A presidente Dilma Rousseff admitiu ontem, durante café da manhã de fim de ano com os jornalistas, a possibilidade de abrir o capital da Caixa Econômica Federal, um dos principais bancos públicos brasileiros, responsável pela mais expressiva cota de financiamento imobiliário do país, pelos recursos destinados ao Minha Casa, Minha Vida e pelo pagamento do Bolsa Família. "Eu vou (abrir o capital), mas vai demorar", afirmou ela, ao término do encontro, durante sessão de fotos com os jornalistas. 

A abertura de capital - venda de ações na bolsa em um processo batizado de IPO (Initial Public Offering ou Oferta Pública Inicial, em português) - só ocorreria em 2016, pois, antes, a CEF precisaria passar por um processo de saneamento interno, segundo o jornal Folha de S.Paulo. Se a medida realmente for efetivada, a Caixa seguirá o caminho trilhado pelo Banco do Brasil, que já é um banco de economia mista. 

Com o capital aberto, a Caixa teria uma transparência maior e poderia passar por um processo melhor de governança interno. Durante o governo do PT, o banco teve pelo menos dois grandes momentos de questionamento ético. O primeiro em 2006, quando foi violado o sigilo bancário do caseiro Francenildo dos Santos Costa. E mais recentemente, quando uma onda de boatos provocou uma corrida de cadastrados no Bolsa Família às agências da CEF para sacar o benefício. 

Procurada pelo Correio, a Caixa evitou comentar o assunto. De acordo com fontes do governo, a ideia de abertura do capital do banco público foi dada pela atual equipe econômica, liderada pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, que será substituído por Joaquim Levy, o que renderia dividendos para o Tesouro Nacional. 

Se pretende abrir o capital da CEF em 2016, o governo - e mais precisamente a atual equipe econômica - também estuda reformulações no Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Ao longo dos últimos anos, o BNDES foi fundamental no financiamento de praticamente todos os setores econômicos, desde as grandes obras de infraestrutura do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) até indústrias do setor alimentício, como a JBS Friboi. 

Na semana passada, a coluna Brasília-DF já havia divulgado um desabafo de Joaquim Levy a interlocutores petistas, segundo o qual "as pessoas estavam acostumadas a viver penduradas no cheque especial", numa alusão às generosas taxas subsidiadas de empréstimos do BNDES, a juros baixos e prazo longo para quitação. 

Ontem, a presidente Dilma reforçou a necessidade de mudanças. "Precisamos ter uma participação maior dos bancos privados nos processos de financiamento de longo prazo. O país não aguenta esse processo concentrado todo nos bancos públicos." Apesar de todas as sinalizações de mudanças, a presidente afirmou que só anunciará o nome dos presidentes dos bancos públicos no ano que vem, após a posse dos novos ministros. E não aceitará indicações políticas para os cargos. 

Ceticismo no mercado

Ao anunciar ontem que pretende abrir o capital da Caixa Econômica Federal, mas sem precisar exatamente quando, a presidente Dilma Rousseff não animou o mercado, que prefere esperar para ver se essa medida realmente vai se concretizar. Em meio ao escândalo de corrupção na Petrobras, um dos papéis com maior liquidez na Bolsa de Valores de São Paulo, especialistas demonstraram ceticismo porque o momento atual não é propício para que uma empresa faça um IPO (sigla do inglês Initial Public Offering). "O mercado ficou meio cético em relação a essa informação. O governo não detalhou a operação, e o quadro atual da bolsa está muito complicado para esse tipo de anúncio. Ninguém está fazendo IPO no momento porque o mercado está muito instável", disse uma fonte do mercado financeiro. 

O economista-chefe da Gradual Investimentos, André Perfeito, acredita que o anúncio possa ser uma sinalização positiva de Dilma para tentar melhorar a área fiscal, apesar de a nova equipe econômica ainda não ter detalhado o tamanho do ajuste que será feito em 2015. "Tentar capitalizar a Caixa quando se sabe que o Tesouro Nacional não vai poder continuar fazendo aportes nos bancos públicos é um sinal de que o aperto fiscal será para valer", explicou. Na avaliação de Perfeito, a Caixa tem atributos interessantes e uma carteira de clientes desejável e despertaria o interesse de investidores. "Mas o momento atual não é propício. O mercado não está bom. Acredito que esse IPO poderia ser feito a partir do segundo semestre de 2015", apostou. "O importante é esperar condições mais favoráveis e esperar que a bolsa volte a subir para fazer a oferta de ações", afirmou. 

No entanto, ele teme que o governo faça como fez com a abertura de capital da Petrobras, e não abra mão do controle societário para continuar viabilizando os programas de inclusão social financiados pela Caixa. "Isso poderá afugentar os investidores mais desconfiados", disse Perfeito.