A forte queda dos preços das commodities derrubou as exportações dos principais mercados emergentes nos últimos meses, entre eles o Brasil, situação que deve ser agravada pela crise na Rússia, avaliam economistas. De acordo com cálculos da Capital Economics, a média móvel trimestral das exportações dos países latino-americanos caíram 2,7% no trimestre encerrado em outubro, em relação a igual período de 2013. Nos emergentes europeus, a queda foi de 4,4% e na África e no Oriente Médio, 1,1%.

No Brasil, as exportações no período foram 16% menores. Para economistas, os efeitos diretos e indiretos da crise russa sobre a economia doméstica e a valorização do dólar em relação a maioria das moedas globais colocam em risco a perspectiva de algum aumento da demanda externa por produtos brasileiros em 2015. Na melhor das hipóteses, dizem, o setor externo terá contribuição nula para a economia brasileira no ano que vem, mesmo com a retomada da atividade nos Estados Unidos.

Os problemas enfrentados pela economia russa, que já vinham se acumulando com as sanções econômicas impostas por EUA e União Europeia diante dos conflitos na Ucrânia, tomaram proporções maiores com a forte queda do petróleo a partir do fim de outubro. Com o barril mais barato nos mercados internacionais, o rublo teve forte desvalorização, mesmo com uso de reservas e flexibilização do regime de câmbio pelo BC russo. Para Monica Baumgarten de Bolle, sócia da Galanto Consultoria, a crise, que já parecia inevitável na última semana, tomou contornos mais problemáticos com a decisão do Banco Central de implementar um choque nos juros, com aumento da taxa de 10,5% para 17% ao ano na segunda-feira.

Para Monica, o enfraquecimento da economia russa deve ter reflexos visíveis sobre o Brasil. De um lado, há a perspectiva de redução das exportações de carnes brasileiras, que ganharam relevância nos últimos meses com o embargo.

Além do efeito sobre as vendas externas, a situação na Rússia torna mais remota a recuperação da economia europeia, diz Welber Barral, ex-secretário de comércio exterior e consultor da Barral M Jorge. Há seis meses, diz, a expectativa era de que os países europeus tivessem alguma retomada a partir de 2015. "Claro que não se esperava nada de estrondoso, mas a avaliação era de que seria ao menos o início de uma aceleração pequena e lenta. Agora, com a crise da Rússia, mesmo essa pequena recuperação fica remota."

Para José Augusto de Castro, presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), o cenário europeu, a partir do agravamento da crise russa, é uma incógnita adicional dentro das incertezas que rondam o comércio exterior em 2015.

A avaliação, diz Castro, é que a já combalida importação russa sofra ainda mais no ano que vem. De janeiro a setembro, a importação da Rússia caiu 6,3% contra iguais meses do ano passado. No mesmo período, a importação global cresceu 2%. Em outubro, contra igual mês de 2013, a importação russa caiu ainda mais, em 12,4%. Os dados são da Organização Mundial do Comércio (OMC), que reúne informações de 70 economias responsáveis por 90% do comércio mundial.

A demanda em queda dos russos também não deve ser compensada por outros países. Barral avalia que a expectativa será mantida em relação à reação dos Estados Unidos, mas a avaliação, porém, é que a recuperação americana continuará lenta. Ao mesmo tempo, a economia chinesa deve seguir crescendo, mas ainda em desaceleração, diz.

Há ainda a perspectiva de contágio financeiro, comenta Monica, da Galanto. "Um grande país emergente entrando em convulsão está longe de ser um cenário confortável", afirma a economista, lembrando que a Rússia também dispõe de elevados volumes de reservas cambiais, o que não foi suficiente para conter forte desvalorização do rublo. "O mesmo tipo de avaliação pode ser feito sobre o Brasil, de que reservas não são suficientes", diz a economista. Ontem, o dólar encerrou o dia em R$ 2,73, maior patamar desde 2005.

A desvalorização, diz Barral, é um ponto favorável para o manufaturado brasileiro, mas talvez não seja suficiente para alavancar exportações, já que há um movimento geral de outros países também com depreciação cambial. Outro entrave é que o mercado latino-americano também deve perder receita de exportação por conta da queda de preços de commodities.

Para Carlos Thadeu de Freitas Jr, economista da Franklin Templeton, os três fatores que influenciam os preços de matérias-primas estão contribuindo para a derrubada das cotações desses produtos, sem perspectiva de reversão desse movimento no curto prazo. Com a desaceleração da economia chinesa e menor crescimento dos demais países emergentes, a demanda por commodities vem caindo. A oferta, por outro lado, segue firme, com boas safras de grãos esperadas neste ano nos Estados Unidos e manutenção do nível de produção de petróleo. Por último, a normalização da política monetária nos EUA tem motivado um forte movimento de valorização do dólar contra as demais divisas globais, o que diminui o poder de compra dos outros países e a demanda por commodities.

