeu quatro cadeiras em relação a 2011, caindo de 17 para 13 entre 39 pastas. Em 2003, petistas controlavam 18 de 35 ministérios. A ampliação da base parlamentar obrigou o partido a reduzir sua presença no Executivo para 16 no segundo governo Lula, em 2007. Dil-ma voltou a privilegiar o PT elevando a cota do partido para 17 pastas em 2011, mas a partir de hoje terá a companhia de apenas 13 correligionários, de acordo com a lista final do novo gabinete divulgada ontem pelo Palácio do Planalto.

Numa arquitetura desenhada a conta-gotas, uma marca de seu processo de decisão, Dilma destinou ao seu partido a administração de pouco mais de um quarto dos gastos discricionários do Orçamento da União, a fatia que mais interessa aos políticos. São os recursos não obrigatórios, que permitem aos ministros decidir como gastá-los. Já os outros partidos governistas — PMDB, PP, PR, PROS, PSD, PTB, PDT, PRB e PCdoB — ficaram com 56,8% dessas verbas: o equivalente a cerca de R$ 106 bilhões, de acordo com a proposta orçamentária de 2015, que ainda não foi aprovada pelo Congresso.

PT TERÁ MENOS RECURSOS

Dados da plataforma Mosaico Orçamentário, da Diretoria de Análise de Políticas Públicas da Fundação Getulio Vargas (FGV-DAPP), mostram que o PT controlava quase metade dessas verbas no início do mandato de Dilma, em 2011: 43,6%. Os partidos aliados tinham parcela pouco inferior, de 43,3%. Agora, enquanto os aliados ficam com mais da metade, o PT passa a administrar apenas 28% dos recursos livres. Contribui para isso a perda da Educação para o PROS de Cid Gomes, que tem 20,1% dos gastos discricionários do governo.

Essa distribuição retoma o movimento do início do segundo mandato de Lula, quando ele entregou aos indicados de outras legendas ministérios que concentravam 55,7% das verbas discricionárias do governo, deixando ao PT 30,3%. Dilma agora supera essa marca, retrocedendo em relação ao desenho de 2011 — que havia voltado a concentrar recursos para investimentos no PT, inaugurando um mandato de muitas tensões com a base parlamentar.

Mais do que o número de pastas, a distribuição da fatia discricionária do Orçamento administrada pelos ministérios é o que melhor expressa como cada legenda foi contemplada por Dilma na negociação que envolve seu apoio no Congresso. Segundo os dados da DAPP-FGV, o total de gastos da União autorizados em 2014 superou R$ 1,7 trilhão, mas apenas 10% disso são verbas não carimbadas. Isso explica o fato de o Ministério da Previdência Social, o maior orçamento da Esplanada, ter virado um patinho feio. Rejeitado por PMDB e PDT, terminou com o PT.

PMDB SE LIVRA DE "ABACAXI"

Em 2014, a Previdência teve um orçamento total de R$ 402 bilhões, 22,7% de tudo o que o governo tinha para gastar. No entanto, apenas 0,5% era verba não obrigatória. Como pagar pensões não gera dividendos políticos, a pasta foi definida como um "abacaxi" pelo último ministro, Garibaldi Alves (PMDB). Por isso, a troca dela por outras duas cadeiras no primeiro escalão foi vista como um avanço do PMDB. Ainda que tenham orçamentos bem menores, as secretarias de Pesca e de Portos têm mais de 80% de verbas livres para investimentos.

Primeira mulher a assumir a Presidência da República, Dilma inicia seu novo mandato na companhia de mais homens. O número de mulheres na equipe caiu de 9 em 2011 para 6 em 2015. Já o de técnicos subiu, principalmente na área econômica. Joaquim Levy e Nelson Barbosa substituem petistas na Fazenda e no Planejamento. Eram 8 sem indicação partidária em 2011, e agora são 11.

— No Brasil, e em outros países, nem sempre as alianças são respeitadas na composição de um Ministério. A preocupação maior é o relacionamento com o Legislativo, por isso essa distribuição de pastas. No exterior, muitos governos chamam essa divisão de governo de coalização. Dilma fez o mesmo. E não foi diferente com Lula e Fernando Henrique — analisa o cientista político e pesquisador da UFRJ Paulo Baía.