O Nordeste concentra nove em cada dez municípios do país que estão com decretos de situação de emergência em vigor atualmente, segundo a Secretaria Nacional de Proteção e Defesa Civil. Em toda a região, cerca de 15,8 milhões de pessoas sofrem com os efeitos da estiagem que, segundo meteorologistas, começou em 2012 e já no ano seguinte foi considerada a pior dos últimos 50 anos pela Organização Meteorológica Mundial.

A situação tende a se agravar nos próximos meses. Até abril, as chuvas na região devem ficar abaixo da média histórica, segundo relatório divulgado esta semana pelo Centro de Previsão do Tempo e Estudos Climáticos (CPTEC), do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Em maio, já deve ter início a estação seca, com reservatórios quase sem água.

No Ceará, 130 açudes do estado estão operando com menos de 10% da sua capacidade. No geral, o estado tem disponível 20% de toda a possibilidade de armazenamento, segundo a Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos (Cogerh). Até agora, só oito cidades cearenses não decretaram situação de emergência.

O nível do açude que abastece as cidades de Acari e Currais Novos, no Rio Grande do Norte, está em 2%, e a previsão é que o reservatório seque em dois meses, segundo José Procópio de Lucena, presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Piancó-Piranhas-Açu. A bacia abastece 1,3 milhão de pessoas em 147 cidades do Rio Grande do Norte e da Paraíba.

— Os reservatórios de pequeno e médio porte já secaram todos. Os reservatórios maiores estão com 20%, quando eram para estar com 50% nessa época do ano — disse Procópio.

Segundo Procópio, cidades da bacia hidrográfica estão sendo abastecidas com caminhão-pipa, prefeituras estão estimulando a perfuração de poços artesianos e os agricultores são orientados a fazer irrigação à noite para evitar a perda da água por evaporação.

PA Neópolis (SE) 13/08/2014 - Especial Rio São Francisco - A seca na região Sudeste atinge as principais bacias hidrográficas do país, onde moram 40 milhões de pessoas, o equivalente a 20% da população brasileira, e impõe ao Brasil a rediscussão da gestão das águas. O levantamento das bacias foram feitos pela ANA a pedido do Globo. As bacias mais afetadas, em maior ou menor grau, são a dos Rio São Francisco (cerca de 16 milhões de pessoas, 504 municipios). O grande problema está em Minas Gerais: o estado reúne as principais nascentes que alimentam essas bacias. Em todas, a chuva ficou pelo menos metade abaixo da média. No caso do São Francisco, cerca de 70% da água que corre nele vem de Minas. No municipio de Neópolis, Sergipe, embarcação precisa fazer manobra para desviar do banco de areia no meio do Rio São Francisco. Foto Michel Filho/Agência O Globo - Michel Filho / Agência O Globo

Em algumas das cerca de 500 cidades banhadas pelo rio São Francisco, a seca vem acompanhada de outros problemas, como agravamento da pobreza, desmatamento e erosão, segundo o presidente do comitê da bacia hidrográfica local, Anivaldo Miranda. Segundo ele, comunidades ribeirinhas são as que mais sofrem:

— Essa seca atual no Nordeste chegou ao terceiro ano consecutivo e até hoje o poder público não foi capaz de criar estratégias eficientes para combater esse problema. Parece que falar em racionamento é dizer um palavrão, mas não é. É uma chave de segurança.

Caso o nível das represas continue caindo, será preciso garantir o uso da água do São Francisco para consumo humano, diz Miranda:

— Hoje, já temos um conflito com geração de energia e há outro conflito em potencial com a agricultura de exportação.

BRASIL DESPERDIÇA CERCA DE 37% DE ÁGUA TRATADA

O Brasil perde cerca de 37% da água tratada, segundo relatório feito com base em dados de 2013 do Sistema Nacional de Informações do Ministério das Cidades. O desperdício é causado por vazamentos nos canos de distribuição, defeitos na rede, fraudes e ligações clandestinas. O relatório também mostrou que o brasileiro gasta, em média, 166,3 litros de água por dia, acima do recomendado pela Organização Mundial da Saúde: 110 litros.

Os estados que mais desperdiçam água potável ficam na Região Norte: Amapá, com 76,5%, e Roraima, 59,7%. Estados do Nordeste, que são afetados pela seca, também aparecem na lista: Sergipe perde 59,3% e Rio Grande do Norte, 55,3%. As menores perdas em 2013 foram registradas em Goiás (28,8%) e no Distrito Federal (27,3%).

Em São Paulo, a Sabesp informou que seu índice de perda foi de 31,2% em 2013, menos que os 34,3% que aparecem no relatório do Ministério das Cidades. Segundo a companhia de saneamento paulista, a perda com vazamentos em 2014 foi de 19,5% do volume produzido. Outros 10,5% foram perdidos por fraudes. A Sabesp afirma investir R$ 1,45 bilhão no programa de redução de perdas desde 2009, o que fez o índice recuar 10 pontos. Outros R$ 3 bilhões ainda devem ser investidos.

O índice de perda no Brasil é considerado alto por especialistas em gestão de recursos hídricos. Na Inglaterra, a média é de 20% de perda nos canos. No Japão, a taxa é de 3%.