A decisão da Petrobrás de bloquear a entrada de 23 empresas em novas licitações, por um suposto cartel formado por elas, deverá ampliar a participação de companhias estrangeiras na estatal. Com a maioria das construtoras nacionais (incluindo as cinco maiores do ranking: Odebrecht, Andrade Gutierrez, OAS, Camargo Corrêa e Queiroz Galvão) proibidas de participar dos processos licitatórios, uma alternativa pode ser a de recorrer ao mercado externo, reconhece a empresa.

 

 

Diante das inúmeras implicações da Operação Lava Jato, entre elas a dificuldade de se financiar, o volume de investimentos em novos projetos da estatal em 2015 tende a ser revisto. Isso significa que pode haver redução nas contratações e licitações. Segundo a Petrobrás, o bloqueio não deverá afetar os contratos já existentes. Mas fontes ouvidas pelo Broadcast, serviço em tempo real da Agência Estado, indicaram que a companhia não descarta entrar com ações judiciais para rescindir acordos com as empresas que comprovadamente tenham superfaturado os contratos ainda em vigor. 
 
“A Petrobrás não tinha outra alternativa diante do cenário delicado em que vive, sem saber até onde vai a Lava Jato, sem saber o resultado das ações nos Estados Unidos e sem saber se a Price (PricewaterhouseCoopers) assinará ou não o balanço. Ela tinha de tomar essa atitude (de bloquear contratos) para melhorar seu nível de governança”, afirma o diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), Adriano Pires. 

 

 

Segundo ele, se quiser fazer alguma contratação no ano que vem, a estatal terá de encontrar outras empresas no mercado. “Mas o governo precisará aprimorar regras para atrair construtoras americanas, europeias e chinesas.” Isso inclui rever a atual política de conteúdo local, diz o executivo. Em nota enviada ao Estado, a Petrobrás disse que pode eventualmente contratar empresas estrangeiras e buscará alternativas caso a questão do conteúdo local seja um empecilho. 

 

 

“A Petrobrás buscará fornecedores de bens e serviços de forma a garantir procedimentos competitivos, visando contratar as melhores condições para a companhia. Isso poderá, eventualmente, envolver empresas estrangeiras. Quanto ao conteúdo local, caso se constate algum obstáculo ao cumprimento das metas, a Petrobrás buscará alternativas para a solução da questão.” 

 

 

O diretor de pesquisa econômica da GO Associados, Fabio Silveira, também entende que a decisão da estatal foi a mais acertada para o atual cenário. “Ela precisava fazer isso para reconstruir a sua imagem em um momento em que está sendo processada no exterior. O melhor que ela tinha a fazer é se afastar dos grupos que estão no centro das denúncias de corrupção.” Para Silveira, a exclusão dos fornecedores de novas licitações pode trazer uma parada temporária nos investimentos da estatal, mas o quadro pode ser recomposto com fornecedores estrangeiros. 

 

 

A Petrobrás afirmou que o bloqueio às licitações em andamento ocorrerá enquanto estiverem em curso procedimentos administrativos com vistas à eventual aplicação de sanções. “O bloqueio cautelar não se confunde com a sanção definitiva, mas tem por finalidade resguardar a companhia e suas parceiras de danos de difícil reparação financeira e de prejuízos à imagem da Petrobrás”, diz a companhia no comunicado.

 

 

Defesa. Muitas das construtoras, em nota, disseram que já apresentaram ou vão apresentar suas defesas nos processos administrativos movidos pela Petrobrás. Foi o caso das grandes construtoras como Odebrecht, Camargo Corrêa e Andrade Gutierrez. A Odebrecht e Andrade negaram veementemente qualquer formação de cartel. 

 

 

As grandes do setor são menos dependentes da Petrobrás. A construtora da Odebrecht, por exemplo, tem hoje mais de 70% de seus contratos firmados no exterior. Do total de receita do grupo, a estatal representa 0,7%. Na Camargo, sua construtora tem 6% de receita com contratos da Petrobrás. A Andrade não quis informar. A Galvão Engenharia tem R$ 48 bilhões a receber no mercado, sendo apenas R$ 900 milhões da Petrobrás. Procurada, a empresa não quis se pronunciar.
 
Na opinião de Adriano Pires, as construtoras nacionais terão de se recriar depois da Operação Lava Jato. A perda da Petrobrás como cliente pode ser um baque financeiro para algumas construtoras médias e pequenas, que ainda são altamente dependente dos contratos com a estatal. Segundo fontes, a Iesa, por exemplo, tem quase 100% da sua receita vinda de contratos com a estatal. A Jaraguá Equipamentos, cita 10 “cases” no seu site oficial, sete deles relacionados a obras da Petrobrás. As duas companhias estão em recuperação judicial. 

