BRASÍLIA- O plenário do Tribunal de Contas da União (TCU) derrubou uma tentativa da Petrobras e do ex-presidente da estatal José Sérgio Gabrielli de barrar as investigações sobre a rede de gasodutos Gasene, construída por uma empresa paralela estruturada pela Petrobras. O TCU já havia enviado cópia da auditoria nas obras ao Ministério Público Federal e à PF, responsáveis pelos desdobramentos da Operação Lava-Jato, que investiga corrupção na Petrobras. A estatal e Gabrielli tentavam anular o envio de documentos que registram super faturamento superior a 1.800% em trechos dos gasodutos, além de pagamentos sem a execução dos serviços, ausência de projetos básicos e dispensas ilegais de licitação. A Petrobras apresentou um agravo contra a remessa do material, determinada pelo ministro-substituto André Luís de Carvalho, relator do processo.

Ontem, os ministros derrubaram o recurso por unanimidade. A sessão também serviu para ministros do tribunal se posicionarem abertamente contra o avanço de sociedades de propósito específico (SPEs) — empresas paralelas criadas legalmente para captação de recursos no mercado — em estatais e empresas públicas. A rede de gasodutos Gasene, entre Rio de Janeiro e Bahia, passando pelo Espírito Santo, foi construída por uma dessas SPEs, a Transportadora Gasene. O GLOBO revelou as suspeitas sobre as obras, a expansão do modelo na Petrobras, os pagamentos de propinas a partir de contratos com essas empresas e a existência de empreendimentos paralelos em órgãos, como a Caixa. O processo sobre o Gasene é sigiloso e tramita nas sessões reservadas do TCU.

No início da sessão, o relator propôs que os recursos da Petrobras e de Gabrielli contra as investigações fossem apreciados sem sigilo. O plenário concordou e derrubou os agravos. Os ministros não enxergaram irregularidade ou ilegalidade no envio de documentos à PF e ao MPF . As instituições poderão usar os dados da auditoria para nova frente de apuração.—Chegou o momento de a Petrobras se posicionar claramente sobre todas essas situações. A estatal recorreu contra uma decisão que lhe foi favorável. Quando a empresa se insurge para não enviar esses documentos, causa, no mínimo, uma estranheza — afirmou Carvalho .

"INDÍCIOS DE ILÍCITO PENAL"

A estatal e Gabrielli queriam que a força-tarefa ignorasse as suspeitas levantadas pela área técnica do TCU a respeito das obras do Gasene . No agravo protocolado no tribunal em 30 de dezembro, advogados da estatal tentaram barrar as investigações sobre o Gasene com o argumento de que as conclusões sobre irregularidades ainda não foram validadas pelo plenário do TCU. O recurso contestava outras duas medidas ordenadas peloTCU: a realização de diligência junto à Petr obras para obtenção de novos documentos, "em especial os imprescindíveis à análise pormenorizada do sobrepreço ", e a abertura de processo específico para acompanhar as investigações da Lava-Jato, caso surjam evidências de desvios de recursos públicos no Gasene .

A Petrobras sustenta que essa empresa foi a responsável pelo empreendimento . A estatal, no entanto, teve total controle da obra e é a responsável por pagar os financiamentos do BNDES. No voto sobre o recurso, Carvalho apontou a suspeita sobre um superfaturamento de "grande amplitude" e ressaltou que as providências determinadas buscaram verificar se esse sobrepreço "teria alimentado de alguma forma o esquema de corrupção perpetrado contra a Petrobras ". O processo sobre o Gasene foi analisado pelos ministros em sessão reservada de 9 de dezembro. A votação foi interrompida por pedido de vista do ministro Bruno Dantas . O relator consultou o colegiado sobre a possibilidade de já enviar os documentos à força-tarefa. O plenário deu aval.

— Há indícios de ilícito penal e a colaboração entre MPF e TCU pode trazer avanços. A Petrobras questionou a falta de urgência, mas a urgência vem de todo o processo que se discute sobre delação premiada. Em outros assuntos que envolvem delação, o TCU já havia aprovado o trabalho conjunto de técnicos do tribunal com PF e MPF . O trabalho já existe —afirmou Carvalho. O ministro Bruno Dantas criticou a adoção das SPEs:—Temos observado um comportamento padrão da administração federal com SPEs. Com base nos acordos de acionistas feitos , há a interpretação dos órgãos públicos de que SPEs podem ser contratadas pelo poder público sem licitação. As SPEs têm se espraiado para vários setores e podem ser uma nova fronteir a para fugir ou reduzir a atuação dos órgãos de controle .