A partir de janeiro de 2015, um novo capítulo começará na relação entre o governo e as montadoras. Depois de anos recebendo incentivos dos cofres públicos para incrementar a produção e a venda de carros, as empresas terão de se adaptar ao aumento do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). Sem caixa para honrar compromissos básicos, o Palácio do Planalto se deu conta de que não poderia mais abrir mão de quase R$ 2 bilhões por ano para estimular o consumo. A visão dentro do Ministério da Fazenda é de que, se não quiserem perder mercados ao aumentarem os preços, as fabricantes de veículos terão de se reinventar.
Não será um movimento fácil. De janeiro a novembro, mesmo com o IPI reduzido, a produção de carros recuou 15,5% e as exportações, 43,7%, em relação ao mesmo período de 2013. Para especialistas, esses números mostram que a indústria automobilística precisa depender menos do governo e se inserir na cadeia global de suprimentos. Mais de 20 marcas estão instaladas no país e o dilema principal delas é de que o boom do consumo interno da última década acabou e não há tantas vias nas grandes cidades para suportar a frota de pouco mais de 41 milhões de carros licenciados no país.
A determinação do governo é reduzir o protecionismo às montadoras no segundo mandato de Dilma Rousseff. A partir de janeiro, o IPI de carros populares passará de 3% para 7%. No caso dos carros mais potentes com motores flex, o tributo subirá de 9% para 11%, e, nos movido a gasolina, de 11% para 13%. "Agora, as empresas dependerão delas mesmas para conquistar os consumidores. A política de incentivo do governo se esgotou", diz o economista Irineu de Carvalho, do Itaú Unibanco. "Isso passa, inclusive, pela melhoria da qualidade dos veículos que chegam às ruas", acrescenta.
Desalento
Além do IPI maior, as montadoras estão se ressentindo da alta dos juros e da escassez de crédito, o que desanima os futuros compradores. "O consumidor está desalentado, vendo os juros subirem e a medo de perder o emprego crescer. A única motivação é a massa salarial, que ainda deve aumentar um pouco em 2015. Mas, para as vendas avançarem, as fabricantes terão de lançar modelos mais competitivos e a preços melhores", afirma Carvalho.
Os problemas não se resumem ao mercado interno. As exportações de veículos estão despencando porque a indústria é totalmente dependente do Mercosul, sobretudo da Argentina, que está vivendo uma gravíssima crise econômica. Portanto, reconhecem os especialistas, será necessário um salto qualitativo para sair do Mercosul e conquistar outros compradores no exterior. E o caminho passa pela redução de custos, pela ampliação da eficiência e pela absorção de novas tecnologias.
O México, por sinal, já deu esse passo. Tanto que está produzindo mais que o Brasil. Os mexicanos se integraram à cadeia global de suprimentos, coisa que o país não consegue devido à exigência do conteúdo local, que eleva os custo de produção. "A indústria automobilística brasileira tem um comportamento que precisa ser melhorado. Aprendeu que não é preciso apresentar produtos iguais aos que lança nos países de origem. Há o clone com o mesmo nome, estilo e defasagem tecnológica, na maioria das vezes", assinala Luiz Carlos Mello, diretor do Centro de Estudos Automotivos e ex-presidente da Ford do Brasil. "E todos os veículos custam bem mais caros", complementa.
Para o presidente da Associação Nacional de Veículos Automotores (Anfavea), Luiz Moan, a diferença entre os preços dos carros no Brasil e os lá de fora decorre do câmbio. "Quando o real está valorizado, os veículos ficam mais baratos no exterior", frisa. Não se pode esquecer ainda, no entender dele, que os modelos produzidos aqui são influenciados pelos elevados custos da mão de obra, pela pesada carga tributária e pelo sistema de distribuição, por meio de caminhões", diz. Ele garante que, apesar da queda nas vendas, o setor não está em crise e aposta que 2015 será melhor.