Delator: corrupção ocorre no "país inteiro"

Correio Braziliense - 03/12/2014

Em acareação com o ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró no Congresso, o homem-bomba Paulo Roberto Costa diz que os desvios da estatal também são feitos em rodovias, ferrovias, portos, aeroportos e hidrelétricas em obras

ÉTORE MEDEIROS
JOÃO VALADARES

Ameaçado de perder os benefícios da delação premiada, caso se pronunciasse diretamente sobre os detalhes do esquema de corrupção na Petrobras, o ex-diretor de Abastecimento Paulo Roberto Costa foi comedido durante acareação com o ex-diretor da área Internacional da estatal Nestor Cerveró. Falou pouco aos integrantes da CPI mista, mas revelou muito. Afirmou que “dezenas” de políticos estão envolvidos no escândalo e repetiu várias vezes que confirmava tudo o que informou à Justiça Federal. Segundo ele, “o que acontecia na Petrobras acontece no país inteiro”, incluindo obras como rodovias, ferrovias, portos, aeroportos e hidrelétricas.

Em troca de benefícios como a prisão domiciliar, explicou como os cofres da estatal foram usados sistematicamente para abastecer o caixa de partidos políticos. Cerveró, por sua vez, defendeu as mesmas posições de quando depôs à CPI mista, em setembro, negando conhecimento do esquema, apesar de ter sido beneficiado por ele, conforme Paulo Roberto Costa.

Mesmo admitindo ter participado do esquema criminoso, o ex-diretor de Abastecimento da estatal se disse “arrependido” e “enojado” com a corrupção na petrolífera. “O sonho de qualquer empregado da Petrobras é chegar a diretor, e quem sabe a presidente da companhia. Mas, desde o governo Sarney, o governo Collor, o governo Itamar, o governo Fernando Henrique — todos —, o governo Lula, o governo Dilma, todos os diretores da Petrobras e diretores de outras empresas, se não tivessem apoio político, não chegavam a diretor”, explicou. “Infelizmente, aceitei uma indicação política para assumir a diretoria de Abastecimento. Estou sofrendo isso na carne, fazendo minha família sofrer”, lamentou.

Sobre as denúncias já trazidas à tona sobre a Petrobras, ele ficou calado na maior parte do tempo. Os parlamentares se valeram de trechos já vazados do depoimento do ex-diretor para confrontar Nestor Cerveró, que comandava a área internacional da estatal na época da aquisição da refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos.

Segundo Costa contou à Justiça, a transação na qual o Tribunal de Contas da União (TCU) vê prejuízo de US$ 792 milhões à estatal serviu para abastecer cofres de partidos políticos e incluiu o pagamento de propinas para que pudesse se concretizar. O próprio Cerveró teria sido um dos beneficiados.

“Eu desconheço esse esquema e também desconheço qualquer esquema de propinas. (...) Por desconhecer, para mim não havia”, se defendeu Cerveró, que negou ter recebido propina. O ex-diretor confrontou ainda o trabalho de auditoria do TCU. “Pasadena foi um bom negócio, dentro do planejamento estratégico da Petrobras na época. A avaliação dos auditores do TCU contém alguns equívocos”, afirmou.

Sobre este ponto, Paulo Roberto Costa disse apenas que reiterava o que já havia declarado ao juiz Sérgio Moro, responsável pelos processos no âmbito da Operação Lava-Jato, nos depoimentos que prestou em Curitiba. No início da acareação, Costa foi o primeiro a falar e começou garantindo que tudo o que já disse nos depoimentos de delação tem comprovação. “Não tem nada da delação que eu falei que eu não confirme. Porque a delação é um instrumento extremamente sério, não pode ser usado de artifício, não pode ser mentira, de coisas que não possam depois se confirmar”, disse.

Em seguida, emendou: “Falei de fatos, falei de dados, falei de pessoas. Na época oportuna, essas pessoas serão conhecidas”. Nestor Cerveró ressaltou durante a acareação que não responderia perguntas formuladas com base em vazamento de informações do processo à imprensa. “Não vou responder a perguntas que sejam extraídas de possíveis vazamentos ou ilações da mídia. Não vou responder perguntas que eu desconheço e que os senhores também desconhecem”, afirmou.

Repercussão
O deputado Carlos Sampaio (PSDB-SP) chegou a elogiar a postura de Paulo Roberto Costa. “Errou o senhor Paulo Roberto, agiu de forma criminosa, causou um prejuízo ao país, mas agradeço a postura dele da delação premiada, porque quem reconhece o seu erro e procura se redimir, particularmente, em respeito a sua família, perante o Brasil, declinando o nome de todos os corruptos que assaltaram a Petrobras, presta um serviço à nação. O senhor Paulo Roberto, hoje, está prestando um serviço à nação.”

