Davos - Na declaração mais enfática desde que assumiu o cargo, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, defendeu a necessidade de um forte ajuste fiscal para "arrumar a casa", e disse que a sua equipe não está no governo "para fazer remendos". Em conversa com jornalistas no fim de seu primeiro dia de trabalho no Fórum Econômico Mundial, na cidade de Davos, nos Alpes Suíços, Levy enfatizou que a prioridade é o ajuste das contas públicas e que é preciso ter paciência em relação à retomada do crescimento. 

Mais cedo, em almoço com cerca de 80 empresários e investidores, o ministro havia previsto que o Brasil não vai crescer neste ano, devido aos acertos que será preciso fazer na economia. De acordo com relato de participantes, Levy enfatizou que o ano será de ajustes, citando como exemplo o aumento de impostos anunciado na segunda-feira. "Ficou claro que ainda vem remédio amargo", disse um dos presentes ao evento. Horas depois, em entrevista à TV Bloomberg, ele admitiu que a atividade econômica poderá até mesmo sofrer queda em algum trimestre. 

Na conversa com a imprensa, Levy afirmou que as medidas amargas que o governo vem adotando visam preparar o país para um crescimento sólido, mas deixou claro que os resultados não virão rapidamente. 

"Temos que ter paciência e humildade, caminhar passo a passo. Não adianta fazer previsões ultraotimistas." Ele avaliou, ainda que os investidores internacionais estão torcendo pelo Brasil. 

Sem mencionar o nome da presidente Dilma Rousseff nem o de seu antecessor no cargo, Guido Mantega, o ministro fez uma crítica velada à política que vinha sendo conduzida pelo Ministério da Fazenda. Ele comparou a situação ao motorista que tenta acelerar um automóvel na ladeira usando a quarta marcha. 

"Aquela história de pisar no acelerador, com incentivos, fazia o carro engasgar, não tinha tração. Agora, engatamos uma segunda e, aí, acelera. A economia tem tudo para reagir quando as coisas estiverem em seus lugares", disse. 

O ministro da Fazenda é a mais alta autoridade brasileira no Fórum de Davos. A presidente Dilma Rousseff não compareceu, preferindo ir a La Paz prestigiar a posse do presidente da Bolívia, Evo Morales, que foi reeleito para o terceiro mandato.

 

Para banco, PIB cairá 0,5%

 

O Credit Suisse acredita que a economia brasileira vai encolher 0,5% em 2015. Em relatório encaminhado ontem a clientes, a instituição afirma que, nos últimos dois meses, "cresceu significativamente" a possibilidade de contração da atividade econômica do país e que, por isso, decidiu revisar para baixo a estimativa anterior, bem mais otimista, que apontava crescimento de 0,5%. 

Vários fatores, segundo os economistas do banco, levaram à piora do cenário. Entre eles, a redução da renda disponível das famílias, em consequência da elevação de preços administrados, como tarifas de eletricidade, os aumentos de impostos, e a elevação do risco de racionamento de água e de energia. 

"Estimamos que a probabilidade de racionamento de eletricidade aumentou de 23% em novembro para 36% em meados de janeiro", dizem os analistas, no documento. "Esse cenário torna uma recuperação na confiança empresarial e do consumidor ainda mais improvável nos próximos meses." Para o Credit Suisse, o consumo das famílias deve crescer apenas 0,3% neste ano e os investimentos terão queda de 4,4%. 

Desconfiança 
Um dos motivos do baixo desempenho da economia brasileira é que a confiança dos investidores no país continua "teimosamente fraca", na avaliação do Fundo Monetário Internacional (FMI). A instituição, contudo, avalia que o governo está no caminho certo, ao promover medidas de ajuste para recuperar o equilíbrio nas contas públicas. 

"A confiança é difícil de se recuperar, mas as autoridades brasileiras começaram com o pé direito", disse ontem o diretor do Departamento do Hemisfério Ocidental do FMI, Alejandro Werner. Ele ressaltou, porém, que ainda há muito a ser corrigido. "Nós acreditamos que todo o pacote (anunciado nesta semana pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy) está na direção correta, mas há mais a ser feito, tanto no lado fiscal quanto em infraestrutura", afirmou. 

Segundo o diretor do FMI, fatores como o baixo crescimento da economia, assim como a incerteza mundial pesaram para diminuir a confiança no Brasil. Na terça-feira, a instituição anunciou a revisão de suas projeções para o crescimento mundial. No caso brasileiro, cortou a estimativa para a expansão do PIB em 2015 para apenas 0,3%.

China desacelera

O presidente do banco central da China, Zhou Xiaochoan, afirmou ontem que as autoridades do país devem apresentar ao Congresso do Povo, em março, uma meta menor de crescimento para a economia neste ano. Ele não citou números, mas afirmou que um ritmo um pouco menor de expansão permitirá que a China se torne mais estável por meio de reformas. A economia chinesa avançou 7,4% no ano passado, a menor taxa desde 1990. "Se o crescimento da China desacelerar um pouco, mas a economia se tornar mais sustentável, isso é boa notícia", disse Zhou, durante o Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça.