No mesmo dia em que o governo recalibrou as previsões sobre os indicadores econômicos, o futuro ministro da Fazenda, Joaquim Levy, saiu do encontro com Guido Mantega com a impressão de que é possível botar ordem na casa sem virá-la de ponta-cabeça, mas com uma jornada de pelo menos 15 horas por dia, segundo disse a um amigo. Sisudo, Levy chegou até a sorrir para os fotógrafos ao apertar a mão de Mantega, o mais longevo ministro nesse posto.

Conhecido como "linha-dura", Levy teve a primeira reunião com Mantega na quinta-feira, uma semana após ter sido anunciado pela presidente Dilma Rousseff como seu sucessor. A reunião durou 40 minutos.

Desde que foi chamado por Dilma para tirar a economia das cordas, Levy retomou a rotina de disparar e-mails a partir de 5 horas, com análises do cenário para colegas, e "missões" para auxiliares. A mania vem desde o tempo em que ele era secretário do Tesouro Nacional, no primeiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva, quando era achincalhado por nove entre dez petistas.

Na primeira semana da transição, Levy e o futuro ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, despacharam no 3.º andar do Palácio do Planalto. A dupla produziu relatórios sobre o atual quadro econômico e começou a separar os problemas por ordem de gravidade, para decidir o que atacar primeiro. Não foi só: resolveu trabalhar com dados do boletim Focus, relatório publicado toda semana pelo Banco Central, com previsões sobre inflação, câmbio, juros e crescimento.

Novos ministros têm jornada de até 15h no Planalto (Foto: ABr)

Novos ministros têm jornada de até 15h no Planalto (Foto: ABr)

 

Confiança. A nova equipe quer evitar o otimismo exagerado e ganhar a confiança dos investidores, divulgando a fotografia do momento. Nos bastidores, o comentário é que o desgaste de Mantega começou com prognósticos que não se confirmaram.

"O meu grande orgulho é ter liderado a economia brasileira durante a mais grave crise financeira em 80 anos e entregar o País com a menor taxa de desemprego da história", disse Mantega na quinta-feira, ao ser homenageado pelo Conselho Federal de Contabilidade, pouco antes de se reunir com Levy.

Foi, porém, com a avaliação de que a economia precisa de uma guinada que o governo reduziu a previsão de crescimento de 2% para 0,8%, em 2015. Além disso, com o ajuste fiscal, Dilma pretende recuperar a credibilidade, atrair investidores e se aproximar do empresariado.

A retórica de Mantega em tom de despedida desfiada na homenagem era sabida de cor. No fim do mês passado, "a ficha caiu". Quando soube que a nova equipe econômica seria anunciada com direito a entrevista coletiva no Palácio do Planalto, em 27 de novembro, Mantega pediu a um subordinado uma caixa, que encheu com seus pertences do gabinete.

Ele achou que estava prestes a fechar o ciclo de oito anos na pasta. Mas Dilma frustrou seus planos ao lhe informar que precisaria dele para uma última missão: participar da transição da equipe econômica. "Preciso de você até o fim do mês (dezembro)", disse ela. Mantega não gostou.

Planejamento

Barbosa teve mais de dez horas de reunião com a atual ministra, Miriam Belchior, que está tratando pessoalmente da "passagem do bastão". Em uma dessas reuniões Levy estava presente. A principal missão dos novos ministros tem sido levantar dados além dos oficiais, para se fazer um diagnóstico da situação dos cofres do País, hoje pouco transparentes.

Na quarta-feira, Levy se reuniu com o novo ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Armando Monteiro. Na pauta, mudanças no Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Os dois concordaram em que medidas de estímulo à indústria ficam no passado, ao menos por enquanto. Agora, as bondades só sairão do papel se trouxerem pouco impacto fiscal.