O deputado Onyx Lorenzoni (DEM-RS) acusou Cerveró de mentiroso. “Entre Cerveró e Paulo Roberto, na minha avaliação, quem hoje está mais próximo de ser acusado de mentir é o Cerveró. Apresentei a gravação onde Paulo Roberto fala ao juiz Moro, e aponta Cerveró como recebedor de propina de 3%, e Cerveró nega peremptoriamente. Paulo Roberto não ia colocar em risco a delação premiada que o tira da cadeia. Eu tenho mais razões para supor que Cerveró está mentindo”, concluiu.

Principais pontos
Confira o que disseram Nestor Cerveró (esquerda) e Paulo Roberto Costa aos parlamentares da CPI mista da Petrobras

Corrupção em estatais
» “Desde os governos Sarney, Collor, Itamar, Fernando Henrique, Lula, Dilma, todos os diretores da Petrobras e diretores de outras empresas, se não tivessem apoio político, não chegavam a diretor. (...) O que acontecia na Petrobras acontece no Brasil inteiro: nas rodovias, nas ferrovias, nos portos, nos aeroportos, nas hidrelétricas”, sustentou Costa.

» “Eu não sei qual é o político e eu nego essa acusação”, disse Nestor Cerveró sobre quem o teria indicado para a diretoria internacional da Petrobras. “Eu desconheço esse esquema e também desconheço qualquer esquema de propinas. (...) Por desconhecer, para mim não havia”, completou sobre a corrupção.

Compra da Refinaria de Pasadena (EUA)
» “Pasadena foi um bom negócio, dentro do planejamento estratégico da Petrobras na época, e como tal foi aprovado pelo conselho. (...) A avaliação dos auditores do TCU contém alguns equívocos”, disse Cerveró sobre a aquisição na qual o Tribunal de Contas da União (TCU) vê prejuízos de US$ 792 milhões à estatal. Ele negou ainda ter recebido propina na compra.

» Como parte da delação premiada, Costa disse à Justiça que a transação da compra da refinaria abasteceu o caixa de partidos políticos e contemplou o pagamento de propina.

E-mail de alerta à Casa Civil
» Costa negou que tenha agido sozinho ao enviar e-mail para a Casa Civil, em 2009, então comandada por Dilma Rousseff, alertando sobre investigações do TCU em negócios da estatal. “Pedido da chefe da Casa Civil, que mandasse, vamos dizer, os pontos que estavam com dificuldade em relação ao TCU, e eu assim o fiz, cumprindo minha função de diretor. (...) Esse e-mail, quando foi passado, era de conhecimento do presidente da Petrobras, (Sergio) Gabrielli, na época. E foi-me pedido pela Casa Civil para que eu mandasse esse e-mail diretamente para a ministra da Casa Civil na época, nossa atual presidente, Dilma.”

 

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Duque tem a prisão revogada

Correio Braziliense - 03/12/2014

JULIA CHAIB
EDUARDO MILITÃO

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Teori Zavascki decidiu ontem à noite revogar a prisão do ex-diretor de Serviços da Petrobras Renato Duque, atendendo o pedido da defesa. O ministro, em decisão sigilosa, acatou parcialmente o habeas corpus que solicitava a soltura de Duque. Detido em 14 de novembro, na sétima fase da Operação Lava-Jato, da Polícia Federal, chamada de Juízo Final, o ex-diretor teve a prisão temporária convertida em preventiva pelo juiz Sérgio Moro no último dia 19.

A decisão de Zavascki é em caráter liminar e precisava ser informada a Moro, responsável por expedir o alvará de soltura. Até a noite de ontem, o juiz não havia liberado o ex-diretor. Duque é apontado como o principal operador do PT nos desvios.

CGU
A Controladoria-Geral da União (CGU) anunciou ontem que abriu processo punitivo contra mais sete atuais e ex-funcionários da Petrobras por irregularidade na investigação sobre propinas recebidas da empresa SBM Offshore. São cinco gerentes e dois ex-gerentes da estatal. Além disso, o órgão de controle interno do Executivo havia determinado a abertura de processo contra outros seis ex-diretores e ex-funcionários. Entre os que respondem a processo administrativo, são 13. Há ainda um outro grupo na fase de sindicância, totalizando cerca de 20 suspeitos na Petrobras.