O quadro mais restritivo para a demanda, com atividade econômica fraca, juros mais altos e ajuste fiscal em curso, deve finalmente moderar os repasses no setor de serviços em 2015, mas não será suficiente para tirar a inflação do topo da meta. Segundo economistas ouvidos pelo Valor, o alívio previsto para os preços livres, que não é muito expressivo, será totalmente mitigado pelos reajustes esperados para os itens administrados, que podem fazer com que o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) estoure o teto da meta no primeiro ano do segundo mandato de Dilma Rousseff. Esse é o cenário de Fabio Romão, da LCA Consultores, que trabalha com alta de 6,75% para o IPCA no período. "Os preços livres vão perder força por conta da atividade ainda enfraquecida, mas há muitas pressões dos administrados", diz Romão, principalmente das tarifas de energia elétrica. Em seus cálculos, os preços monitorados por contrato vão avançar 8,5% em 2015, conta que considera aumento de 20,9% de energia, de 11,6% da gasolina e de 4% nos preços de ônibus urbano, sem incluir reajuste nas tarifas da cidade de São Paulo. O que mais pesou na previsão para as contas de luz, além dos empréstimos para custear a energia mais cara das térmicas, foi o aumento de 46,14% autorizado pela Aneel para a tarifa de geração de Itaipu em 2015. Outra pressão deve vir do início da vigência do regime de bandeiras tarifárias. Na média do ano, a LCA avalia que a bandeira ficará amarela em todos os subsistemas, o que indica condições menos favoráveis para a geração de energia e implica adicional de R$ 1,50 para cada 100 quilowatt-hora (kWh) consumidos. No caso da gasolina, a projeção de aumento da consultoria pode ser cortada em função da queda do petróleo, que torna menos provável um reajuste da Petrobras. No entanto, considerando apenas que o governo voltará a cobrar a Contribuição de Intervenção do Domínio Econômico (Cide) sobre o combustível, e a alíquota deve ser de R$ 0,10 por litro, a gasolina teria alta de 3% no ano. Maurício Nakahodo, do banco de Tokyo-Mitsubishi UFJ, não trabalha com correção da gasolina aos distribuidores em sua estimativa de alta de 6,5% para o IPCA de 2015, mas avalia que a tarifa de ônibus vai subir cerca de 10% no ano que vem, influenciada principalmente por reajuste na mesma intensidade em São Paulo, capital com maior peso no IPCA entre as 13 cidades pesquisadas pelo IBGE. Como a capital paulista ficou por quatro anos sem elevar o preço do transporte público, Nakahodo afirma que o ajuste tende a continuar nos próximos anos. Outra decisão do governo que terá impacto no IPCA é a recomposição do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). Para Elson Teles, do Itaú Unibanco, o IPI para carros 1.0, atualmente em 4%, vai retornar à alíquota original, de 7%, no início do ano, o que adicionará cerca de 0,1 ponto percentual ao indicador oficial de inflação. Nas estimativas do Itaú, a inflação oficial será de 6,5% em 2015. Priscilla Burity, do banco Brasil Plural, lembra que as tarifas de água e esgoto também vão pressionar a inflação no ano que vem. O programa de descontos da Sabesp para consumidores que economizarem água será estendido, diz o economista, mas não terá efeito deflacionário como ocorreu neste ano, dado que os preços ficarão no mesmo patamar. Em suas estimativas, depois de recuar 4,8% em 2014, a taxa de água e esgoto vai aumentar 6,6% no próximo ano. Em sentido contrário à aceleração das tarifas públicas, é consenso entre os analistas ouvidos que os serviços vão, finalmente, responder à perda de fôlego da economia, ainda que de forma comedida. Adriana Molinari, da Tendências Consultoria, estima que a inflação do grupo que reúne preços como aluguel, cabeleireiro e empregada doméstica vai ceder um ponto percentual entre 2014 e 2015, para 7,3%, o que deve ajudar a "inflação cheia" a encerrar o ano ligeiramente abaixo do teto da meta, em 6,4%. Adriana afirma que a expansão menor da renda real e das ocupações joga contra uma inflação do setor entre 8% e 9%, assim como os efeitos do ciclo de aperto monetário e do ajuste fiscal. De qualquer forma, ela ressalta que a alta prevista de 7,3% ainda é um nível elevado. Além da inércia e da indexação, que impedem descompressão mais relevante desses preços, a economista aponta que a permanência da taxa de desemprego em patamar baixo ainda representa uma pressão de custo para o setor, que é intensivo em mão de obra. Priscilla, do Plural, acrescenta que o salário mínimo é um formador de preços importante para o setor de serviços, e terá alta real de 2,5% no ano que vem, o que, em termos nominais, representa elevação de quase 9%. "O aumento vai acabar contrabalançando o efeito da desaceleração da economia", diz ela, que espera avanço de 7% para o IPCA em 2015. O Plural não faz estimativas para a inflação do setor, mas avalia que a variação dos preços livres, onde estão inseridos os serviços, será de 6,4% no próximo ano, 0,5 ponto abaixo do esperado para 2014. Ainda dentro dos preços livres, o cenário de commodities em baixa deve trazer alívio para os cotações de alimentação e bebidas, observa Romão, da LCA, que projeta alta de 6,9% para essa parte da inflação no próximo ano. Para 2014, a expectativa é de 6,9%. "Dificilmente teremos um ano tão complicado como este para os alimentos", diz o economista, lembrando os efeitos da estiagem ocorrida no início do ano sobre esses preços. Por outro lado, a depreciação cambial prevista para 2015 pode reduzir a folga dada pelas commodities. Teles, do Itaú, calcula que cada 10% de desvalorização do real adiciona 0,7 ponto percentual ao IPCA num horizonte de cerca de 12 meses. O economista avalia, porém, que o repasse pode ser mais fraco em um cenário de desaquecimento da demanda. Para o banco, o dólar encerrará 2015 cotado a R$ 2,80, acima da taxa de câmbio prevista para o fim deste ano, de R$ 2,60.

