Título: Danilovich e a conduta dos distritais
Autor:
Fonte: Correio Braziliense, 02/07/2011, Opinião, p. 20

Uma das obrigações cruciais do agente diplomático com estatura de embaixador é emitir relatórios ao Estado que representa com análise sobre a realidade do país para onde foi destacado. Não está adstrito a trivialidades burocráticas ou à reprodução literal de fatos que lhe chegam ao conhecimento. Cabe-lhe, acima de tudo, observar o panorama com as lentes da avaliação crítica, seja para exaltá-lo, seja para anotar anomalias. Não fez outra coisa o então embaixador dos Estados Unidos Jonh Danilovich (2004-2005) ao descrever a Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF), em mensagem ao Departamento de Estado, como "um refúgio para canalhas".

Seria exercício inútil e descabido opor reações inflamadas à conduta do diplomata norte-americano. Ele expendeu opinião pessoal resguardada no contexto das atividades inerentes ao cargo. Trata-se de visão respaldada no envolvimento do Legislativo do DF em escândalos recorrentes e na inércia rotineira dos deputados. É notório que, de regra, os distritais só se mostram ativos e diligentes quando se reúnem para aprovar projetos em causa própria, entre muitos, os que lhes aumentam a remuneração, as vantagens financeiras, as verbas de gabinete e outros privilégios.

O desabafo do embaixador consta de missiva intitulada "Um trapaceiro a menos na galeria". Referia-se à cassação, em 2004, do mandato do deputato Carlos Xavier, depois de denunciado ao Tribunal do Júri por assassinato. O caso, segundo ele, despertou "nervosismo" em políticos do DF. Diz que a decretação da perda do mandato por quórum mínimo deu-se porque "alguns deputados estavam provavelmente preocupados com a criação de precedente", que poderia abrir caminho para punição de outros. Corrupção, grilagem de terra, fraudes, desvios de recursos, baixa qualidade dos trabalhos são apontados por Danilovich como o cenário cotidiano da Câmara. Arremata o informe com declaração de que há "meia dúzia de deputados suspeitos de vários crimes".

Os termos do despacho remetido há sete anos ao governo norte-americano surgiram no site Publica, que, há pouco, firmou parceria com o editor do WikiLeaks, Julian Assange, responsável pela divulgação de milhões de documentos secretos de Washington. Os EUA amargaram, e ainda amargam, situação constrangedora perante países amigos atingidos por revelações desqualificantes.

Quanto às imagens desenhadas por Danilovich, é forçoso reconhecer que, a despeito da severidade usada, correspondem ao histórico de atitudes indecorosas da CLDF. Servem de advertência aos que, de tanto abusarem do poder de representação outorgado pelo povo, já expõem Brasília e o Brasil ao escárnio internacional.