 

 

A UTC Participações vem diversificando seu negócio, mas a Petrobrás ainda é de longe o seu maior cliente, segundo demonstrações financeiras da empresa de 2013. No fim do ano passado, a estatal somava R$ 767 milhões em direitos a faturar da UTC Engenharia, 96% do total da carteira informada, e 69% do total da carteira da UTC Participações, que reúne outros negócios do grupo, como concessão de aeroportos. 

 

 

O anúncio da Petrobrás, na noite de segunda-feira, surpreendeu as empresas envolvidas. A Alumini Engenharia (antiga Alusa Engenharia) disse, em nota, que se trata de um lamentável prejulgamento. A Construcap também negou envolvimento em suposto cartel e disse que tomará providências.

 

 

Estado não localizou representantes da Jaraguá Engenharia, Skanska, Techint, Egesa, Fidens e GDK. Mendes Júnior, Engevix, OAS, UTC, Iesa e Carioca não se pronunciaram. A Tomé Engenharia disse não ter porta-voz para comentar a questão nesta terça-feira. 

 

 

Já a MPE, Promon Engenharia e a Queiroz Galvão afirmaram que não foram comunicadas oficialmente pela Petrobrás da decisão. Promon e Queiroz afirmaram ainda em nota que seguem a ética e a legislação. A Toyo Setal ressaltou que não foi citada na lista da Petrobrás, mas sim a Setal, empresa que fez uma joint venture com a japonesa Toyo em 2012 e formou a Toyo Setal. Questionada, a empresa não respondeu se os antigos acionistas da Setal fazem parte do grupo.
 
 

Fundo Petros passará por investigação de auditores

 
 

O fundo de pensão dos funcionários da Petrobrás (Petros) passará por uma investigação interna nos moldes da que está sendo feita com aPetrobrás por causa das denúncias oriundas da operação Lava Jato.

Isso significa que os auditores independentes contratados pela empresa farão uma devassa nos negócios do fundo para apurar se houve desvios ou operações indevidas nos R$ 66 bilhões de investimentos da fundação.

Segundo a empresa, a decisão foi tomada porque se encontrou uma possível relação entre os fatos investigados na estatal e seu fundo de pensão. Nota enviada pelo Petros informa que, apesar de o fundo não ser subsidiária da companhia, "faz parte do balanço da Petrobrás e, por isso, a estatal solicitou ao Conselho Deliberativo da Petros que a inspeção também fosse estendida ao fundo de pensão".

Assim como outras empresas subsidiárias da Petrobrás, o Petros também é alvo da operação da Polícia Federal e deve estar incluído nas próximas fases da Lava Jato.

Em outubro, o Estado noticiou que ex-dirigentes da fundação fizeram pelo menos um negócio com empresas do ex-deputado federal José Janene (PP-PR), morto em 2010, e do doleiro Alberto Youssef, que teria causado R$ 13 milhões de prejuízo ao fundo.

A investigação interna começou no fundo no dia 19/12 e está sendo feita pelos escritórios Trench, Rossi e Watanabe Advogados e o americano Gibson, Dunn & Crutcher LLP, os mesmos que estão apurando as irregularidades na Petrobrás.

Segundo um advogado que acompanha investigações como essas, mas não quis se identificar, todos os investimentos do fundo deverão ser analisados.

Banco BVA - Algumas possíveis irregularidades da fundação têm sido apontadas em processos judiciais e administrativos mesmo fora do âmbito da Lava Jato.

Neste ano, por exemplo, o Banco Central entregou à Justiça relatório de liquidação do banco BVA em que sugere que houve "conluio" de funcionários do Petros com empréstimos irregulares feitos pelo falido banco BVA.

Quatro gestores teriam sido autores de possíveis crimes de gestão fraudulenta em empréstimos de R$ 100 milhões a uma empresa que pertencia a ex-diretores do BVA.

As perdas com o banco foram bem significativas para a fundação, que tinha cerca de R$ 1 bilhão em negócios gerados pela instituição. Foi a partir do BVA também que a fundação se tornou sócia da Multiner, que pertencia então ao ex-dono do banco, e está em dificuldades.

O Petros também é sócio da Sete Brasil, empresa criada para atender às demandas da Petrobrás no pré-sal e com quem possui R$ 22 bilhões em contratos.

A Sete está com dificuldades de se financiar, pois a Petrobrás quer rever o valor dos contratos que eram geridos pelo ex-gerente executivo da estatal, Pedro Barusco Filho, que se tornou um dos delatores da Lava Jato.