 

 

Transporte público será o fiel da balança das tarifas

Com um outro reajuste da gasolina nas refinarias cada vez menos provável e a expectativa de que a alta da energia elétrica residencial chegue a cerca de 20% em 2015, a grande dúvida em relação à correção de tarifas represadas está concentrada no item ônibus urbano. Caso a prefeitura de São Paulo, que não eleva os preços de transporte público desde 2011, conceda aumento compatível com a reposição de custos, a inflação de preços administrados pode chegar a 9% no próximo ano, segundo economistas ouvidos pelo Valor.

Levando em conta a afirmação do diretor financeiro da SPTrans, Denilson Ferreira, de que a empresa responsável pelo transporte público municipal na capital paulista não prevê aumento da tarifa de ônibus em 2015, a LCA avalia que estes preços não serão reajustados pelo quinto ano seguido. O economista Fabio Romão também menciona as manifestações de junho de 2013 como outro indicativo de que as tarifas não devem subir em São Paulo.

Um estudo da SPTrans divulgado depois da declaração de Ferreira na Câmara Municipal, por outro lado, indica que a tarifa poderia subir dos atuais R$ 3 para R$ 3,40 ou R$ 3,50, embora o valor de R$ 3,75 seja o necessário para repor a inflação acumulada e eliminar o subsídio pago pela prefeitura. Considerando que o ônibus em São Paulo aumente para R$ 3,50 - o que representaria alta de quase 17% - o economista Étore Sanchez, da LCA, calcula que os preços administrados aumentariam 9,1% em 2015. Com isso, o IPCA subiria 6,88%.

Em sua previsão de alta de 4% para o item ônibus urbano em 2015, a LCA espera aumentos em Brasília, Goiânia, Fortaleza, Recife, Salvador, Belo Horizonte e Rio. Em 2014, sete das 13 capitais pesquisadas pelo IBGE corrigiram suas tarifas. As cidades que não a elevaram, além de São Paulo, foram Brasília, Vitória, Fortaleza, Recife e Salvador.

Para Fernando Rocha, sócio da JGP Gestão de Recursos, seria necessário aumento de 20% no preço do ônibus urbano em São Paulo para eliminar a defasagem acumulada. Rocha avalia que esse reajuste será dividido entre 2015 e 2016. Na média, o economista prevê que a tarifa de transporte público ficará 7,4% mais cara no IPCA do próximo ano.

Segundo Rocha, com esse percentual de aumento, a inflação represada de preços administrados seria de apenas 0,35 ponto percentual ao fim do ano que vem, considerando os reajustes ainda necessários em transporte público e a recomposição total da Cide sobre combustíveis. O economista lembra que, no meio do ano, quando a defasagem entre os preços internos e externos da gasolina superou 20%, sua estimativa para a inflação reprimida de preços monitorados chegou a 1,5 ponto. "O reajuste de 8% da gasolina na refinaria sumiu", explica.

Adriana Molinari, da Tendências, também não trabalha com aumento de combustíveis nas refinarias em 2015, mas destaca que as projeções para a variação dos preços de transporte público no ano que vem são arriscadas devido ao fator político, porque dependem da decisão das prefeituras. Como, no entanto, 2016 será ano de eleições municipais - quando, normalmente, essas tarifas não são reajustadas - a ausência de aumento em 2015 pressionaria ainda mais os custos do setor, diz, já que, no ano seguinte, se completariam cinco anos sem correção de preços em algumas capitais.

Por isso, Adriana trabalha com alta média de 8,8% para o item ônibus urbano em 2015, considerando que, na capital paulista, a tarifa de transporte público deve subir cerca de 10%, para R$ 3,30, ou R$ 3,40, conforme indica o estudo da SPTrans. "Com os custos crescentes do setor de transporte público, tendo em vista os reajustes salariais e de combustíveis, acho difícil as prefeituras não efetuarem aumento em 2015", afirma a economista, que prevê avanço de 8,8% dos preços administrados no exercício.

No caso da energia elétrica, o economista Maurício Nakahodo, do banco de Tokyo-Mitsubishi UFJ, afirma que a alta prevista de 20% na tarifa residencial para o próximo ano já cobre boa parte da defasagem acumulada por este preço. Sanchez, da LCA, estima que, após correção de 20,9% das contas de luz em 2015, os pagamentos de empréstimos feitos pelo setor para cobrir os custos com as usinas térmicas embutem um reajuste de cerca de 4% ao ano nas tarifas até 2019. Já para Rocha, da JGP, a alta de 23,8% prevista para as contas de luz no próximo ano já será suficiente para zerar a defasagem desse item.