O economista projeta alta de cerca de 0,2% do PIB brasileiro no próximo ano. "Temos ajuste fiscal, commodities em queda, piora dos termos de troca, então não há nada que me faça acreditar em um ano mais positivo".

Monica avalia que a crise na Rússia e a queda das commodities devem levar, em algum momento, a uma nova rodada de revisão de projeções para a economia em 2015. Segundo o último boletim Focus, os analistas de mercado projetam alta de 0,7% do PIB em 2015. "Não acho que estamos falando de recessão, mas deve haver alguma piora", diz.

 

 

VENDA DE CARNE BOVINA PARA MERCADO RUSSO CAI EM DEZEMBRO

A severa crise que atinge a Rússia continua a prejudicar as exportações brasileiras de carne bovina, que logo após o embargo de Moscou à União Europeia e Estados Unidos tinham sido favorecidas. Segundo dados da Secretaria de Comércio Exterior (Secex), a média diária das exportações de carne bovina in natura nas duas primeiras semanas de dezembro recuaram 46,43% ante a média de dezembro de 2013, atingindo US$ 2,268 milhões. Na comparação com novembro, a retração também é significativa, de 20,23%. Em novembro, a crise russa já havia derrubado as vendas dos frigoríficos brasileiros - as vendas recuaram 60% em relação a outubro.

No acumulado de 2014, porém, a receita com exportações de carne bovina para a Rússia cresceu, impulsionada pelos preços elevados e pela demanda aquecida até meados de outubro, período em que o Brasil vinha se beneficiando do embargo de Moscou ao Ocidente em retaliação às sanções econômicos em decorrência do conflito na Ucrânia. Segundo dados da Secex compilados pela Abiec, associação que reúne exportadores de carne bovina, as exportações somaram US$ 1,124 bilhão, alta de 13,8% na comparação com igual período de 2013. A Rússia é o segundo principal importador de carne bovina do Brasil, só atrás de Hong Kong.

Nos casos das carnes de frango e suína, o impacto ainda é relativo. Enquanto há forte queda da receita média diária quando comparada às vendas de novembro, a comparação com dezembro é bastante favorável. Conforme a Secex, a receita média diária das exportações de carne de frango in natura para a Rússia foi de US$ 976 mil, mais do que o triplo de dezembro de 2013, mas 62,7% inferior à de novembro deste ano. Para a carne suína, a média ficou em US$ 2,503 milhões, avanço de 65,5% sobre dezembro de 2013 e queda de 39,71% sobre novembro de 2014. O comportamento das vendas de frango reflete os efeitos do embargo russo. Até agosto, o Brasil exportava muito pouco para os russos. Com o embargo, a Rússia precisou se abastecer de frango no Brasil, o que faz com que a comparação com dezembro de 2013 seja amplamente favorável. Em contrapartida, a comparação com novembro já é um alerta de que demanda - e, sobretudo, os preços - não resistirão à crise na Rússia.

Para a carne suína, as explicações são um pouco diferentes, uma vez que a Rússia já era o principal cliente do Brasil. Nesse caso, o que ocorre é escassez global de oferta de suínos, o que impulsiona preços e ajuda a elevar a receita de exportação. Mas, levando-se em consideração a comparação com novembro, esses preços altos estão com os dias contados.

A crise russa deve reduzir ainda mais a contribuição do comércio bilateral para a balança brasileira. Desde 2001 o Brasil manteve, ano a ano, superávit no comércio com a Rússia. Nos últimos dois anos, porém, a queda da exportação brasileira para os russos em ritmo mais acelerado que o da importação achatou os saldos. Em 2011 o superávit com os russos foi de US$ 1,27 bilhão, mas com a perda de fôlego das exportações brasileiras o saldo caiu e no ano passado chegou a US$ 298,1 milhões. Em 2014, a alta do embarque brasileiro de carnes aos russos em razão do embargo de Moscou fez o superávit acumulado até novembro chegar a US$ 824,6 milhões. O desempenho, porém, não deve se sustentar. Em 2015 o Brasil ainda deve manter superávit com a Rússia. Mas, segundo José Augusto de Castro, presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), será um "superávit de forma negativa", gerado não pelo aumento dos embarques mas sim pelo recuo das importações.

