A ação terrorista que matou 12 pessoas, 10 delas dentro da sede da revista Charlie Hebdo em Paris, é vista também como um ataque a uma das bases históricas da nação francesa: a liberdade de expressão. Entidades de jornalistas classificaram o atentado como um crime sem precedentes contra a autonomia de imprensa, impulsionada pela França com o início da revolução de 1789. Especialistas afirmam que a execução em série dentro de um meio de comunicação tradicional, no centro parisiense, será um golpe difícil de superar no país que deu origem aos direitos universais.

“De fato, é um ataque contra um dos princípios básicos da civilização francesa, que é a liberdade de expressão. Nunca houve um atentado desse tamanho, ainda mais na França, berço dos direitos humanos”, disse o diretor do Centro de Informação das Nações Unidas para o Brasil, Giancarlo Summa. A Associação Mundial de Jornais (WAN-IFRA) também condenou o acontecimento, por meio de nota. “Nós observamos que um ataque dessa natureza atinge o coração da liberdade que a imprensa da França defende tão apaixonadamente. Não é apenas um ataque contra a imprensa, mas também contra a sociedade e os valores pelos quais lutamos.”

A Charlie Hebdo segue a tradição de um jornalismo francês extremamente crítico, que remonta à imprensa que denunciava os excessos de Maria Antonieta no período pré-Revolução Francesa. E, se no século 18, o alvo era a família real e a corrupção na Corte em Versalhes, a mira da Charlie Hebdo hoje está voltada para políticos, banqueiros e líderes religiosos. Segundo Summa, a ação terrorista atinge o típico jornalismo satírico do país. “A revista faz parte da tradição de falar de coisa séria com ironia e, às vezes, de forma vulgar, mas com uma maneira refinada dos franceses”, explica.

“Barril de pólvoras”

Profissionais da imprensa protagonizaram ações de repúdio ao ataque . Os jornalistas da agência France-Presse, com sede na França, publicaram foto em que aparecem na redação da empresa segurando placas com a frase Je Suis Charlie (Eu sou Charlie). Eles também fizeram um minuto de silêncio em homenagem aos mortos e divulgaram, em nota, que seus pensamentos estão voltados às “vítimas desse crime contra a liberdade de expressão sem precedentes na França”. “Nós expressamos a nossa solidariedade total com Charlie Hebdo e esperamos que os nossos colegas consigam continuar a sua missão”, prosseguiu o texto.

Em Genebra, a Organização La Presse Embléme Campagne (PEC) emitiu um comunicado no qual se diz horrorizada com o ataque em Paris. “O ano de 2015 começa infelizmente na mesma inclinação ascendente de violência de 2014, com ataques indiscriminados contra civis, incluindo jornalistas. Temos de encontrar a razão de um Oriente Médio transformado em um barril de pólvora pelas rivalidades regionais e intervenções externas”, disse o secretário-geral da PEC, Blaise Lempen.

A organização de defesa dos jornalistas Repórteres sem Fronteiras (RSF) pediu aos meios de comunicação de todo o mundo que publiquem, a partir de hoje, os desenhos da revista francesa. “A liberdade de informação não pode se apagar diante da barbárie nem ceder à chantagem daqueles que atacam nossa democracia e nossos valores republicanos”, divulgou em nota. Segundo a entidade com sede na França, a Charlie Hebdo sempre se destacou pela liberdade de expressão, por isso que, com o “ataque inqualificável, toda a imprensa se vê pisoteada e ofendida”. “Em nome de todos aqueles que caíram defendendo os valores fundamentais, continuemos a luta pelo direito a uma informação livre”, prosseguiu o texto.

No Brasil, a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) condenou o atentado. “A Fenaj repudia a violência contra os jornalistas, alertando a sociedade para o perigo da intolerância (seja política, religiosa, seja de qualquer natureza) e do obscurantismo, que tem gerado ataques às liberdades de expressão e de imprensa em todo o mundo.”