Em 2015, não há Copa nem eleições, mas a atividade do mercado de dívida internacional deve encontrar outros obstáculos e provavelmente não irá superar os números de 2014, na avaliação de executivos que atuam na área.
 
O ajuste macroeconômico previsto para a economia brasileira, a queda nos preços das commodities, a normalização da política monetária americana e a situação confortável de liquidez das grandes empresas do país são alguns dos empecilhos citados por executivos a uma guinada nas captações externas em 2015.
 
"A tendência é termos um volume de emissões menor em 2015, embora isso possa mudar ao longo do ano", afirma André Silva, diretor de mercado de capitais do Deutsche Bank. Ele lembra que, no segundo semestre de 2014, houve apenas seis operações e muitas companhias cancelaram ofertas. "As execuções foram bem mais difíceis", diz. "Claramente o poder de barganha saiu do lado dos emissores e está do lado dos investidores agora."
 
Apesar de a segunda metade do ano ter sido fraca, emissores brasileiros captaram um total de US$ 47,9 bilhões no mercado de dívida internacional em 2014, mais que os US$ 39,2 bilhões registrados em todo 2013, de acordo com levantamento do Valor Data. "Mas não há nada que diga "puxa, o mercado está fantástico, provavelmente ano que vem a gente vai bater outro recorde"", diz Silva.
 
O primeiro, e provavelmente o maior, entrave ao fortalecimento das emissões de bônus é o cenário macroeconômico. A expectativa é que seja feito um ajuste fiscal e monetário, que terá consequências para a atividade econômica. O crescimento baixo deve manter as empresas pouco ativas no mercado de dívida, ao menos no primeiro semestre.
 
Alexei Remizov, diretor de mercado de capitais do HSBC, explica que o mercado está "na fase de avaliar as perspectivas de crédito do Brasil". Por isso, ele também projeta um enfraquecimento na atividade desse mercado. "Com certeza vamos ver um volume de emissões mais fraco", diz.
 
Outra dificuldade é a queda nos preços das commodities, em especial o petróleo, que tem forte impacto para economias exportadoras desses produtos, como é o caso do Brasil. Muitos países emergentes viram seus prêmios de risco subirem em decorrência desse movimento, tornando as captações mais caras.
 
No caso do Brasil, a piora no risco também se deve às investigações de corrupção envolvendo a Petrobras e ao momento de transição na política econômica, que gera incertezas.
 
"O que vai ser importante para o mercado é se vai mudar a perspectiva de crescimento [do Brasil]", afirma Remizov. "Isso é o que pode gerar mais investimentos e mais captações", diz.
 
Eduardo Freitas, corresponsável pela área de emissão de dívida do Citi no Brasil, também chama atenção para esse fator. Ele aponta que será preciso verificar se o governo irá implementar as medidas de ajuste e como o mercado irá reagir a essa política. "Tem fatores de risco que são diferentes do ano passado", diz.
 
Freitas também levanta outras questões que irão pautar o mercado de dívida no ano que vem, como a normalização da política monetária dos Estados Unidos, a recuperação ainda lenta da zona do euro a despeito dos juros baixíssimos e a recessão do Japão. "O mercado do próximo ano não tem Copa nem eleição, mas tem, na outra ponta, fatores globais importantes", diz o executivo.
 
Todas essas questões devem manter a palavra "seletividade" como regra no mercado. "O investidor está muito mais focado em estudar o crédito", afirma Adrian Guzzoni, que coordena, ao lado de Freitas, a área de emissão de dívida do Citi no Brasil.
 
O ambiente, portanto, não deverá ser muito favorável aos novos emissores. "Não vejo, por enquanto, muita capacidade de acesso para empresas de padrão menor", diz Remizov, do HSBC. "O mercado vai ficar mais confortável com nomes já estabelecidos", afirma.
 
Para as grandes empresas, o mercado estará aberto, mas a um custo mais alto. "O mercado todo está requerendo um prêmio maior para novas emissões na América Latina toda", diz Guzzoni, do Citi.
 
Como as grandes companhias brasileiras estão, em geral, bem capitalizadas e não têm volumes expressivos de dívidas vencendo no próximo ano, isso não deve ser um grande problema.
 
"As empresas de primeira linha estão todas muito bem equacionadas", afirma Silva, do Deutsche Bank. "Fizeram um trabalho muito bom de gestão de passivos e de antecipação de suas necessidades de financiamento." Além disso, ele afirma que a maioria das grandes empresas ainda consegue fazer operações no mercado bancário. "Então, não há nenhum tipo de pressão."
 
As operações de gestão de passivos, que foram recorrentes neste ano, devem continuar fortes em 2015. "Muitas companhias já fizeram, mas não todas elas", afirma Freitas, do Citi. "Elas podem aproveitar enquanto os juros lá fora continuam baixos."
 
Outra tendência para 2015, apontam alguns executivos, são os "project bonds", bônus atrelados a um projeto. Remizov, do HSBC, avalia que a nova equipe econômica irá estimular o mercado externo a conceder funding de longo prazo às empresas e, nesse contexto, esse instrumento pode ganhar relevância. "Algumas empresas de infraestrutura vão pensar em captar para projetos específicos", diz.
 
Freitas, do Citi, lembra que o novo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, sinalizou que o BNDES passará a ser menos ativo no mercado como um todo. "Então acho que o setor de infraestrutura irá se financiar mais em mercado de capitais", afirma. "O mercado internacional certamente tem espaço para captações de infraestrutura."