O Banco Central surpreendeu ao antecipar o começo de um novo ciclo de aperto monetário, que estava previsto apenas para 3 de dezembro. A boa recepção do mercado financeiro, que subiu os juros futuros de prazos mais curtos e derrubou os mais longos, mostra que a iniciativa teve sucesso para recuperar um pouco da credibilidade perdida nos últimos anos.

Tomada na semana passada, três dias depois das eleições, a decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) do BC de subir os juros básicos de 11% para 11,25% ao ano alimentou críticas de que o governo da presidente Dilma Rousseff fez o arrocho que dizia que seus adversários iriam fazer. Não se pode ignorar, no entanto, que longe dos holofotes da campanha eleitoral dirigentes do BC deram pelo menos duas indicações, em linguagem até bem explícita para os padrões de banqueiros centrais, de que a alternativa de subir os juros estava sendo cogitada.

Em fins de setembro, o diretor de Política Econômica da Banco Central, Carlos Hamilton Araújo, declarou em entrevista de divulgação do Relatório Trimestral de Inflação que as hipóteses que seriam contempladas nas reuniões seguintes do Copom eram manter os juros em 11% ao ano ou, caso necessário, subi-los. Nessa mesma oportunidade, ele fez a defesa, do ponto de vista técnico, da autonomia em lei do Banco Central, uma proposta do programa de governo da candidata do PSB, Marina Silva, muito atacada pela campanha de Dilma.

Em meados de outubro, na reunião de outono do Banco Mundial e do Fundo Monetário Internacional (FMI), o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, renovou o alerta. "De modo algum o BC será complacente com a inflação. Se preciso for, e no momento certo, caso seja necessário, nós estaremos prontos para agir".

Essas duas sinalizações do BC fizeram com que os juros negociados no mercado financeiro passassem a precificar uma grande probabilidade de alta dos juros em dezembro. O consenso dos analistas econômicos consultados na pesquisa Focus de expectativas, feita pelo BC, era de que os juros subiriam para 11,25% em janeiro.

Embora a alta de juros fosse uma hipótese latente, poucos aventavam a hipótese de que o aperto iria ocorrer na semana passada. Certamente faltou ao BC indicar com um pouco mais de exatidão o momento em que estava disposto a fazê-lo. É possível que a sinalização não tenha ocorrido previamente porque o Copom só chegou a um consenso sobre quando subir os juros na reunião da semana passada. Reportagem publicada pelo Valor na sexta-feira mostra que três membros do Copom votaram contra a alta não porque discordavam do aperto, mas sim porque achavam que esse não era o momento mais adequado.

Do ponto de vista técnico, havia justificativa para subir os juros desde já. As projeções apresentadas no Relatório Trimestral de Inflação de setembro foram levemente piores do que as da edição anterior, de junho. A variação do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de setembro, de 0,57%, ficou acima do 0,4% previsto pelo mercado financeiro. A desvalorização cambial entre as reuniões do Copom de setembro e de outubro somou cerca de 10%, o que tende a se traduzir em um aumento da inflação de cerca de 0,5 ponto percentual nos próximos 12 meses.

Na sua justificativa para a decisão, o Copom sustentou que, ao agir com antecedência, o custo de combater essas novas pressões inflacionárias será menor. Mas, por outro lado, a antecipação do aperto monetário inicialmente previsto para dezembro traz seus riscos. A economia se encontra em recessão técnica, e nem todos os efeitos da alta de juros feita até abril tiveram tempo de chegar à atividade e à inflação. Uma boa parte da depreciação cambial ocorrida recentemente no calor das eleições pode ser revertida nas próximas semanas.

Mas eventuais dúvidas sobre a oportunidade da alta de juros foram dissipadas pelo resultado primário do setor público de setembro, divulgado na sexta-feira, que registrou um déficit de R$ 25 bilhões. A cifra equivale a cerca de 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB). Mesmo que o governo venha a realizar o prometido ajuste fiscal nos próximos meses, o estrago na inflação de 2015 provavelmente já está feito, pois a gastança se transmite para a atividade e para os preços com defasagens. A política fiscal frouxa levou a juros mais altos.