Um levantamento do cientista político Paasha Mahdavi, da Universidade da Califórnia, mostra que de 143 processos movidos pela Securities and Exchange Comission (SEC) e o Departamento de Justiça americano (DoJ) com base no Foreign Corrupt Practices Act (FCPA), de 1977 a 2013, 41 envolveram suborno em contratos da indústria de óleo e gás. Foram mapeados casos em 39 países produtores de petróleo.

 

O FCPA foi criado na década de 70, em resposta a escândalos envolvendo empresas americanas e autoridades no exterior. A lei proíbe empresas sediadas no país ou com ações listadas na Bolsa de Nova York, como a Petrobrás, de subornar autoridades de governo estrangeiras para ganhar ou manter negócios. A seguir, os principais trechos da entrevista.

 

Quais as principais conclusões do seu estudo?

 

Entre as conclusões uma das que se destacam é que o óleo não conduz necessariamente à corrupção, mas há corrupção na indústria do petróleo em particular quando as empresas petrolíferas nacionais estão envolvidas no processo de licitação dos contratos. A corrupção afeta empresas de todos os tamanhos - as enormes, como Chevron, Shell, Statoil e Total para pequenos serviços e empresas comerciais, tais como Technip, Weatherford e Marubeni Corporation. Outro padrão interessante é que há muito mais repressão à corrupção agora no setor de petróleo do que nunca. Nos últimos três anos, houve 20 casos no FCPA processados no setor de petróleo, em comparação com 24 casos para os primeiros 13 anos da minha análise.

 

Por que o setor de óleo e gás tem maior incidência de casos de corrupção na SEC e no DoJ?

 

A principal característica do setor que leva à alta corrupção é o processo de licitação de contratos, especialmente em países onde o processo de contratação está sujeito a pouca fiscalização, tanto pelo governo quanto pelo público.

 

A proximidade de empresas com o setor público e com órgãos reguladores facilita a corrupção?

 

As empresas estatais, as empresas petrolíferas especificamente nacionais (national oil companies, ou NOCs), tendem a ser mais opacas do que os ministérios ou agências. Isso é em grande parte pela falta de regras que exijam delas a divulgação de informações a outros ramos do governo. Em segundo lugar, a cúpula dessas estatais - como diretores executivos e membros do conselho - é nomeada com base em indicações políticas, e não por mérito. Isso pode criar uma cultura onde o comportamento corrupto é comum.

 

O que o sr. chama no estudo de estatais não regulatórias?

 

Numa national oil company (NOC ou estatal) não regulatória os contratos de petróleo não são concedidos por ela, mas por um ministério do governo (ou departamento ou agência, como a Agência Nacional do Petróleo, a ANP, no Brasil), que normalmente é supervisionada por outros ramos do governo. A NOC, por outro lado, é menos transparente e menos pressionada pelo governo para divulgar informações sobre as transações. É tão comum que NOCs sejam estruturas opacas que o aumento da transparência nessas empresas é o objetivo de muitas organizações não governamentais de todo o mundo. Assim, quando a NOC está a cargo da licitação de contratos de exploração, em vez do ministério, o suborno é mais provável porque a pouca transparência das transações torna menos provável que funcionários sejam pegos.

 

Sua pesquisa afirma que estatais não regulatórias como a Petrobrás têm menores níveis de corrupção. O sr. está a par do esquema de pagamento de propina a empreiteiras e políticos com recursos da estatal?

 

Sim, estou a par do esquema. Mas minha investigação centra-se apenas no upstream (exploração e produção), não no refino ou na distribuição. E refino é a parte da cadeia de abastecimento, onde os escândalos com a Petrobrás estão ocorrendo, mas não é tecnicamente surpresa para mim. Não é que a estrutura institucional regulatória tenha de ser independente do governo, mas sim que as agências reguladoras sejam independentes das estatais. Então, no Brasil, é justamente pelos fortes laços da Agência Nacional do Petróleo com o governo que vemos menos corrupção no setor de exploração e produção. Para os campos do pré-sal, por exemplo, a agência é o órgão responsável pela concessão, não a Petrobrás.

 

E sobre a compra da refinaria de Pasadena nos EUA?

 

Nenhum país está imune à corrupção e os Estados Unidos não são exceção. Mas é um caso interessante que é surpreendente, dada a forte estrutura institucional, juntamente com a dificuldade e os custos de suborno nos EUA. Esse caso não é tecnicamente sujeito a uma violação da FCPA, já que o suborno ocorreu nos EUA e não em um país estrangeiro, mas também porque não foi paga propina a funcionário público.

 

Após um escândalo desse nível, como recuperar a confiança dos investidores?

 

O primeiro passo é a cooperação com a SEC e o Departamento de Justiça na investigação e no processo: isso garante que a empresa não vai gastar tempo e dinheiro em um processo judicial prolongado. A cooperação também pode ajudar na redução das penalidades. Em segundo lugar, a empresa deve dedicar esforços para melhorar a transparência em sua contabilidade para cumprir as normas internacionais.

 

Quantas empresas de petróleo foram processadas por corrupção na SEC desde 1977?

 

Desde 1977, houve 41 empresas de petróleo processadas pela SEC e o Departamento de Justiça em conjunto, sendo algumas mais de uma vez. As sanções somam pouco menos de US$ 2 bilhões.

 

Podemos dizer que o Brasil, com um modelo de empresa estatal não reguladora está funcionando bem contra a corrupção?

 

O modelo brasileiro funciona bem contra a corrupção no setor de exploração e desenvolvimento. O nível de corrupção no Brasil, medida pela incidência de casos sujeitos ao FCPA, é menor do que em vários outros países produtores de petróleo, incluindo México, Venezuela, Indonésia e os Emirados Árabes Unidos. E em termos de penalidades do FCPA no setor de petróleo, o Brasil posiciona-se como o 17.º melhor entre 46 países produtores de petróleo. Estão à frente do Brasil países como Canadá, Inglaterra, Noruega, Qatar e Trinidad & Tobago.