Pela primeira vez nos últimos cinco anos, a Receita Federal admite que, entre os muitos dados negativos da economia em 2014, a arrecadação de impostos e contribuições para os cofres da União está muito perto de fechar o ano com queda real (já descontada a inflação). Em outras circunstâncias, seria algo a comemorar, ou seja, o governo teria amenizado sua fúria arrecadadora para liberar mais renda para as pessoas e mais capital de giro para os negócios. Mas a história é bem outra e, na atual maré baixa brasileira, isso tem más consequências. 

O sinal vermelho foi dado em novembro, quando a arrecadação teve queda real de 12,8% em relação a novembro de 2013. No ano passado, houve um recolhimento recorde de impostos atrasados em razão de uma grande adesão de empresas ao Refis, programa de refinanciamento de débitos com a Receita. Este ano, o Refis ajudou pouco e a realidade da economia quase estagnada bateu nas contas do governo. Para dezembro, não se espera nada melhor, daí a expectativa pessimista para o encerramento do ano. 

É o que ajuda a explicar as tumultuadas sessões do Congresso Nacional para aprovar, semanas atrás, uma inédita autorização para o governo deixar de cumprir a meta de superavit fiscal. É que, mesmo sabendo que a economia vinha perdendo ritmo ao longo do ano, o governo manteve e até aumentou seus gastos. No terceiro trimestre, quando a arrecadação já dava sinais de fadiga, o gasto público subiu 1,3% em relação ao trimestre anterior. O calendário eleitoral falou mais forte e, em vez de economia de verbas para reduzir a dívida pública, o que o governo Dilma produziu, em seu quarto ano, foi deficit primário de cerca de R$ 10 bilhões. 

Aos menos acostumados a acompanhar os dados da economia e, principalmente, da gestão do dinheiro público, tudo isso parece distante do dia a dia das pessoas. Enquanto as contas do governo se deterioravam, muitos acreditaram no discurso de que tudo estava sob controle e que tudo mais era jogo da oposição. Tem até economista e gente do governo que ainda discorda da necessidade de um ajuste fiscal e um aperto monetário para recolocar as coisas no lugar. 

Mas é exatamente isso que terá de acontecer em 2015 e 2016, para que a economia retome o crescimento e a arrecadação volte a bancar a expansão dos programas sociais. Mas é bom que fique claro que as trapalhadas ditadas pelo voluntarismo e os fazedores de mágica na condução da política econômica nos últimos anos tornaram tudo mais difícil. 

O pior é que o controle severo do gasto público não virá sozinho. A leniência com a inflação também continuará cobrando preço alto em 2015, sob a forma de taxa básica de juros elevada. O Banco Central já não perde mais tempo com rodeios: no Relatório de Inflação divulgado terça-feira, o BC avisa que ninguém deve esperar política monetária frouxa antes do fim de 2016, quando, se tudo der certo, a inflação cairá para os prometidos 4,5% ao ano. 

O enredo da novela 2015/2016 sugere, então, que será mais honesto o governo assumir que vai aplicar remédio amargo porque errou. Assim, terá mais chance de ser compreendido e de convencer o cidadão, que é quem vai pagar a conta, de que o sacrifício é indispensável, mas valerá a pena.