 

Na OMC, Brasil reclama dos EUA e pede uma solução multilateral para o câmbio

 

O Brasil afirmou na Organização Mundial do Comércio (OMC) que foi "fortemente afetado" pela política de liquidez do Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA), e defendeu soluções multilaterais para a questão do câmbio. Os EUA foram alvos de mais de 1.700 questionamentos (número recorde) por parte dos parceiros na OMC, no exame de sua política comercial. Vários países pediram para Washington levar em conta os efeitos e influência de suas políticas sobre a economia global e minimizar os riscos e desafios que impõem sobre outras economias. O embaixador brasileiro na OMC, Marcos Galvão, apontou as medidas monetárias não convencionais, adotadas desde 2009 - e que estão agora sendo retiradas pelo Fed - como uma das questões de implicações sistêmicas globais. Economias emergentes com câmbio flexível - o Brasil destacando-se entre elas - foram fortemente afetadas pela liquidez global produzida por essas políticas, afirmou o representante brasileiro. Também serão afetadas com a reversão dessas medidas expansionistas, com os impactos, incluindo os adversos, indo na direção oposta de retirada de liquidez. O embaixador brasileiro acrescentou que soluções multilaterais negociadas para a questão de divisas deveriam resultar em melhores termos de estabilidade econômica e comercial do que "respostas com políticas descoordenadas". Galvão afirmou que o Brasil continuará a trabalhar com os EUA e outros parceiros tanto na OMC como em outros foros (FMI, G-20) para tratar da questão cambial e seus efeitos. A Confederação Nacional da Indústria (CNI) vem pedindo para o governo reativar a proposta sobre câmbio na OMC. A entidade acha que o Brasil não pode ficar amarrado na "armadilha conjuntural", porque o real está desvalorizado agora. A entidade sugere uma perspectiva de longo prazo que leve em conta a estratégia de aumentar competitividade, inovação e produtividade. A CNI quer "remédios multilaterais" para distinguir o que é política cambial legítima e o que é câmbio manipulado para ganhar vantagem no comércio. Galvão disse também que os EUA têm provavelmente o maior superávit comercial justamente com o Brasil - mais de US$ 36 bilhões no ano passado, de um comércio bilateral de US$ 60,6 bilhões. Apontou várias barreiras contra produtos brasileiros no mercado americano, incluindo cotas para açúcar, picos tarifários para têxteis e confecções, subsídios agrícolas e outros. Gastos na Farm Bill, a lei agrícola americana, que devem alcançar US$ 489 bilhões em cinco anos, foram alvo do Brasil e de vários parceiros. A China, segunda maior economia do mundo, acusou Washington de ter adotado novas políticas e práticas comerciais nos últimos anos que afetaram "severamente" interesses econômicos e comerciais de Pequim e de outros membros da OMC. Os chineses mencionaram "preocupações" que vão desde a implementação e retirada do programa de liquidez do Fed ("quantitative easing"), problemas da dívida americana, passando por uma série de políticas tributária, financeira e de crédito que encorajam a produção e consumo local e aumento de exportações. Vários países-membros da OMC reclamaram do "Buy American Act", programa que favorece aquisições de produtos americanos em detrimento dos estrangeiros, além do uso amplo de instrumentos de defesa comercial para frear importações. Os EUA também foram questionados a mostrar mais liderança e real engajamento nas negociações multilaterais na OMC.

 

Negociações com outras regiões avançam

 

Lentamente, o Mercosul começa a avançar rumo a entendimentos com novos parceiros comerciais. Em reunião que antecedeu a cúpula, os ministros de relações internacionais do bloco decidiram, nesta terça-feira (16/12), estabelecer as primeiras negociações com Líbano, Tunísia e países da América Central. Segundo o coordenador do Mercosul no Brasil, Antonio Simões, foi, ainda, elaborado memorando que indica a intenção do bloco de se aproximar também da União Alfandegária Euroasiática, liderada pela Rússia. Essas discussões devem começar em janeiro.

Sinalização - Embora ainda distantes de efetivamente estabelecer acordos comerciais com novas regiões, as decisões servem como a primeira sinalização para reduzir o caráter protecionista que caracterizou o bloco desde a sua criação. Não se falou, no entanto, sobre entendimentos com a União Europeia.

Brinquedos - Os ministros também definiram um programa de integração de produtos do setor de brinquedos. Trata-se de uma iniciativa para proteger a indústria local da forte concorrência chinesa.

Apresentação - As discussões dos chanceleres serão apresentadas nesta quarta-feira (17/12) aos chefes de Estado, que participarão da cúpula Mercosul em Paraná, a capital da província de Entre Rios.

Dilma - Dilma Rousseff é a presidente que passará menos tempo em Entre Rios. Ela deve chegar às 10h. Em seguida, participará do ato em que a presidente da Argentina, Cristina Kirchner, passará ao Brasil a presidência do bloco, renovada entre os países a cada seis meses. Dilma deve deixar a Argentina às 15h. Com agenda apertada, não deve ter muito tempo para um encontro bilateral com Cristina, conforme se esperava na Argentina.

Bolívia - Também não será desta vez que a Bolívia vai aderir ao bloco. O assunto faz parte da agenda, mas a integração depende de referendo de todos os países. No Brasil e no Paraguai, o assunto ainda não passou pelos Congressos.