Ao decretar a quebra de sigilo bancário e fiscal da JD Assessoria e Consultoria, que pertence ao ex-ministro da Casa Civil José Dirceu (PT), a juíza federal Gabriela Hardt levantou a suspeita de que a empresa tenha recebido cerca de R$ 4 milhões de empreiteiras investigadas na Operação Lava-Jato por serviços nunca prestados. Ela argumenta que o modelo de negócio é semelhante ao usado pelo doleiro Alberto Youseff para desviar dinheiro de contratos da Petrobras, "através de empresas de fachada".

No despacho, Hardt ressalta que a empresa de Dirceu recebeu, a título de consultoria, R$ 3,7 milhões das construtoras UTC, OAS e Galvão Engenharia, investigadas "justamente pelo pagamento de serviços de consultoria fictícios a empresas diversas para viabilizar a distribuição de recursos espoliados do poder público".

A possível ligação da empresa de Dirceu com as irregularidades investigadas na operação Lava-Jato vieram à tona com a quebra dos sigilos fiscais e bancários das empreiteiras. Documentos da Receita Federal, além de revelar repasses às empresas de fachadas controladas por Youssef, mostraram os pagamentos a Dirceu entre 2009 e 2013.

Juíza quer identificar novos pagamentos

A empresa de Dirceu e do irmão recebeu R$ 720 mil da OAS, entre janeiro de 2010 e dezembro de 2011. Também ganhou R$ 725 mil da Galvão Engenharia entre 2009 e 2011, e mais R$ 2,3 milhões da UTC, nos anos de 2012 e 2013.

Para revelar todos os pagamentos feitos a Dirceu, e investigar se os serviços foram efetivamente prestados, Gabriela Hardt, juíza substituta da 13ª Vara Federal de Curitiba, decretou a quebra dos sigilos da JD.

Depois que saiu do governo, Dirceu tentou viver de palestras. Mas, diante da repercussão negativa na imprensa dos eventos que fazia em instituições financeiras, desistiu. E, em 2009, começou a atuar com a JD Assessoria e Consultoria.

A assessoria de Dirceu negou "veementemente que a JD seja uma empresa de fachada" e afirmou ter como comprovar as viagens e os negócios feitos pelo ex-ministro. Diz ainda que, na semana que vem, divulgará um balanço de suas atividades. Dirceu ainda não constituiu advogado para defendê-lo no Lava-Jato porque seu defensor no mensalão, José Luis de Oliveira Lima, já advoga para Galvão Engenharia no mesmo processo.

Segundo pessoas ligadas a Dirceu, o ex-ministro passou a intermediar encontros entre autoridades estrangeiras e empresas brasileiras que pretendiam fazer negócio no exterior. Costumava fazer levantamentos de conjuntura política, jurídica e econômica dos países em que os empresários pretendiam investir.

Para construir relações no exterior, o ex-ministro se utilizava suas antigas relações do período de militância de esquerda. Segundo pessoas próximas ao ex-ministro, sua função era "abrir portas". No caso do contrato com a UTC Engenharia, o trabalho de Dirceu foi, de acordo com a assessoria dele, "prospectar negócios na Espanha e no Peru". Já OAS e Galvão Engenharia tinham interesses em países da América Latina.

Até a prisão do ex-ministro, a JD funcionava em uma casa com cinco salas comercias na Avenida Ibirapuera, em São Paulo. Ali trabalhariam entre 8 e 10 funcionários, e o faturamento médio seria de R$ 200 mil mensais, segundo pessoas próximas ao ex-ministro. Quando Dirceu foi preso, o irmão Luiz Eduardo cumpriu os contratos que ainda estavam vigentes, mas não teria firmado novos contratos. De acordo com a assessoria de Dirceu, a JD é hoje "praticamente inoperante".

Dirceu foi condenado a sete anos e 11 meses de prisão por comandar o mensalão, esquema de compra de apoio político pelo governo Lula por meio de desvio de recursos públicos. A revelação dos pagamento a Dirceu e a acusação de empreiteiras de que o dinheiro desviado agora da Petrobras eram usados para cooptar aliados suscitaram ontem comparações entre os dois escândalos (veja quadro acima).

A oposição decidiu acelerar a mobilização para a criação de uma nova CPI da Petrobras, diante das declarações do vice-presidente da Engefix Engenharia, Gerson de Mello Almada. O executivo afirmou, em sua defesa entregue à Justiça, que os desvios da petroleira serviam para alimentar o esquema montado pelo PT para comprar apoio no Congresso Nacional.

O líder do DEM na Câmara, deputado Mendonça Filho (PE), disse que o depoimento reforça a necessidade de nova CPI e que o petrolão é a segunda fase do escândalo do mensalão.

- É um quadro cada vez complicado para o governo. Os fatos são gravíssimos e corroboram todo o enredo do mensalão, que também era desvio de recursos para alimentar a base ou parte da base parlamentar. É o mensalão 2, o retorno - ironizou Mendonça Filho.

O líder do PSDB no Senado, Aloysio Nunes Ferreira (SP), disse que os depoimentos vêm comprovando a estratégia adotada pelo PT para manutenção do poder. O tucano disse que a presidente Dilma Rousseff já participava do governo Lula e agora comanda o país.

- É a menção de uma estratégia para conquista e preservação do poder que o PT vem aplicando desde Lula, com o qual a presidente conviveu alegremente. Há a degradação do bem público em proveito de um projeto - disse Aloysio.

Do lado governista, o deputado Paulo Teixeira (PT-SP) disse que é preciso aguardar a posição oficial do Ministério Público quanto à Petrobras. Ele disse que é necessário ter cautela, porque os acusados têm diferentes estratégias de defesa.

- Ele (Almada) terá que provar isso. Eles devem ter muitas estratégias de defesa, e isso pode ser uma estratégia de defesa - disse Teixeira.